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Estado de Minas FUTEBOL

Clubes de futebol não sabem lidar com o aspecto psicológico de jogadores e técnicos

Pesquisa da USP mostra que a pressão por resultados é um dos principais problemas enfrentados pelos esportistas


postado em 27/10/2017 11:54

Como mostra o especialista, a pressão por resultados e títulos mexe com o psicológico de jogadores e comissão técnica, que não têm apoio dos clubes para resolver o problema(foto: Bruno Cantini/Atlético-MG/Divulgação)
Como mostra o especialista, a pressão por resultados e títulos mexe com o psicológico de jogadores e comissão técnica, que não têm apoio dos clubes para resolver o problema (foto: Bruno Cantini/Atlético-MG/Divulgação)
É sabido que no futebol profissional, a rotina de treinos e jogos é desgastante, física e psicologicamente e, diariamente, jogadores e comissão técnica são muito pressionados para obter bons resultados e conquistar títulos. Para lidar com as pressões, na maioria dos casos, os atletas buscam ajuda nos mesmos lugares em que as cobranças têm origem, em especial a comissão técnica e a família. A conclusão é de uma pesquisa feita pelo Instituto de Psicologia da USP.

No estudo, o professor de educação física Rafael Moreno Castellani entrevistou 25 jogadores, 12 integrantes de comissão técnica e seis dirigentes de três clubes das Séries A, B e C do Campeonato Brasileiro sobre o processo de formação do grupo. O trabalho destaca também a importância do apoio psicológico profissional, em especial junto aos atletas que vêm das categorias de base, embora constate que seja pouco difundido nos clubes.

Segundo a pesquisa da USP, apesar do futebol profissional ser um comércio extremamente rentável, que se movimenta com a circulação de jogadores e técnicos, há muitos problemas internos. "Institucionalmente, o futebol se apresenta como uma organização conservadora, excludente, 'fechada', de privação e controle", afirma o professor. Um exemplo disso é a prática da concentração antes das partidas. "O que poderia ser uma oportunidade importante de consolidação da convivência em grupo para dirigentes e membros da comissão técnica é, na realidade, um espaço de confinamento e reclusão, dentro de uma ideia de que os atletas devem ser monitorados e controlados a fim de modular e regulamentar seu comportamento", comenta Rafael Castellani.

Conforme o pesquisador, os vínculos criados no clube têm uma transitoriedade exagerada, o que acontece devido às constantes e precipitadas mudanças de comissão técnica, motivadas, em grande parte, pela ausência de resultados positivos e vitórias. "A justificativa costumeiramente adotada para tais mudanças passa pela necessidade de criar um 'fato novo', 'mexer o grupo' de atletas e motivá-lo a treinar melhor e render mais nos jogos. No entanto, a análise feita pelo estudo aponta uma direção distinta, visto que o que tais mudanças promovem é uma desorganização no funcionamento grupal, desestruturando aquilo que já é conhecido e está conservado", diz o educador físico.

Adaptação

O pesquisador recomenda que o atleta deveria dispor de leitura crítica da realidade do clube, com capacidade de propor mudanças no grupo e a si próprio. "A pesquisa até constatou alguns acontecimentos que mostram esse tipo de adaptação, mas por serem posturas individualizadas, e não elaboradas na perspectiva do grupo, estão mais próximos de uma adaptação passiva à realidade", completa.

A maneira com que comissão técnica, em especial o treinador, e dirigentes lidam com os conflitos também influencia, positiva ou negativamente, a vida e atuação dos jogadores, segundo o pesquisador. "O vestiário é um ambiente fundamental no campo das relações afetivas e momento de maior intimidade grupal, seja pela exposição dos corpos, pelas brincadeiras ou discussões e resolução de conflitos, seja por ser o ambiente em que passam grande parte da sua rotina profissional. A associação do vestiário, principalmente em dias de jogos, como ambiente importante para a coesão de grupo e sua relação com o rendimento da equipe esteve destacada em algumas falas dos entrevistados", esclarece Castellani.

A pesquisa aponta que a pressão sobre os jogadores é diária e intensa, e vem de todos os lados e nas mais diversas intensidades, ou seja, de torcida, comissão técnica, dirigentes, imprensa, família e empresários. "Talvez seja essa uma das maiores demandas psíquicas entre os atletas, que deveria, em tese, ser assessorada por um psicólogo do esporte. No entanto, o que se vê é que grande parte dos sujeitos que exercem algum tipo de pressão nos jogadores [família, comissão técnica e dirigentes] são os mesmos, sobretudo os dois primeiros grupos, que os ajudam a lidar com ela", diz o professor da USP.

O problema, de acordo com o pesquisador, é que poucos clubes se preocupam emd ar apoio psicologico aos jogadores e á comissão técnica. "Apenas um dos clubes analisados possuía psicólogo e assistente social para ajudar atletas e comissão técnica a compreenderem e vivenciarem um processo tão difícil", afirma Rafael Castellani.

(com Jornal da USP)

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