Revista Encontro

Teatro

Solo de Zahy Tentehar mistura canto e memória indígena em "Azira'i"

Espetáculo autobiográfico celebra a relação da artista com a mãe pajé e destaca herança ancestral em três sessões nesta sexta-feira (3) e sábado (4)

Da redação
Zahy Tentehar estrela o solo "Azira'i" - Foto: Leo Aversa/Divulgação
O espetáculo "Azira’i", escrito por Zahy Tentehar e Duda Rios e interpretado por Zahy, desembarca em Belo Horizonte para três apresentações no Sesc Palladium nesta sexta-feira (3) e sábado (4). O solo autobiográfico parte da relação de Zahy com sua mãe, Azira’i, a primeira mulher pajé da reserva indígena de Cana Brava, no Maranhão. 
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A montagem, dirigida por Denise Stutz e Duda Rios e produzida pela Sarau Cultura Brasileira, já conquistou o principal prêmio brasileiro de teatro nas categorias melhor iluminação e melhor atriz — feito que transformou Zahy na primeira artista indígena a receber essa distinção. 
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A peça celebra a memória, a tradição e a identidade indígena. “Sou a filha caçula da minha mãe. A nossa relação, como muitas de nossos brasis, foi diversa: cheia de semelhanças e diferenças, com muitos afetos e composições importantes para nossa trajetória. A presença de minha mãe é tão viva, que a nossa relação se faz continuamente importante. Quando pensei em trazê-la ao teatro, não foi para falar apenas dos meus sentimentos, foi para dialogarmos com nossos reflexos enquanto sujeitos coletivos. Gosto de nos ver, humanos, como espelhos, pois nossas histórias se entrelaçam e se compõem”, analisa Zahy.
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Azira’i faleceu em 2021, durante o processo de criação do espetáculo, iniciado em 2019, quando Zahy e Duda se conheceram nos bastidores da montagem de “Macunaíma”, dirigida por Bia Lessa. As conversas de camarim deram origem à dramaturgia. “O nosso maior desafio foi selecionar, entre tantas histórias que ela havia me contado ao longo de quatro anos, quais iriam compor a dramaturgia da peça. Às vezes queremos abordar muitas coisas num espetáculo e terminamos perdendo o fio da meada. Mas se temos um eixo narrativo claro, a chance do público se envolver é maior. Nesse aspecto, a chegada de Denise foi fundamental, pois ela entrou no projeto pouco antes do início dos ensaios, com um olhar fresco que nos ajudou a identificar o que era essencial pra nossa narrativa”, conta Duda Rios.
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A encenação aposta na simplicidade cênica, com apenas uma cadeira, uma cortina de corda crua e projeções assinadas por Batman Zavareze. A cenografia é de Mariana Villas-bôas, os figurinos de Carol Lobato e a iluminação de Ana Luzia Molinari de Simoni. “Fui conhecendo as memórias de Zahy durante os meses de ensaio e fui me impressionando a cada dia pela potência das histórias de vida que ela contava e das narrativas sobre a mãe.  Quando recebi o convite do Duda para me juntar a ele na direção desta montagem, tivemos conversas quase infinitas e  o trabalho não faria sentido se a gente não escutasse primeiro os desejos de  Zahy , afinal, é a história dela e  são muitas memórias junto com sua mãe. A partir dessa escuta e dos textos que ela e Duda escreviam começamos a tecer esse musical de memórias. O mundo da Zahy está no seu corpo, no seu canto, na sua presença, nas suas histórias, no que é único nela e que é também o outro”, reflete Denise Stutz.
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A peça alterna cenas em português e em Ze’eng eté, língua do povo Tentehar, trazendo à tona questões sobre aculturamento e identidade. “Uma história que é minha, mas também é a verdade de muitos brasis. É muito libertador poder falar do ser indígena de uma forma mais humanizada, sem estereótipos ou políticas. Quero poder contar a história de uma pessoa, como outras, que saiu de sua reserva, foi para a cidade, aprendeu uma outra língua e teve uma relação intensa com a mãe”, afirma Zahy.
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Recém-chegado do Festival de Avignon OFF, na França, “Azira’i” recebeu destaque em veículos como Le Monde, Libération e Le Figaro, sendo apontado como um dos melhores espetáculos entre as 1.700 produções apresentadas. Com direção musical de Elísio Freitas, responsável pelo álbum “Nordeste Ficção" de Juliana Linhares, a obra também inclui composições originais de Zahy e Duda Rios. O resultado é definido pela atriz como um verdadeiro “musical de memórias”, em que mãe e filha aparecem como mulheres distintas, diversas e espelhadas.

"Azira’i" - com Zahy Tentehar
Quando: sexta-feira (3), às 20h, e sábado (4),  às 16h30 e às 20h. 
Onde: Sesc Palladium (Rua Rio de Janeiro, 1046, Centro)
Ingressos: a partir de R$ 22 (plateia 3 meia-entrada)
Vendas no Sympla ou na bilheteria do teatro 

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