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Estado de Minas

Um artista que ninguém esquece


postado em 01/03/2012 14:28

Painel Ceia, da coleção particular de Sérgio Bicalho Filho: uma das obras de Apocalypse(foto: Fundação Arquivo Apocalypse/divulgação)
Painel Ceia, da coleção particular de Sérgio Bicalho Filho: uma das obras de Apocalypse (foto: Fundação Arquivo Apocalypse/divulgação)

“De 15 em 15 anos, o brasileiro se esquece dos últimos 15 anos”. A frase do escritor Ivan Lessa sintetiza bem a perversa relação que grande parte dos brasileiros sempre teve com a história de nossa cultura. Esquecer parece ser mesmo o verbo mais conjugado por aqui. Daí a importância do livro Álvaro Apocalypse, do crítico Márcio Sampaio, que acaba de ser publicado. Com o volume, que reúne parte do trabalho de um dos mais talentosos artistas brasileiros dos últimos 50 anos, a obra de Álvaro ganha, finalmente, um livro à altura de sua importância. Ao apresentar, para as novas gerações, a obra do artista, o livro ajudar a diminuir, pelo menos em parte, a amnésia brasileira.

 

Mineiro, nascido na cidade de Ouro Fino em 1937, Álvaro era um artista completo: foi pintor, ilustrador, gravador, desenhista, cenógrafo, professor, museólogo e publicitário. Mas foi mesmo como diretor do grupo de teatro de marionetes Giramundo que ele se tornaria mais conhecido. Morto prematuramente em 2003, aos 66 anos, ele deixou uma obra importante e ainda pouco conhecida do grande público.

 

O crítico Márcio Sampaio explica que a ideia de reunir uma parte da obra do artista mineiro em um livro era antiga. Surgiu um dia, ainda nos anos 1980, numa conversa que ele teve com o artista. “Quando Álvaro era vivo, eu insistia muito para fazermos o livro. Propus a ele, várias vezes, o projeto”, conta Sampaio, professor aposentado da Escola de Belas Artes da UFMG, e um dos maiores amigos do artista. “Mas ele era um homem muito discreto, simples. Não gostava que ficassem jogando confete nele. E, na hora H, sempre pulava fora e adiava o projeto”, conta.

 

Sampaio conta ainda que, se a princípio o livro abordaria apenas o período em que o artista criou e dirigiu o Giramundo, com o tempo ele se convenceu de que a obra não deveria se restringir apenas ao teatro de bonecos: “Quando fui convidado para fazer o livro, percebi que seria melhor fazer um livro com o foco não apenas no Giramundo. O volume deveria abranger um período maior. A obra de Álvaro é de uma riqueza impressionante”.

 

O artista plástico Álvaro Apocalypse, no ateliê do grupo: artista mineiro deixou importante obra, pouco conhecida do grande público
 

 

A abrangência talvez seja mesmo uma das principais qualidades do novo livro de Sampaio. Além de reunir os desenhos do artista, desde a infância de Álvaro ainda em Ouro Fino, o volume traz gravuras dos anos 1950, período em que ele, estudante de direito, cursou a Escola Guignard. “O Álvaro se tornou professor muito cedo, em 1959, quando passou a lecionar na Escola de Belas Artes da Faculdade de Arquitetura da UFMG”, conta Márcio.

 

A pesquisa do crítico traz ainda trabalhos de Apocalypse da década de 1960, quando ele começou a se interessar pelas festas populares e o tema passou a ser uma constante em seus desenhos, além das obras com um caráter surrealista, concebidas na mesma época. Ainda sem previsão de lançamento na capital mineira, o livro Álvaro Apocalypse pode ser adquirido na Fundação Arquivo Apocalypse. Informações pelo telefone (31) 3681-1704.

 

Parceira de primeira hora de Álvaro e da mulher dele, Terezinha Veloso (que morreu no mesmo ano), na criação do Giramundo, Maria do Carmo Martins, a Madu, se emociona ao falar dos dois amigos e da primeira montagem do grupo: Bela Adormecida, que aconteceu no Teatro Marília no dia 5 de maio de 1971. “A peça teve uma ótima aceitação por parte da imprensa e do público. Éramos uma família. Trabalhar com o Álvaro e a Teresinha era um grande prazer para todos”, lembra a professora, que também era vizinha do casal em Lagoa Santa, na região metropolitana de Belo Horizonte. Madu, aliás, assina um comovente texto no novo volume. Ela conta que, com a montagem de Cobra Norato, em 1979, o grupo se fortaleceu de maneira definitiva.

 

Baseado no poema homônimo do escritor modernista Raul Bopp, a montagem foi responsável pela identidade ao grupo: “A partir dali, ganhamos uma cara”, conta. Mesmo com a morte de Álvaro e Teresinha em 2003, o Giramundo continuou a aproximar importantes trabalhos, como A Flauta Mágica (2006) e Vinte Mil Léguas Submarinas (2007). Hoje, o grupo conta com 50 integrantes e é uma das mais importantes referências de teatro de boneco do país. Álvaro Apocalypse merece ser mais do que lembrado.

 

Ainda sem previsão de lançamento na capital mineira, o livro Álvaro Apocalypse pode ser adquirido na Fundação Arquivo Apocalypse. Informações pelo telefone (31) 3681-1704.

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