Revista Encontro

None

Saúde é só um detalhe

Carolina Godoi
None - Foto: Eugênio Gurgel

ando a família Obama esteve no Brasil, no último mês de março, a cozinha do Palácio do Planalto teve de se adaptar a um pedido pouco usual em visitas de chefes de estado: a comida deveria ser vegana. Não era permitido nenhum alimento de origem animal nas receitas: carnes de qualquer tipo, leite, queijos, ovos, nem mel ou gelatina. Algo que está se tornando comum em outros países, como Estados Unidos, Austrália e Grã-Bretanha, já que formadores de opinião como o beatle Paul McCartney também seguem o mesmo estilo de vida. O músico até lançou campanha mundial pela Segunda sem Carne, apoiado pela apresentadora Oprah Winfrey e adotado pela atriz Natalie Portman como regra diária. Corrente do vegetarianismo, quem segue o veganismo o faz pela opção ética, o respeito à vida e ao bem-estar dos animais, adicionando-se aí, a busca por um planeta mais limpo e sustentável.

Tudo pela redução de emissão de gases. Já que relatórios da ONU revelaram que a criação de animais de corte é responsável por cerca de 18% das emissões mundiais de gases estufa, responsáveis pelo aquecimento do planeta – mais, por exemplo, que a indústria global de transportes. No Brasil, a corrente veganista ainda não é tão grande como na Europa. Mas já tem alguns adeptos.

A nutricionista biomolecular Diana Fonseca Coulon aponta que já existem lojas e vários restaurantes especializados na capital mineira.

“Até os supermercados já possuem seções voltadas a este público. E estão se adaptando à demanda”, conta. Ela afirma que é preciso acompanhamento de especialista nutricional para uma dieta bem balanceada e fazer exames periódicos para conferir a possível falta de algum nutriente, mas que no geral, os veganos, em termos de saúde, podem sair na frente. Segundo um estudo científico publicado em 2009 pelo American Journal of Clinical Nutrition, comparada com outras dietas vegetarianas, as dietas veganas têm mais fibras. E contêm menos gordura saturada, colesterol. “Os veganos tendem a ser mais magros, têm colesterol bom e pressão arterial mais baixa. O que reduz o risco de doenças cardíacas”, afirma.

Aos 8 anos de idade, quando soube que a carne era um animal morto, o belo-horizontino Siri Sahib, professor de ioga, se decidiu pelo vegetarianismo. Influenciado por documentários que mostravam o sofrimento dos animais confinados para a produção do leite ou as condições em que galinhas de granja viviam para a produção de ovos, há oito anos ele e sua esposa, a mineira Sat Kartar adotaram em casa a dieta vegana.

“Vivemos na era da informação, por isso ampliei meu olhar para além da alimentação”, conta.  Cortou também qualquer produto proveniente de animais como couro e seda. E só usa cosméticos e medicamentos não testados em animais. “Tenho profundo respeito pela vida. Acho que não devemos fazer sofrer nem privar o animal da vida dele como deve ser vivida”, opina. Pensando nisso, Sahib resolveu buscar esses alimentos (como sorvete feito de castanha de caju ou hambúrguer feito de tempeh, a soja fermentada) para fazer seus próprios alimentos em casa. Hoje, ele vende, alguns destes produtos, numa loja no bairro São Bento.

O médico Frederico Pretti, que possui clínica que leva seu nome, especializada em nutrição, nutrologia e saúde ortomolecular, afirma que em trinta anos de experiência em consultório com pacientes veganos, não vivenciou nenhum problema de saúde causado pela dieta.
Mas aconselha atenção à reposição de vitamina B12, que pode ser feita por suplementos alimentares ou medicação. E o ferro, obtido de folhas verdes escuras com adição da vitamina C do limão, por exemplo.
“É necessário realçar que as pessoas que normalmente adotam este padrão alimentar incorporam outras mudanças em seus hábitos, que lhe trazem inúmeros benefícios, como: o consumo de cereais integrais e açúcar mascavo, aumento do consumo de vegetais e frutas e uma redução significativa de produtos industrializados, corantes artificiais, gordura trans, proteínas e sódio”, diz.
 

Os veganos dizem não para..

Qualquer alimento de origem animal ou receita que contenha ingrediente derivado de animais. Seja carne de porco ou boi, frango, peixe, leite, ovos, mel e gelatina

Roupas feitas com couro de boi, cobra ou jacaré, peles, lã e seda
Todos produtos desenvolvidos a partir de testes com animais (remédios, cosméticos, sabonetes e pasta de dentes). É possível verificar lista de empresas que não testam no site www.guiavegano.com
Circos, zoológicos, touradas, rodeios ou qualquer forma de entretenimento que utilize animais
Venda e compra de quaisquer animais de estimação. Preferem adotá-los buscando abrigos especializados


 

 

A história e a antropologia mostram que o homem, historicamente, sempre foi um caçador e colhedor. E teve de se adaptar a novos gêneros alimentícios na sua dieta para sobreviver. Pretti, no entanto, não gosta de avaliar a questão sobre tal prisma. “Nosso código genético é praticamente idêntico ao do homem da era paleolítica. Mas nossas condições de vida se modificaram drasticamente. Podemos dizer que possuímos corpos da idade da pedra em plena era atômica, uma discordância nociva, e talvez responsável por muitos dos males que acometem o homem moderno”.

Além da saúde, a preocupação de Beth Moura, professora de inglês e vegana desde 2004, é o meio ambiente.

Toda a família, que ela frisa ser muito saudável, é adepta do veganismo. “Nossa preocupação é com os animais e com a natureza. A pecuária é a maior responsável pela destruição da Amazônia, gasta-se muito mais água e consome-se muito mais energia para produzi-la, poluindo o solo e ar”, diz. A restrição alimentar não foi problema para ela; pelo contrário, estimulou sua criatividade. Aprendeu a cozinhar e hoje dá cursos e desenvolve cardápios veganos por encomenda.

O leite de vaca ela substitui pelos de cereais como aveia, castanhas, soja e de arroz. Em receitas de bolos e biscoitos substitui o ovo pela baba da linhaça, que é fervida e coada. O queijo saiu de cena e entrou o tofu. A manteiga foi trocada pelo óleo de coco.  Resultado: nunca teve gripe, dor de cabeça ou qualquer doença desde então. Foi pensar no bem-estar dos animais e do planeta e quem ganhou mais foi ela.

Como substituir os nutrientes de animais

 

Proteína Combinação de arroz integral e feijão, soja, lentilha, grão de bico e outras leguminosas como feijão verde, vagem, ervilha em fava
ômega-3, 6 e 9 Linhaça, gergelim, pistache, semente de abóbora, amêndoa, amendoim, nozes, macadâmia, castanha-de-caju, castanha-do-pará, pequi, abacate, azeitonas, azeite extra virgem e óleos prensados a frio
Cálcio Milho verde, gergelim, cheiro verde, manjericão, orégano, canela, aveia, amêndoa, castanha-do-pará, sementes, cereais integrais e vegetais de folha verde escura
Ferro Feijão, cereais integrais, vegetais de folha verde escura temperada com limão (a vitamina C do limão melhora a absorção do ferro), melado de cana, açúcar mascavo, aveia, castanha-do-pará e açaí
B12 Algas, grãos germinados, aveia e levedo de cerveja
Observação: Seria aconselhável a ingestão de 2 comprimidos de levedo de cerveja no desjejum, almoço e jantar para diminuir a possibilidade de deficiência de vitamina B12. Também pode se aplicar uma injeção intramuscular de Rubranova 5000, que forma um depósito de B12 que tem a duração de cerca de 8 meses.

 

.