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Estado de Minas

Enguiços da educação brasileira


postado em 03/11/2011 13:43

A educação brasileira atual pode ser vista a partir de dois pontos de vista, um otimista e outro meio desanimador. O lado positivo é que, em meio século, demos um salto extraordinário. De um dos países de mais lastimável educação no continente, conseguimos chegar quase ao nível dos melhores. O lado pessimista é que, por haver começado com atraso – um século, comparado com Argentina e Uruguai –, continuamos bem ruinzinhos. Mas em tudo e por tudo, há muitos acertos e muitos escorregos nos tempos presentes. Vejamos quatro assuntos críticos.

 

1 – A falta de qualidade do ensino básico

 

Dentre os que sabem, há meridiana clareza acerca do principal problema da educação brasileira: a falta de qualidade, sobretudo, nos primeiros anos. Paradoxalmente, na raiz do problema está o fato de que pais, alunos e professores acham a escola boa. Sendo assim, que força política haverá para melhorar uma educação que já agrada como é? Isso se torna ainda mais difícil quando consideramos que todas as “bondades” já foram feitas (mais vagas, prédios, contratação de professores, compra de livros etc.). Agora só restam “maldades” (aluno estudar mais, aula mais bem preparada, dever para casa e diretor cobrando resultados impiedosamente). Sabemos como melhorar a escola, mas sem uma sociedade exigindo melhor desempenho, nada vai acontecer.

 

2 – Os desencontros nas faculdades de educação

 

As faculdades que formam professores não acham importante ensinar conteúdos, não acham prioritário ensinar a dar aulas e manejar o cotidiano de uma sala de aula. Grande parte do tempo é consumido com teorias rarefeitas e com ideologia. Futuros mestres aprendem a Teoria da Reprodução ou sobre o Imperialismo Cultural, mas não aprendem a ensinar a “regra de três”. As tentativas de mudar tais orientações geram reações iradas e intransigentes. Contudo, sem formar bons professores, tudo mais é quimera.

 

3 – Semianalfabetos em um ensino médio para gênios

 

O ensino médio foi copiado do que se fazia na França, com a sua elite social e econômica dos anos de 1950, quando lá apenas 5% da corte frequentava o secundário. Insistir nesses conteúdos excessivos e difíceis é uma solução fantasiosa no Brasil de hoje. É ensino para gênios, oferecido a alunos semianalfabetos. Mas, na França, há muitas outras opções escolares para os que não se enquadram no caminho real do secundário acadêmico de elite. Só que no Brasil temos uma escola para gênios e nenhuma opção para os mortais comuns. Nos Estados Unidos, a escola é a mesma para todos, mas cada um faz o seu currículo. Aqui, o currículo do Santo Antônio, pela lei, é o mesmo do aluno da favela Prado Lopes. Nosso modelo é absurdo. Resultado? Em vez de crescer, encolhe a matrícula. O que fazer: modelos de escolas diferentes ou escolas com currículos variados e flexíveis? O MEC nada diz de interessante, ousado ou criativo.

 

4 – Universidades públicas: caras e ingovernáveis

 

À exceção de uma dúzia de universidades de primeira linha (incluindo algumas de Minas e que garantem ao Brasil uma posição destacada na pesquisa mundial), as demais instituições federais custam muito caro e produzem quase nada de pesquisa. Custam o mesmo que a média do ensino superior da OECD, três vezes mais que as faculdades privadas e entre cinco e dez vezes mais do que o ensino público básico brasileiro. Esse ensino caríssimo é oferecido gratuitamente a uma maioria de alunos de classes sociais elevadas e que poderiam pagar pelo menos uma parte dos custos. Com gastos tão elevados, não há recursos para uma expansão significativa dessa rede pública. O processo decisório é lento e, por vezes, perverso. Os professores são vitalícios e contratados em regime de tempo integral – que não cumprem, na sua maioria. Os reitores são escolhidos por regras que nenhum país de primeiro mundo adota. Pior, não mandam. Nesse modelo, o reitor não tem autonomia para dispensar ou contratar um reles contínuo. Mas tem autonomia para não ouvir nem o MEC e nem a sociedade, no que diz respeito à sua eficiência ou às áreas em que atuam.

 

Esse sistema público travado cria espaço para uma participação cada vez maior do sistema privado. Na prática, é um sistema tão bom quanto é possível oferecer com o que podem pagar os alunos, em cada categoria de instituição.

 

*Claudio de Moura Castro é economista, pesquisador em educação e autor de diversos livros. Escreve bimestralmente na Encontro

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