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Estado de Minas

Nas telas


postado em 05/03/2012 11:57

Precisamos falar sobre Tilda

 

Um longa-metragem que ambicione participar de festivais e, consequentemente, ser competitivo na atual “temporada do ouro” deve prezar e perseguir qualidades básicas. O roteiro, seja ele adaptado ou original, sempre foi classificado como o alicerce que sustenta todo tipo de pretensão. A partir de um roteiro bem trabalhado, pode-se apostar em quais categorias um projeto se consolida como imbatível. Mas a principal qualidade que um filme deve ter, para sua excelência e reconhecimento, talvez seja a subversão.

 

Ou seja, ser escancaradamente subversivo. Não no sentido de se opor ou negar tudo aquilo que os grandes mestres fizeram, mas, sim, primar pela inovação, por novas soluções e caminhos. No cinema subversivo, sempre achamos alto risco nos enquadramentos, na montagem, na direção como um todo. São os novos jeitos e as saborosas ousadias que ditam o que passará a ser respeitado e aplicado no universo da sétima arte.

 

O eletrizante Precisamos Falar Sobre o Kevin (We Need to Talk About Kevin) atinge a subversão do início ao fim. Vale a pena apontar, desde a apresentação muitíssimo original de seu título. Baseado no best-seller homônimo da autora Lionel Shriver, a história retrata a delicada descoberta, por uma mãe, da personalidade doentia de seu filho psicopata. A direção, sob a responsabilidade da competente Lynne Ramsay, utiliza com maestria as imagens, recursos e metáforas, proporcionando ao espectador incontáveis cenas de apreensão – como a referência à festa popular espanhola da Tomatina, relacionada imediatamente a determinado ato de violência e represália. Prova de um comando seguro e, ao mesmo tempo, simples, neste genial e sufocante projeto.

 

Na pele da mãe do adolescente, a atriz britânica Tilda Swinton demonstra, a cada cena, a razão de ser considerada uma das maiores atrizes do cinema na atualidade. Seu esforço e interpretação fazem jus a todos os fartos e entusiasmados elogios que vêm recebendo, desde a primeira exibição do filme no último Festival de Cannes. Tilda retrata a infinita impotência e, também, fraqueza de uma mãe, que chega a buscar o auxílio do parceiro, interpretado pelo boa-praça John C. Reilly, mas que assume sozinha, em circunstancial momento, todo peso e receio da convivência às claras com seu primogênito.

 

Em Precisamos Falar Sobre o Kevin, descobrimos também a Tilda engajadíssima nos projetos que seleciona. Sua dedicada participação como produtora do longa-metragem reforça que um grande nome é vital e determinante para que uma obra diferenciada seja, de fato, tirada do papel.
Detalhes importantes marcam o grande talento dessa atriz madura, detentora de uma beleza franca e andrógina. No filme, um corte de cabelo, por exemplo, orienta todo o percurso de uma vida social plena em aparências e intranquila na intimidade. Poucas como Tilda Swinton sabem esgotar este recurso na sua inteireza e torná-lo essencial à composição da personagem.

 

Ganhadora do Oscar de melhor atriz coadjuvante em Michael Clayton – Conduta de Risco (2007), Tilda é maior prova de que a lenda sobre o fato de um ator ter sua carreira francamente devastada após vencer o prêmio da Academia não passa, na verdade, de uma grande balela. Aliás, trajetórias muito similares de grandes colegas, como Laura Linney e Patricia Clarkson (que não venceram o Oscar), não tiveram, até o momento, a mesma ascensão. Como justificativa para este descompasso, podemos apelar para o “componente-sorte” ou, quem sabe, para os segredos que imperam na indústria de Hollywood.

 

Para fazer justiça, impossível concluir sem antes destacar o desconhecido ator Ezra Miller, no papel do garoto do título. Seu trabalho chama atenção pela precisão em dispensar com segurança todos os exageros que a grande maioria dos psicopatas do cinema sempre esbanja. Além disso, a parceria com Tilda Swinton é certeira no sentido de tratar e atingir cenas fortíssimas com espantosa e máxima naturalidade. Ezra Miller, o já inesquecível Kevin adolescente, já havia aparecido com louvor em Confusões em Família (City Island), fazendo o filho de Andy Garcia; porém, sem nenhuma dúvida, é a partir de Precisamos Falar... que ele promete levantar uma significativa carreira no cinema.

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