Revista Encontro

Comida boa

Circuito Gastronômico de Favelas chega ao Mercado da Lagoinha em BH

Evento, que acontece em 24 e 25 de maio, reúne cozinheiros de comunidades, shows, oficinas e ações sociais

Da redação
Dona Dirce, do Alto Vera Cruz, traz a tradicional Feijoada Senzala - Foto: Divulgação/Circuito Gastronômico de Favelas
Entre receitas passadas de geração em geração, música ao vivo e partilhas em volta da panela, o Mercado da Lagoinha, em Belo Horizonte, será palco, nos dias 24 e 25 de maio, de mais uma edição do Circuito Gastronômico de Favelas. Cozinheiros de dez comunidades da capital ocupam o espaço com pratos autorais, oficinas, encontros com chefs convidados e ações sociais que têm a comida como ponto de partida para o diálogo, a memória e a transformação.
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A programação gratuita inclui gastronomia popular, oficinas, apresentações musicais, atividades infantis e ações sociais. Os pratos serão vendidos diretamente pelos cozinheiros participantes, que passaram por capacitações em gestão, comunicação e técnicas culinárias.
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“Mais do que um evento, o Circuito é uma ação de fortalecimento das potências que existem nas comunidades. É uma vitrine para que esses cozinheiros tenham visibilidade, avancem em seus negócios e ocupem novos espaços”, afirma Danusa Carvalho, idealizadora do projeto e diretora da Casulo Cidadania, organização responsável pela realização. “Estar no Mercado da Lagoinha, um lugar simbólico da cidade, reforça nosso propósito de conectar a gastronomia das favelas com o centro da capital.”
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Sabores que contam histórias

No sábado (24), a partir de 12h, o público acompanha uma cozinha-show da chef Márcia Nunes, do restaurante Dona Lucinha, que apresenta a receita “Canjiquinha Salpicada de Vida”. Para ela, o prato tem valor nutricional, cultural e emocional. “Um alimento que se multiplica e alimenta um batalhão de gente. Preparado em panela de ferro, contribui para a absorção de ferro e pode atuar no combate à desnutrição infantil”, afirma, citando pesquisa da UFMG. Márcia também relembra a importância afetiva da canjiquinha: “Mamãe dizia que a vida chegava ao prato no toque final do cheiro-verde. A cor neutra da canjiquinha ganhava vida com o verde da cebolinha e da salsinha.”
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Ainda no sábado, o chef Américo Piacenza apresenta o Projeto Sopa de Pedra, com preparo coletivo do Carbonara Mineiro, que será distribuído entre moradores de rua do entorno. A proposta é transformar a rua em espaço de encontro e partilha. “A ideia não é entregar um prato bom de comida, mas produzir junto, tirar as barreiras e criar um movimento horizontal onde todo mundo está no mesmo nível”, destaca Américo.
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A música fica por conta de Fabinho do Terreiro, que comanda uma roda de samba com participação de Dona Elisa, Dona Lucinha Bosco e Seu Domingos do Cavaco. O DJ Joca também se apresenta.

Ancestralidade e afeto no domingo

No domingo (25), a programação começa com a cozinheira Beth Coutinho, semifinalista do MasterChef+ 2022, que conduz uma conversa com o tema “Simplesinho mesmo”. Ela compartilha suas experiências com a comida aprendida na infância, e fala sobre como cozinhar com alegria e atenção aos detalhes se tornou o centro do seu trabalho. Hoje, Beth comanda a cozinha da Fazenda Santa Bárbara, em Sabará, e realiza eventos no Espaço Cultural Lajinha, além de atuar em festivais gastronômicos.
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A ancestralidade quilombola também está presente com a participação de Kriola Taty, às 13h. Integrante do Quilombo Mangueiras, ela apresenta o kubu, uma broa assada em folha de bananeira, e conduz a palestra “Sabores de raiz, herança das panelas quilombolas”. “É muito rico trazer e poder desfrutar dessa forma ancestral de cozinhar e manter esse legado vivo”, afirma. Para ela, a culinária quilombola é uma forma de preservar a memória e resistir ao apagamento cultural. “Cozinhar é um ato de resistência, celebração e continuidade histórica.”
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O encerramento musical do domingo será com a Orquestra Cabaré, que retorna aos palcos com repertório voltado ao samba. O grupo reúne músicos como Thiago Delegado, Manu Dias, Raquel Coutinho e outros nomes conhecidos da cena musical de Belo Horizonte. O DJ Thiagão também integra a programação.
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Legado

O evento faz parte de um projeto mais amplo de fortalecimento da gastronomia de base popular: a futura Casa da Gastronomia Social, prevista para ser inaugurada em 2025. O espaço funcionará como centro de formação, produção e convivência para cozinheiros das periferias de Belo Horizonte. A proposta inclui cursos, oficinas, refeições a preços populares e serviços como catering e produção de alimentos congelados.

O Circuito Gastronômico de Favelas é realizado desde 2017 e já passou por diferentes territórios da cidade. Esta edição tem patrocínio da Cemig, por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura.

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