Crescer ou não crescer? Eis a questão. A adaptação livre do famoso dilema de Shakespeare pode muito bem ser empregada para o momento que vive o Aeroporto Carlos Drummond de Andrade, consagrado popularmente como aeroporto da Pampulha. Com 80 anos completados em 23 de março de 2013, hoje ele se limita a aeronaves com 75 assentos, barreira imposta pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) desde 2005, quando a Pampulha deixou de realizar voos de longa distância e passou a concentrar voos regionais e para algumas cidades de estados limítrofes. O objetivo seria claro: não atrapalhar os planos de privatização do Aeroporto Internacional Tancredo Neves – o aeroporto de Confins. O temor é de que, caso a restrição à Pampulha caia, os possíveis investidores sofram com a fuga de passageiros de Confins.
"São Paulo e Rio de Janeiro têm um aeroporto internacional e um aeroporto central, que fazem operações de curta distância e ponte aérea, mas nós não temos essa pretensão", afirma Silvério Gonçalves, de 57 anos, superintendente do aeroporto da Pampulha. Mineiro de Barbacena e formado em engenharia elétrica pela PUC Minas, ele assumiu o cargo há dois anos e meio. Na Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) desde 1986, tendo trabalhado em Belo Horizonte – na Pampulha e em Confins – e em cidades como Brasília, Recife, Uberaba e Vitória, Silvério resume o papel que hoje cabe ao aeroporto. "Quando boa parte dos voos foi para Confins, em 2005, as operações aqui foram reduzidas para fomentar a conectividade do aeroporto internacional. Dessa forma, a Pampulha está inserida no contexto do desenvolvimento de Confins", explica.
É preciso destacar que esse suposto "antagonismo" entre os aeroportos vem de longa data: desde 1984, início das operações do terminal internacional. Se em 1983 a Pampulha registrava movimento anual de 1,15 milhão de passageiros, no ano seguinte, Confins absorveu 95% do movimento. O ciclo de estagnação só se rompeu no início da década de 1990, quando foi permitida a utilização de modernas aeronaves a jato ligando a Pampulha a outras capitais. Ano após ano, a Pampulha passou a ser mais procurada, chegando ao recorde de 3,2 milhões de passageiros em 2004. Foi quando soou um alarme. Pressionada pela possível diminuição de voos em Confins – onde haviam sido feitos investimentos milionários –, a Anac deu um jeito de "cortar as asinhas" da Pampulha.
A tendência é de que esses números cresçam um pouco mais se solucionados alguns problemas. "Temos de manter a agilidade do terminal e garantir o conforto, sem filas, sem corredor entupido de gente. Queremos, sim, que o aeroporto tenha desenvolvimento, com voos para novos destinos, mas dentro de um limite", acrescenta Silvério, ressaltando que a capacidade máxima atual seria de 1,5 milhão de passageiros/ano. Mais que isso, seria problema na certa. "Operar 3,2 milhões de passageiros na Pampulha foi um desacerto, um descompasso. Isso nunca mais vai acontecer aqui", garante.
O superintendente do aeroporto destaca que a Infraero, em parceria com o governo de Minas e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), está concluindo o novo plano diretor do aeroporto. Além disso, a entidade finaliza plano de reforma para dar mais espaço à área de embarque e reformular os banheiros. Esse projeto conta ainda com a incorporação da área que hoje é do Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica e prevê a ampliação do pátio de aeronaves e das áreas de hangaragem. A previsão de despesas para a reforma não foi revelada. "Nossa intenção é fazer as obras depois da Copa do Mundo", revela o superintendente.
A chegada da Copa do Mundo, inclusive, é um assunto espinhoso. Recentemente, receoso de as obras do segundo terminal de passageiros de Confins não serem concluídas a tempo, o prefeito Marcio Lacerda (PSB) admitiu até a possibilidade de a Pampulha voltar a receber grandes aeronaves durante o evento. Silvério sequer cogita essa possibilidade: "Não vai haver esta necessidade. Se houver algum tipo de obra atrasada em Confins, serão coisas pequenas, que não vão interferir nos voos", prevê.
Polêmicas à parte, é pouco provável que o aeroporto da Pampulha seja sucateado, mesmo que não receba tantos investimentos quanto Confins. O superintendente Silvério Gonçalves também explica: "Ninguém pode pensar que o aeroporto da Pampulha vai deixar de existir. Hoje geramos cerca de 2 mil empregos diretos. Além dos voos regionais, mantemos vários serviços para a população. Temos a presença da Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Polícia Civil, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal. Também somos um polo de manutenção de aeronaves", finaliza. É aguardar para ver. Só assim saberemos se os próximos anos do aeroporto da Pampulha serão vividos em 'céu de brigadeiro' ou sob intensa turbulência.
Poluição sonora
Ter um aeroporto como vizinho não é nada simples. Os moradores da rua Amável Costa, no Jaraguá, que o digam. Incomodados principalmente com a poluição sonora gerada pelo aeroporto da Pampulha, em outubro do ano passado, cerca de 50 famílias mobilizaram-se e fizeram um abaixo-assinado solicitando mudanças no procedimento das aeronaves. Reclamações foram feitas junto à Infraero, Anac e à Prefeitura, sem sucesso. O engenheiro florestal Rogério Carneiro de Miranda, de 52 anos, foi um dos organizadores do movimento. Ele relata o que passam os moradores. "Sofremos mais com os impactos da poluição sonora e ambiental. Nossas casas ficam na parte mais alta e, apesar de a Infraero alegar que não, os ventos trazem os ruídos e a poluição de lá. Além disso, há voos de aeronaves particulares e aviões de treinamento de madrugada. Sem contar o crescente número de helicópteros, principalmente após a instalação de um heliponto do Corpo de Bombeiros", relata.
Rogério compreende que a situação é complexa e fica até difícil apontar os ‘culpados’ pelo problema. "Sabemos que o aeroporto está aqui desde 1933 e o bairro só foi desenvolvido na década de 1960. Teoricamente, então, o bairro é que não poderia estar aqui. O que ocorreu foi uma falta de planejamento e de ação das autoridades. Agora a cidade está do lado do aeroporto e não dá para tirá-la. Somos obrigados a conviver com este tipo de poluição e não há nada que possamos fazer", lamenta.
Como o 'estrago' já está feito, a intenção é ao menos minimizar os impactos. O grupo já recorreu a vários órgãos, mas ainda não obteve sucesso. Silvério Gonçalves, superintendente do aeroporto, garante que as reivindicações dos moradores são levadas a sério. "Temos muito cuidado com as reclamações dos vizinhos. A Infraero tem uma política de preservação de área muito grande e estamos sempre monitorando as fontes de ruído. O foco é tornar o aeroporto amigável com a população. Temos que desenvolver o aeroporto, mas sempre atentos à população ao redor para não criar conflito", pondera Silvério.