O tema da inflação voltou ao noticiário. É um claro exagero soar o alarme, mas não há dúvida de que o dragão dos preços assusta. Janeiro registrou o mais alto pico de carestia dos últimos seis anos, obrigando o governo a promover corte de R$ 50 bilhões no orçamento. Os analistas do mercado financeiro aumentam progressivamente, semana sim, semana também, a expectativa para a inflação deste ano – a média das últimas projeções já mostra alta de quase 6,3%. O Banco Central aumenta os juros para conter a sangria – no fim do mês passado, a taxa básica subiu para 12% ao ano, nível mais alto em dois anos.
Encontro estudou os reflexos dessa nova realidade sobre Belo Horizonte. Conversou com economistas, especialistas em preços e, principalmente, consumidores. A conclusão é boa para a cidade: ainda que alguns itens preocupem – sobretudo o aluguel e os imóveis prontos e lotes à venda –, BH ainda é uma cidade grande que alia qualidade de vida sem ser tão cara. Acredite, é isso mesmo, por mais que as contas salgadas do dia a dia o deixem nervoso...
A cidade está entre as capitais mais baratas do país, segundo a Pesquisa Mercer de Custo de Vida no Brasil, que a coloca na sétima posição entre 10 grandes cidades brasileiras.
Os dados confirmam o que já foi percebido por aqueles que vieram de outras capitais para BH nos últimos anos. É o caso da relações públicas Mariana Melo, que morou em São Paulo por cinco anos e voltou à sua cidade natal. “Aqui, consigo fazer coisas que não fazia em São Paulo, como ir ao salão todo fim de semana para fazer uma massagem. Você sente a diferença na conta bancária. Chegava o fim do mês e o dinheiro estava contado”, compara Mariana.
Para alegria de Mariana e de muitas outras mulheres, a capital mineira tem os serviços de beleza – como salão, academia e perfumaria – mais baratos do país. “Em São Paulo, um corte de cabelo sai por R$200. Aqui, em um salão do mesmo nível, é R$ 90, no máximo. O mesmo vale para outros tipos de serviço”, afirma a relações públicas.
O economista e professor da Faculdade Senac, Adriano Porto, explica a equação que faz Belo Horizonte ter preços inferiores aos de várias capitais. Segundo ele, a maior concorrência em alguns setores, principalmente o de combustível, colabora para que a conta seja menor. “Não temos um monopólio como existe em outras capitais, onde o setor é bem mais cartelizado.
Um desses itens é o custo do transporte. O fotógrafo Rodrigo Lima já passou por Porto Alegre, Rio de Janeiro, Brasília e, há oito meses, recebeu uma proposta profissional para deixar São Paulo e vir trabalhar em BH. “Escolhi morar na zona Sul para abrir mão do carro. O transporte público aqui é barato; o único empecilho é que são poucas linhas. Mas o táxi, por exemplo, é muito mais barato: gasto R$ 30 por dia, bem menos do que gastava nas outras cidades”, diz.
Apesar dos poucos meses em terras mineiras, o fotógrafo define bem a capital mineira: “Belo Horizonte me lembra as cidades de grande porte do interior paulista: é uma cidade grande, que oferece qualidade de vida e o custo de vida é acessível”.
Se o custo de vida em Belo Horizonte pode ser considerado baixo, alguns itens pesam no orçamento doméstico. O aluguel de imóveis, segundo o Instituto de Pesquisas Econômicas e Administrativas (Ipead-UFMG), subiu 12,5% nos últimos 12 meses, enquanto a inflação acumulada foi de 6,08%.
Ariano Cavalcanti, presidente da Câmara do Mercado Imobiliário (CMI), diz que essa é uma tendência nacional e não vê uma solução a curto prazo. Segundo ele, o culpado pelo alto custo dos imóveis é o gigantesco déficit habitacional que, somado ao crescimento econômico dos últimos dez anos, resultou num boom imobiliário. “O que aconteceu é que, desde 1986, quando o BNH foi extinto, o país mergulhou numa crise profunda de hiperinflação, e isso criou uma demanda imobiliária reprimida fora do normal. Quando alcançamos a estabilidade monetária, o mercado começou a crescer vigorosamente. Todo mundo quer comprar e alugar, mas não tem oferta no mesmo nível”, explica.
Para o economista Adriano Porto, em cidades como Belo Horizonte e Rio de Janeiro a situação se agrava devido às condições geográficas. “Vivemos numa cidade que não tem área de expansão.
Ainda assim, o representante comercial José Antônio Viana e sua mulher, Mônica Viana, não se arrependem de ter deixado São Paulo com os dois filhos para viver em BH. O casal mantém uma planilha com todos os gastos e, segundo Viana, a diferença entre a casa que está alugada em SP e o que ele paga de aluguel em BH é recuperada nas mensalidades escolares dos filhos.
“Eu já fiz a conta. Em maio do ano passado, paguei R$ 893 de mensalidade para a Juliana. Em junho, quando mudamos para cá, essa despesa caiu para R$ 490. É uma diferença de 30% para o mesmo nível de educação. Economizo 60% com escola para meus dois filhos.”
Mas, para que continue sendo, além de uma cidade barata, um lugar bom para se viver, é preciso planejamento, como lembra o economista Adriano Porto. “Nesse cenário de crescimento econômico e reconstrução da cidade, é preciso investir em trens urbanos e novas linhas de metrô. Só assim iremos garantir a manutenção da qualidade de vida da cidade”.
Impossível discordar...
BH no ranking*
Veja a posição da cidade na pesquisa por segmentos. O 1º lugar é a mais cara. O 10º, a mais barata. Capitais pesquisadas: SP, RJ, Salvador, BH, Goiânia, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Fortaleza e Manaus
6° |
Alimentação (arroz, massas, carnes, frutas, restaurantes...) Manaus é a capital onde produtos in natura e restaurantes são mais caros. Salvador é a capital mais barata nesse quesito |
4° |
Transporte (automóvel, combustível, transporte público...) Apesar do metrô, o transporte em São Paulo é o mais caro. Fortaleza é onde menos se gasta |
6° |
Moradia (aluguel, condomínio, telefone...) Os imóveis para aluguel e compra são mais caros em São Paulo. Já a cidade de Curitiba tem os menores valores |
7° |
Educação (cursos e material escolar) São Paulo é a capital onde educar os filhos é mais caro, e Recife onde é mais barato |
7º |
Lazer e entretenimento (academia, cinema, casas noturnas...) São Paulo tem o lazer mais caro, e Fortaleza o mais barato |
4° |
Serviços e suprimentos domésticos (produtos de limpeza e serviços domésticos) Em São Paulo os serviços também são os mais caros. Recife é a capital mais barata |
9° |
Vestuário e calçados (roupas, calçados, cama, mesa e banho) A cidade onde é mais caro se vestir é São Paulo. BH só perde para Salvador entre as capitais com menor custo |
10° |
Cuidados pessoais (perfumaria, salões de beleza, higiene pessoal, medicamentos) A cidade onde é mais caro se vestir é São Paulo. BH é a mais barata entre as dez capitais. |
3° |
Bebidas (cerveja, uísque, espumante, vinho, cigarros) Beber em Salvador é mais caro do que em qualquer outra cidade. No Rio, a conta é a menor do país. |