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Estado de Minas CIDADE | LEGISLAçãO

Multa para os sujões

BH poderá punir o pedestre que jogar lixo na rua. O problema é que muitas leis na cidade não pegaram e esta pode ser mais uma, já que a falta de fiscalização adequada é a maior dificuldade da prefeitura


postado em 06/12/2013 17:21

Exemplo de lixo espalhado pelas ruas de Belo Horizonte: cidadãos mal-educados estão agora na mira do poder público(foto: Geraldo Goulart)
Exemplo de lixo espalhado pelas ruas de Belo Horizonte: cidadãos mal-educados estão agora na mira do poder público (foto: Geraldo Goulart)

Imagine a cena: depois de se refrescar com uma água mineral, o rapaz, sorrateiramente, deixa a garrafinha cair no chão no centro de Belo Horizonte. Em seguida, um fiscal da prefeitura se aproxima. Munido de caneta e bloquinho, aplica-lhe uma multa de R$ 100. Exagero? Foi dessa maneira que o Rio de Janeiro (RJ) resolveu acabar com a farra dos mal-educados na cidade, desde agosto. Mais de 7 mil pessoas foram multadas apenas nos dois primeiros meses de vigência do Programa Lixo Zero. Por aqui, a capital mineira sinaliza seguir os passos da fluminense, já que tramita na Câmara Municipal um projeto de lei semelhante.

Contudo, o que poucos sabem é que os belo-horizontinos já contam com a Lei 10.534/2012, que tem 80 artigos referentes à manipulação do lixo, e um, especificamente, que prevê punição de R$ 1.016,41 para as pessoas flagradas lançando lixo fora da lixeira. Mas você conhece alguém que já foi multado? Esse é apenas um exemplo de lei que não pegou!


Para o vereador Joel Moreira (PTC), a norma em vigor é ampla e complexa. "Quem conhece esse artigo?", indaga o parlamentar. "Participei da criação dessa lei, contudo, ela trata desde o pedestre que joga um papel no chão até a disposição de resíduos da construção civil. E a penalidade para quem deixa uma latinha cair na rua, por exemplo, é muito alta. A sanção não é condizente com a ação", diz. A falta de fiscais, segundo o vereador, também é um dos entraves para o cumprimento da lei. O parlamentar destaca o caráter pedagógico da nova proposta (projeto de lei 612/2013), já que prevê que o dinheiro arrecadado seja repassado à Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), que, por sua vez, deverá investir em campanhas educativas para a população. "A finalidade não é onerar os moradores, que, por sinal, não aguentam mais pagar impostos, e sim atuar no sentido de conscientização sobre a importância de vivermos numa cidade mais limpa", diz. 

O projeto de lei já passou pelas comissões de Legislação e Justiça e Saúde e Saneamento. Atualmente, está sendo apreciado pela Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana. Antes de seguir para assinatura do prefeito Marcio Lacerda, o projeto passa pelo plenário da Câmara em dois turnos.

       
O secretário adjunto de fiscalização, Alexandre Salles Cordeiro, explica que a novidade é que o novo projeto de lei foca apenas o pedestre. "Caso seja aprovado, o pedestre será multado de imediato", diz. Atualmente, BH conta com 400 fiscais que trabalham de maneira integrada. Se o projeto de lei vingar, existe a possibilidade de aumentar o número de fiscais. Contudo, ainda não há previsão para a realização de novos concursos. Segundo Alexandre Salles, em novembro, a PBH deu início ao sistema de patrulha de fiscalização, no qual equipes fazem operações nas nove regionais da capital para fiscalizar a limpeza urbana, obstrução de vias, ocupações irregulares, entre outras infrações. "Nosso sistema de fiscalização está sendo informatizado, o que aperfeiçoará ainda mais nossa atuação”, diz Salles, que também pede mais conscientização por parte dos moradores: “Tudo passa pela educação. O cidadão se preocupa muito em resolver o seu problema e esquece o vizinho".  


E parece que muitos moradores deixam de lado a educação. No centro de BH, bituca de cigarro, papel amassado, pacote de biscoito e copinho de refrigerante, infelizmente, também integram a paisagem. Uma amostra clara de que a lei em vigor desde setembro do ano passado não vingou. Debaixo de um sol escaldante, o analista de sistemas Diogo Abreu Viana, de 29 anos, saboreava um sorvete. Para ele, o destino do pote não pode ser outro senão a lixeira. "Às vezes não encontro lixeira, aí guardo no bolso ou fico segurando até encontrar uma", diz o rapaz, que torce para que o projeto de lei seja aprovado. A poucos metros dali, um jovem que se preparava para deixar uma latinha de refrigerante no chão se arrepende ao ver reportagem em ação. 

Cena inusitada em BH: porca revira lixo na praça das Constelações, bairro Santa Lúcia, região Centro-Sul e área nobre da capital mineira(foto: Geraldo Goulart)
Cena inusitada em BH: porca revira lixo na praça das Constelações, bairro Santa Lúcia, região Centro-Sul e área nobre da capital mineira (foto: Geraldo Goulart)
 

A promotora de vendas Thainy Francy Cordeiro, de 20 anos, trabalha na avenida Afonso Pena, bem próximo da praça Sete, e está cansada de chutar latinhas, papéis e outros objetos jogados no chão. "É tão mais agradável trabalhar numa cidade limpa!", afirma a jovem. E quem se depara diariamente com essa situação são os garis, que não têm folga na batalha contra os mal-educados. "Já encontrei de tudo por aqui. Móveis, portas, roupas e até sofá", conta o gari Marcelo de Freitas, de 36 anos, que trabalha de segunda a sexta-feira na varrição no hipercentro.

Para Clarissa Germana Pereira de Queiroz, chefe do Departamento de Políticas Sociais e Mobilização da SLU, apenas a multa não resolve a questão da sujeira nas ruas. "Investir em educação é tão importante quanto o instrumento coercitivo", diz. Ainda de acordo com a representante da SLU, é comum flagrar pessoas jogando lixo no chão no centro da cidade, onde podem passar despercebidas em meio à multidão. 

De acordo com a psicóloga Vívica Lé Sénéchal Machado, mestre em comportamento, a desobediência a certas leis pode ser fruto de dois fatores: "Ausência de consequências punitivas e falta de retorno positivo do governo para os cidadãos que cumprem corretamente as leis", diz. A especialista já desenvolveu uma tese na qual mostrou os motivos pelos quais Brasília (DF) é conhecida, nacionalmente, como um dos lugares onde mais se respeita a faixa de pedestre. "Campanhas de conscientização são muito difíceis para influenciar nosso comportamento, porque elas descrevem consequências para as nossas ações que já vêm a longo prazo. Somos fortemente influenciados pelo aqui e agora", explica.

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