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Estado de Minas

Só não pode baixar a guarda


postado em 14/05/2012 12:47

Vista do Aglomerado da Serra: remoções e ações preventivas diminuíram o número de imóveis em áreas(foto: Samuel Gê)
Vista do Aglomerado da Serra: remoções e ações preventivas diminuíram o número de imóveis em áreas (foto: Samuel Gê)

A alegria do aposentado Pedro Gomes da Silva, de 68 anos, e da mulher, Antônia Maria dos Santos, de 50, simboliza o alivio de um casal que conviveu com o medo por 17 anos, principalmente durante o período das chuvas. Eles moravam na rua Beija-Flor, 74, no bairro Taquaril, região leste da capital, em uma casa condenada pelos agentes da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel), por apresentar grande risco de deslizar morro abaixo. Hoje, comemoram a mudança para uma das unidades habitacionais cedidas pela Prefeitura de Belo Horizontel (PBH), bem longe de qualquer encosta. “Estou feliz aqui e não pretendo me mudar tão cedo”, garante o aposentado.

 

O exemplo do casal serve para entender a razão de BH não estar em situação semelhante à região serrana do Rio de Janeiro, onde, no ano passado, houve mais de 500 mortes por causa das chuvas.  Ao fim de mais um período chuvoso (de setembro de 2011 a abril deste ano), a capital não registrou mortes causadas por desabamentos, a mesma realidade dos últimos nove anos. A ideia é fortalecer os projetos existentes para que o passado de tragédias não retorne ao cotidiano da cidade.

 

O Aglomerado da Serra e a Barragem Santa Lúcia, por exemplo, são alguns dos principais pontos onde moradores, em condições de risco, ainda resistem e não querem mudar. Segundo o Diagnóstico de Risco Geológico 2011 apresentado no fim de março, cerca de 2,7 mil imóveis estão classificados em risco geológico alto e muito alto nestas e em outras áreas da capital.

 

Muitos moradores não aceitam a ajuda ou simplesmente resistem em deixar o local. Outros têm a real dimensão do problema. “O pessoal da prefeitura foi até a minha antiga casa e nos proibiu de fazer qualquer tipo de obra, pois corria risco de desabar. Eu tinha até comprado o material para uma reforma. Mas, hoje em dia, posso ficar mais tranquilo durante as tempestades”, revela Pedro, pai de 10 filhos, que se mudou com a mulher, em janeiro, para uma das unidades habitacionais no bairro Granja de Freitas, região oeste de BH.

 

Pedro Gomes da Silva e a mulher Antônia Maria dos Santos: alívio depois de 17 anos vivendo sob o medo
 

 

A ausência de informação e a resistência de moradores são alguns dos maiores problemas que a administração municipal enfrenta. Para o diretor-presidente da Urbel, Claudius Vinícius Leite Pereira, um dos principais desafios é conscientizar os moradores quanto aos seus direitos e deveres, e informá-los dos riscos de permanecer em áreas inadequadas. “Estamos reforçando nossas ações educativas para evitar preocupações em áreas condenadas e alterações nos imóveis sem a permissão e análise dos agentes da Urbel”, diz.

 

Criado em 1993, o Programa Estrutural em Áreas de Risco (Pear) é um dos principais responsáveis pela redução das tragédias em vilas e aglomerados de Belo Horizonte. Durante o projeto foram concluídas 124 obras, que receberam a injeção de mais de R$ 9,3 milhões de investimentos. Uma das principais regiões beneficiadas foi o Aglomerado da Serra, também um dos alvos do Vila Viva, outro projeto da prefeitura que prevê, entre outras ações, a urbanização de aglomerados. Seis vilas fazem parte do aglomerado, com mais de 50 mil moradores (Marçola, Nossa Senhora de Fátima, Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora da Conceição, Novo São Lucas e Santana do Cafezal).

 

A dona de casa Edinéia Costa de Souza, de 40 anos, é uma das moradoras da região e quer esquecer definitivamente a época em que ficava impedida até de sair de casa quando o tempo fechava. “Aqui era um problema danado. Escorregava muito durante as chuvas, fora o medo de tudo desabar”, conta ela, que retornou este mês para a moradia depois de obras da prefeitura. “Agora, é outra história quando chove. Fico mais aliviada”.

 

No Aglomerado da Serra, uma das obras que ilustram as melhorias na região foi feita na avenida do Cardoso, que corta o aglomerado, ligando a avenida Mem de Sá, no bairro de Santa Efigênia, à rua Caraça, na Serra. Devido à geografia acidentada, foi necessária a construção de um viaduto, um tipo de obra inédita no país em vilas e aglomerados. As obras que predominam nestas áreas se referem à contenção e tratamento de encostas, recuperação e melhoria de acesso às moradias e ruas, urbanização de becos e construção de passarelas. “Temos de estar atentos também aos trabalhos de manutenção, para que todos os ganhos não se percam no tempo”, diz Claudius.

 

Edinéia Costa de Souza e o acesso à casa reformada: “Agora, quando chove é outra história. Fico mais aliviada”
 

 

Isabel Queiroz Volpini, diretora de manutenção de áreas de risco, lembra a importância dos agentes voluntários no processo de pedir vistorias e avisar sobre trincas e outros problemas. “Até via mensagem de celular recebemos informações sobre situações de risco, e isso é de extrema relevância para o órgão, já que ele consegue agir de maneira mais rápida”, explica.

 

Segundo o coronel Alexandre Lucas, coordenador da Defesa Civil Municipal, a redução do número de ocorrências graves em vilas e aglomerados da capital é resultado de investimentos na prevenção. “Em 2011, a prefeitura investiu R$ 4 milhões na implantação de mais de 42 estações hidrometeorológicas, cobrindo toda a cidade”. Os moradores foram alertados sobre tempestades via SMS (celular), redes sociais e pela própria imprensa. No mês passado, agentes da Defesa Civil de BH participaram de um curso ministrado por representantes da Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica) sobre a forma de prestar ajuda em desastres naturais. “No Japão, 1,5% das pessoas salvas em terremotos, por exemplo, recebem ajuda do poder público. A maioria das vítimas é ajudada por vizinhos e demais moradores. Precisamos criar esta cultura por aqui”, afirma o coronel Lucas.

 

De acordo com a professora do Departamento de Geologia da UFMG, Maria Giovana Parizzi, o importante é manter as ações de melhorias e evitar que novas áreas sejam ocupadas de maneira inadequada. “É preciso que as pessoas conheçam o processo natural que ocorre no local antes de construir uma edificação”, afirma. A professora lembra que não há como controlar tempestades. Por isso, o jeito é monitorar as consequências desse fenômeno. “Não tem jeito de evitar as chuvas, mas há como minimizar as consequências”, diz.

 

 
 

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