Revista Encontro

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"Não há mais risco de apagão"

João Pombo Barile
None - Foto: Maíra Vieira

O engenheiro mineiro Aloísio Vasconcelos anda preocupado. Um dos maiores especialistas brasileiros em energia, ele acha que os brasileiros não têm se dado conta de como a energia elétrica é importante para o desenvolvimento da nação. “O mundo moderno não vive sem energia”, ensina Vasconcelos. “No discurso de posse dos últimos 14 líderes que assumiram o governo dos países mais importantes no planeta, 11 enfatizaram a energia em sua fala”.

 

Segundo Vasconcelos, a maioria da população convive com a energia sem se dar conta de que precisa dela. Sem energia, a economia simplesmente não cresce. “A cada ponto de crescimento do PIB, a energia tem que crescer 1,2. Se o nosso PIB cresce por ano, por exemplo, 5%, a oferta de energia deve crescer 6% para conseguir acompanhar este crescimento”, ensina o especialista, que foi presidente da Sociedade Mineira de Engenheiros, diretor da Cemig, presidente da Eletrobras e presidente do Conselho de Furnas.

 

ENCONTRO – Em 2009, o senhor já alertava para os perigos de o Brasil viver um novo apagão nos próximos anos. Esse risco existe?

ALOÍSIO VASCONCELOS – É preciso definir o que se entende por apagão.

Apagão é quando falta energia por escassez do produto. Quando a oferta é menor do que a demanda. Aí é apagão. E isso existiu no final de 2001, durante o segundo governo de FHC: a demanda foi maior do que a produção e fomos obrigados a racionar. Agora, a mídia passou a chamar, nos últimos anos, toda interrupção da energia elétrica de apagão. Isso é falso. Isso é interrupção. Costuma durar algumas horas e depois tudo volta ao normal.

 

ENCONTRO – Usando o termo nesta acepção: apagão é quando falta energia elétrica por escassez do produto. Corremos esse risco?

ALOÍSIO VASCONCELOS – Eu diria que não. O governo tomou, nos últimos anos, as medidas necessárias para evitar um apagão. A obra de Santo Antonio, no Rio Madeira, por exemplo, foi uma obra importante e ajudou a evitar o apagão. Além disso, Jirau, e a usina de Belo Monte, que está começando a ser feita agora. E temos ainda algumas usinas eólicas e a gás que também estão sendo feitas.

E mais: não podemos deixar de levar em consideração que o país hoje se modernizou: tanto as usinas têm produtividade maior, com turbinas mais eficientes, como a população hoje está mais consciente e utiliza lâmpadas mais econômicas e motores mais eficientes. Hoje, estou muito tranquilo. E diria que não corremos risco de apagão em curto prazo. No longo prazo, daqui a cinco anos, vai depender da economia. Se crescermos uma média de 4% nos próximos anos acho que não teremos problemas.

 

ENCONTRO – A energia hidráulica ainda é a mais importante matriz energética no Brasil?

ALOÍSIO VASCONCELOS – Sem dúvida. Setenta por cento é hidráulica e 30% é o resto. A nuclear responde por só 1,5%. E chegará a 2% com a Usina de Angra 3. Como engenheiro elétrico, sou do setor hidráulico e apaixonado pelo tema. Defendo a construção de usinas hidroelétricas por todo o país.

Fiz isso na Cemig e na Eletrobras. No final de 2003, começou um movimento na Alemanha contra as hidrelétricas. E aí os ambientalistas radicais começaram um negócio inaceitável que está gerando, principalmente no Brasil, impossibilidade de se construírem usinas hidráulicas. Criaram-se tantos entraves que pergunto: onde nós vamos poder gerar energia para que o país possa continuar a crescer 5%? Fala-se muito em energia eólica. Mas a produção ainda é muito pequena e não atende à demanda. Ou os ecologistas se flexibilizam a favor das hidrelétricas, ou teremos que explorar outros tipos de energia. E entre elas a nuclear, que eu defendo. Não tenho medo dela.

 

ENCONTRO – Mas a energia nuclear não é muito cara? Alguns analistas criticaram o custo de construção de Angra 3, que consideraram alto...

ALOÍSIO VASCONCELOS – Caro é a escuridão. Caro é faltar energia e você não poder ter indústria, não poder gerar mais empregos, renda e progresso. A Usina de Angra 3, que foi aprovada em 2007 e teoricamente deve estar pronta em dezembro de 2013, é uma usina de 1.400 megawatts, feita em cima de onde a energia será consumida. Portanto, não precisaremos investir nenhum centavo em transmissão. Agora, a Usina de Angra 3 será construída em condições de segurança e desempenho muito melhores que Angra 1. Não é razoável rejeitar a energia nuclear.

 

ENCONTRO –Serão construídas mais usinas nucleares no Brasil nos próximos anos?

ALOÍSIO VASCONCELOS – No plano decenal, que fizemos na Eletrobras e que vai de 2006 a 2016, prevíamos quatro usinas nucleares. Recentemente, o programa foi refeito e revisto. E já se fala em seis. Hoje, alguns ecologistas já passaram a aceitar mais as usinas nucleares. Isto porque elas geram menos danos à camada de ozônio do que as outras formas de energia. Mas insisto: quem está levando a essa situação de termos que construir mais usinas nucleares é o excesso de radicalismo na regulamentação das usinas hidráulicas. As construções de várias usinas no Brasil estão paradas por causa disto.

 

ENCONTRO – O acidente na usina nuclear de Fukujima, no Japão, reavivou o debate se vale a pena ou não produzirmos energia elétrica. O que o senhor pensa disso?

ALOÍSIO VASCONCELOS – É preciso desmistificar. O problema de Fukujima não foi nuclear. A usina não teve nenhum problema. Aconteceu que um terremoto, violentíssimo, acabou provocando um tsunâmi que arrebentou a usina toda. Foi um problema geológiconão nuclear. A usina estava operando sem nenhum problema. A imagem que faço do acidente do Japão é como se você tivesse um carro e estivesse dirigindo e caísse no buraco. Você vai dizer: o carro é ruim, não presta? Claro que não: o problema não é o carro. É o buraco. Mas que fique claro. Eu não sou um apologista da energia nuclear, mas sim da hidráulica. Sou barrageiro; gosto é da água.

 

ENCONTRO – O senhor acha que são excessivas as exigências ambientais para a construção de hidrelétricas?

ALOÍSIO VASCONCELOS – Elas têm sido muito exageradas, sim. Mais do que em outros países. Isso não é de todo ruim, mas há inconvenientes. Uma hora você inviabiliza as usinas. Um exemplo: no Rio de Janeiro, existe uma usina chamada Barra do Pomba, que estava orçada em R$ 80 milhões. Este era o custo final: prontinha e já funcionando. Mas as exigências ambientais foram tantas que R$ 60 milhões teriam que ser gastos em condicionantes. Resultado: isso matou a usina; inviabilizou a obra.

 

ENCONTRO – A energia eólica é cara no Brasil?

ALOÍSIO VASCONCELOS – Eólica é uma forma de energia limpa, que o mundo inteiro está usando, e seria extraordinário se nós pudéssemos ter mais eólicas, mas elas ainda são caras. O Brasil tem hoje, no total, 100 mil mega de potência instalada. E a eólica deve ter um pouco mais de 2% desse total. O custo de geração de energia estava na faixa de R$ 280 por megawatt/hora. Depois caiu para R$ 200. E no último leilão foi para R$ 163. A hidrelétrica é ainda a mais barata. E digo mais: a energia hidrelétrica é, de todas, a mais econômica, de vida mais longa, de melhor desempenho e, até digo sem medo de errar, a que menos agride o meio ambiente. Nas usinas do rio Madeira, só para ficar em um exemplo, não existem grandes barragens, grandes construções. As máquinas funcionam dentro da água, como se fossem submarinos. A água passa por elas e gera energia. O problema é que os ecologistas não querem usina nenhuma: eles acabaram de inviabilizar Santa Isabel, no rio Araguaia, em Tocantins. E era uma usina prontinha. O que a Vale fez então? Importou uma usina a carvão mais poluente.

 

ENCONTRO – A energia elétrica em Minas Gerais é muito cara?

ALOÍSIO VASCONCELOS – Repito o que falei no início: cara é a escuridão. Caro é o entrave para o progresso. Em Minas, quem determina o preço é a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em Brasília. Agora, os componentes da fixação de preço, que são apresentados à Aneel, podem levar a população a inferir que aqui a energia é mais cara. Não é. A tributação aqui é mais cara? É. O imposto aqui é mais caro que em outros estados. O preço da energia elétrica aqui é mais caro por causa dos tributos.

 

ENCONTRO – Recentemente o Senado brasileiro votou a lei que modificou as bases financeiras do Tratado de Itaipu, de 2009. A alteração eleva de US$ 120 milhões para US$ 360 milhões anuais a quantia paga pelo Brasil ao Paraguai pela cessão de energia de Itaipu. Esta foi uma medida correta?

ALOÍSIO VASCONCELOS – Acho que não poderíamos ter mexido naquele tratado até 31 de dezembro de 2023. O governo federal tem lá sua boa relação com o Paraguai. E encontrou uma solução que eles acharam boa. Na minha visão, o Tratado de Itaipu é, como gostava de dizer o ministro Magri, “imexível”.

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