Revista Encontro

Artes

Artista retrata a força das sibilas, profetisas da antiguidade pagã

Cecília Dutra transforma personagens místicas da antiguidade em pinturas carregadas de simbolismo, textura e conexão espiritual

Daniela Costa
A artista visual Cecília Dutra: "Cada obra que faço leva minha oração, minha gratidão e todo o amor que sinto pela vida e pela arte" - Foto: Pádua de Carvalho
Quem nasce no Espírito Santo é capixaba, palavra de origem tupi- -guarani que significa “terra boa para lavoura”. A artista visual Cecília Dutra, natural de Vitória, traz em suas obras a influência da diversidade cultural do Estado, marcada por tradições indígenas, africanas e de imigrantes. Formada em história e produtora de teatro, ela encontra inspiração nas sutilezas da vida e naquilo que vai além do que os olhos podem ver. “É um mistério, como o da água, que é benzida para nos curar”, diz. Nessa pegada mística, há três anos a artista se dedica a retratar a essência de mulheres que marcaram a história do planeta: as sibilas, profetisas que na antiguidade greco-romana eram respeitadas e temidas por reis e imperadores.
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Há três anos, quando iniciou mentoria na Maison Escola de Arte, em Belo Horizonte, e começou a pesquisar sobre o tema, se deparou com um trabalho realizado pela historiadora Maria Claudia Magnani, da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), em Diamantina. “Fiquei encantada, pois se tratava exatamente do universo mitológico das sibilas e seus oráculos no contexto do mundo pagão”, afirma Cecília. O registro mais remoto dessas mulheres se dá na Babilônia, migrando depois para a cultura greco-romana. Por meio do documentário Sibila no Tijuco, dirigido e produzido por Fernando Libânio, a artista descobriu como a tradição antiga incorporada ao cristianismo também ganhou um papel de destaque nas celebrações da Semana Santa em Minas Gerais. 
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Inspirada nas cinco sibilas do ícone italiano Michelangelo Buonarroti, pintadas no teto da Capela Sistina, no Vaticano – Líbica, Cumeia, Délfica, Eritreia e Pérsica –, a artista iniciou a produção da primeira tela da série. Ela pretende realizar a exposição das obras ainda no segundo semestre deste ano, em Belo Horizonte. “Para mim, a arte tem história e precisa transmitir sentimento”, diz. Em busca da democratização da cultura, Cecília se empenha em levar a arte onde ela não está. “Gosto de expor em locais públicos, nas cafeterias, para desmistificar a crença de que a cultura é para poucos e só para quem tem dinheiro. Todo mundo tem o direito de apreciar e até de produzir arte, mesmo sem entender do assunto.” 

Uma de suas obras preferidas, intitulada Eles não sabem o que fazem, é um Cristo carregado de emoções. “Quando o pintei, não tive coragem de colocar espinhos na coroa.” Entre seus artistas de referência, está o seu bisavô, o italiano Túlio Samorini, pintor de afrescos que participou da obra do Cassino de Monte Carlo em Mônaco, em 1838, e que se mudou para o Brasil em 1908. “Talvez tenha herdado dele a técnica que utilizo, um espatulado com tinta acrílica, textura e muita luz.” Neta de avó parteira e benzedeira, Cecília acredita que a fronteira entre o real e o sobrenatural é sutil. Essa sensibilidade transparece em suas obras, carregadas de simbolismo e de uma forte conexão emocional. 

As telas produzidas pela artista, sempre em grande formato, trazem em seu estilo expressionista a estética humanizada a que se dedica. “Cada obra leva minha oração, minha gratidão e todo o amor que sinto pela vida e pela arte”, afirma

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