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Estado de Minas ENTREVISTA | CELIO BOUZADA

Projeto que limita velocidade a 30 km/h em BH será ampliado

Área Hospitalar, Savassi e Barro Preto devem receber o Zona 30, planeja presidente da BHTrans


postado em 23/07/2019 14:46 / atualizado em 24/07/2019 00:24

(foto: Violeta Andrada/Encontro)
(foto: Violeta Andrada/Encontro)
Apesar dos 27 anos na BHTrans, dos quais dois anos e sete meses como presidente, o administrador empresas Celio Bouzada não é do tipo carrancudo. O traço seria até aceitável para quem comanda um órgão que vive recebendo reclamações. É só mudar uma via de circulação ou a cidade registrar congestionamentos para alguém gritar: "A culpa é dessa BHTrans". Mas, Celio é resignado. "Órgão de trânsito, no mundo inteiro, não costuma ter imagem positiva", afirma. A despeito disso, ele diz que a população vem mudando essa percepção, sobretudo, devido a reuniões semanais nos bairros, que foram intensificadas em sua gestão. Sua meta, além de modernizar o transporte público - com a possibilidade de os passageiros pagarem a passagem usando QR code -, é tornar a cidade mais segura para pedestres, ciclistas e, agora, usuários de patinetes elétricos. Ele mesmo revelou durante a entrevista que, aos sábados, costuma ir pedalando para o trabalho, do Sion ao Buritis. Projetos como a Zona 30, que restringe, em determinados locais, a velocidade dos veículos a 30 quilômetros por hora, vão ganhar destaque na capital. Nesta entrevista, Celio falou sobre as melhorias dos coletivos, o plano para os patinetes elétricos e a polêmica envolvendo a ausência dos cobradores nos ônibus.

  • Quem é: Celio Freitas Bouzada, 58 anos

  • Origem: Patrocínio do Muriaé (MG)

  • Formação: É formado em administração de empresas, especializado em administração financeira e mestre em administração pública

  • Carreira: Atualmente é presidente da BHTrans e professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Fumec

Encontro - O que a BHTrans vem fazendo para melhorar a vida do pedestre no trânsito?

Celio Bouzada - O pedestre é nossa prioridade. Na área central, onde há a maior concentração de pessoas, implantamos o Mobicentro (programa da prefeitura para harmonizar a relação entre o trânsito de veículos e o de quem circula a pé na região central). Estamos, por exemplo, aumentando o tempo verde para passagem de pedestres. Em outros bairros, temos o projeto Escola Segura, com redutores de velocidade no entorno das instituições de ensino. Nos arredores de equipamentos frequentados por idosos, como asilos, estamos alargando as calçadas também para reduzir o trajeto a ser atravessado. Essas ações ajudam a reduzir o número de acidentes e mortes no trânsito.

Já houve essa redução?

Estamos vivendo a década de redução de acidentes da ONU, pois estava virando uma espécie de doença em todo o mundo. Aderimos a essa campanha e todas as nossas ações são nesse sentido. Por isso, estamos aumentando calçadas e estreitando vias. Não podemos perder tantas vidas no trânsito. De 2010 a 2017, o número de acidentes caiu de 16,8 mil para 12,2 mil, em BH. O número de mortes no trânsito também. De 262 para 121, nesse período.

"No mundo inteiro não há cobrador. A diferença é que em outros países existem facilidades para o passageiro pagar a passagem" (foto: Violeta Andrada/Encontro)
Como está caminhando o projeto Zona 30?

Recentemente, tivemos uma experiência do conceito de velocidade reduzida no Cachoeirinha. O projeto já existe no bairro Funcionários. Nesse bairro, por exemplo, optamos por implantar de forma mais lúdica ao pintar uma rosa dos ventos nas rotatórias para chamar atenção de pedestres e motoristas. Agora, nossa ideia é implementar o Zona 30 na região hospitalar, pois nesse lugar há mais doentes e idosos caminhando. Dando certo por lá, vamos partir para outros lugares como Savassi, Barro Preto e próximo a escolas.

E a população tem uma percepção positiva desse projeto?

Não existe consenso na nossa área de atuação. É óbvio que os motoristas vão sempre reclamar, mas estamos fazendo uma opção de preservar a vida. Por isso, tenho de propor medidas moderadoras de velocidade. Por exemplo, uma pessoa atropelada a 30 quilômetros por hora vai machucar-se, mas sobreviverá. Agora, uma pessoa atropelada por veículo a 60 quilômetros por hora ou mais, infelizmente pode morrer.

Quais as principais demandas que a população tem sobre o transporte público?

Ela cobra mais ônibus. Entretanto, quando implantamos faixas exclusivas, por exemplo, conseguimos realizar mais viagens. A circulação flui. A população pede também maior pontualidade dos coletivos, mas é outra coisa que conseguimos melhorar quando otimizamos a circulação dos ônibus. A despeito disso, nos últimos dois anos criamos quatro linhas de ônibus para atender a população que mais necessita, um pedido do prefeito Alexandre Kalil. É o caso dos bairros Taquaril, Montes Claros, Tupi e Milionários. Temos ainda 502 ônibus novos, com ar-condicionado e suspensão a ar, circulando, do total de 2.852. Nos próximos meses, cerca de outros 200 devem ir para a rua. Nossa cidade tem uma cobertura espacial muito grande e fica difícil oferecer ônibus para todos os destinos. Por isso, nosso objetivo é oferecer ônibus melhores, com fiscalização intensa e manutenção diária. Estamos cada vez mais próximos da comunidade também. Hoje, não mudamos uma mão de circulação sem antes conversar com os moradores afetados. Todas as noites, de segunda a sexta-feira, equipes técnicas da BHTrans se reúnem com a comunidade.

E essas reuniões têm conseguido reverter a imagem que a população tem da BHTrans?

Órgão de trânsito, no mundo inteiro, não costuma ter imagem positiva. Ele não é simpático. Contudo, nas duas últimas pesquisas de opinião que fizemos registramos uma evolução dos nossos indicadores. Essa relação mais próxima com a comunidade está rendendo frutos. Alguns moradores até já nos enviaram vídeos agradecendo por melhorias.

A capital mineira terá mais faixas exclusivas para ônibus?

Temos de nos debruçar sobre a avenida Raja Gabaglia, para entender qual seria a melhor solução para ela. Estamos estudando, ainda, ampliar a faixa exclusiva da avenida Nossa Senhora do Carmo, que hoje vai até à altura da avenida Uruguai. No caso da avenida Amazonas, é um projeto maior e para qual estamos pleiteando financiamento externo. Metade das pessoas que circulam por lá mora na região metropolitana, como Sarzedo, Ibirité, Betim e Contagem. Solicitamos a elaboração e o desenvolvimento dos estudos técnicos e dos projetos executivos de 14 rotas, com aproximadamente 71,5 quilômetros de extensão.

Passageiros continuam reclamando da ausência do cobrador nos ônibus fora do horário permitido.

Isso é um embate. As empresas não estão cumprindo a legislação e tenho duas ações: multá-las ou tirar os coletivos de circulação. Se eu escolher a segunda opção, prejudico a população. Já aplicamos cerca de 10 mil multas em um ano. São feitas em Belo Horizonte 25 mil viagens diárias e para multar eu preciso do fiscal. Por isso, a reclamação do usuário continua sendo muito importante. É ela que nos norteia para saber quais coletivos estão em desacordo com a lei.

"De 2010 a 2017, o número de acidentes caiu de 16,8 mil para 12,2 mil, em BH. O número de mortes no trânsito também. De 262 para 121, nesse período" (foto: Violeta Andrada/Encontro)
Como resolver essa questão?

Temos de destacar que no mundo inteiro não há cobrador. A diferença é que em outros países existem facilidades para o passageiro pagar a passagem. Por isso, estamos planejando vender os créditos de passagem pelo celular, gerando um QR code. Existe ainda a opção de comprar usando cartão de crédito ou adquirir em bancas de revista e em máquinas de autoatendimento. Se depender de nós, vai para a rua este ano, mas precisamos realizar todos os testes. Esse sistema não pode falhar.

Teremos mais serviços tecnológicos?

Sim. O aplicativo Siu Mobile mostra em tempo real a localização do ônibus. Os cegos também podem, por meio do smartphone, avisar sua localização para o motorista. Em breve, os passageiros poderão dar nota à sua linha, também em tempo real, o que vai nos ajudar a melhorar ainda mais o serviço de transporte público. Vamos saber qual é a linha mais reclamada.

Qual avaliação você faz do rotativo digital?

É um sucesso. Mas ainda vai demorar alguns anos para que eu possa informar à população em tempo real a disponibilidade de vagas. Por enquanto, o que fizemos foi colocar a folhinha azul no smartphone. Com isso, já consigo saber quais horários do dia o rotativo é mais ativado e o dia da semana em que os motoristas mais compram. Sei que na sexta-feira as pessoas não gostam de ativar o rotativo digital. Consigo saber também que no período da tarde mais multas são aplicadas.

O uso dos patinetes elétricos será regulamentado?

Fomos uma das últimas capitais brasileiras a receber aplicativos de aluguel de patinetes elétricos. Assim, estamos coletando boas práticas no mundo inteiro, que não são muitas. Paris e Madri regulamentaram, mas não deu certo. Londres também, mas de forma branda. O serviço de compartilhamento de patinetes elétricos é recente, começou a ser disseminado em 2017. Montamos, portanto, um grupo de trabalho composto pela Secretaria de Saúde, guarda municipal, regulação urbana, entre outros. Nossa ideia é colocar um projeto de regulamentação em consulta. Queremos soltar uma norma educativa. Não procuramos ser os donos da verdade. A ideia é dar segurança ao usuário e ao resto da cidade.

E como está sendo feito o levantamento dos acidentes?

Quando é registrado um acidente de trânsito convencional, consigo acesso pelos boletins de ocorrência. Mas, quando acontece um acidente envolvendo patinetes elétricos é o próprio Pronto Socorro que repassa. E muitas das vezes, a pessoa que se acidenta nem procura atendimento, ou seja, não entra para as estatísticas. É outra questão que devemos melhorar.

A construção de mais ciclovias integradas não poderia reduzir os acidentes?

Há projetos de novas ciclovias e estamos esperando o governo liberar recursos, mas há outro debate acontecendo sobre a real necessidade de mais pistas. O código de trânsito já fala que os motoristas devem dar preferência aos mais frágeis. Às vezes, venho trabalhar de bicicleta e sinto isso na pele. Se os motoristas nos respeitassem seria muito mais fácil.

Outras empresas de compartilhamento de patinetes e de bikes devem atuar em BH?

Todos os players desse mercado já demonstraram interesse em entrar, mas ainda não estou sabendo de outros aplicativos.

A famosa "Caixa Preta da BHTrans" é um assunto encerrado?

Era a principal bandeira da campanha política do prefeito e ela foi cumprida na íntegra. Na PBH, mostramos mais de 400 caixas de documentos. Todas as notas fiscais de compra das empresas foram abertas, assim como todas as folhas de pagamento. A contabilidade foi vasculhada. Mais do que isso não sei o que podemos fazer. O resultado apontou uma tarifa maior e o prefeito, com a sua sensibilidade, diante do desemprego e da recessão econômica, achou por bem não aumentar a tarifa para o valor indicado. A auditoria está no site da BHTrans. Toda vez que alguém voltar a falar em caixa preta será de forma maldosa.

*Leia também na edição impressa (nº 217) de Encontro

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