Revista Encontro

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O polêmico Jaeci

Tereza Rodrigues
None - Foto: Emmanuel Pinheiro, Eugênio Gurgel, Reprodução e Divulgação

Bom de lábia, em pouco tempo de conversa Jaeci Carvalho já convence que os 31 anos de jornalismo o ensinaram que polemizar traz mais vantagens que desvantagens. Alguns prós ele enumera na ponta dos dedos: “Na minha área, sou um dos profissionais mais bem pagos do país; meu trabalho é respeitado por torcedores e jogadores de futebol; as amizades que conquistei me permitem dar furos históricos”. Com ganhos que chegam, entre TV, jornal e merchandising, a 80 mil reais por mês, ele foi o único jornalista convidado para o casamento de Ronaldo e Daniella Cicarelli. Menos de três meses depois, a primeira notícia da inesperada separação do casal foi Jaeci quem deu. Ele, aliás, adora citar o jargão “se Jaeci deu, vai acontecer ou aconteceu”.

 

Sobre os contras, também não deixa de falar. Seu estilo bajulador de escrever a respeito de algumas personalidades do universo esportivo irrita colegas de profissão. Perfis falsos que denigrem sua imagem bombam nas redes sociais, com piadas de baixo calão, principalmente no Twitter. “Uma vez um torcedor falou ao vivo em um programa de TV em que eu estava que não gostava de mim.

Fiquei tranquilo, deixei rolar e respondi: ‘Meus amigos particulares eu já escolhi e você não está entre eles. Agora, se você está assistindo, é porque gosta do meu programa. Um abraço e obrigado’. Quem precisa gostar de mim são as pessoas que eu escolhi para gostar, e só”, conta.

 

Com Sorín, Marques e Álvaro Damião, que dividem com Jaeci
a apresentação e os comentários no programa Alterosa no Ataque
 

 

Ao enumerar seus amigos famosos, entre eles Renato Gaúcho, Romário e Vanderlei Luxemburgo, Jaeci conta que Galvão Bueno é padrinho do seu filho mais velho, João. Álvaro Teixeira da Costa, diretor-presidente do jornal Estado de Minas, seu empregador desde 1989, foi quem batizou o caçula, Lorenzo. São pessoas que ele conquistou pela convivência no trabalho, e, no seu entendimento, não há interesse, e sim afinidade. “Se um jogador percebesse que estou saindo com ele só para conseguir informações, não me consideraria amigo. Da mesma forma, se eu visse que alguém se aproximou de mim por causa da coluna que eu escrevo, não chegaria a ser amizade”, afirma.

 

Quem o conhece diz que Jaeci sabe separar amizade de trabalho, que não deixa de criticar um jogador ou técnico que vai mal na partida só por consideração, e que isso lhe custa, inclusive, desafetos temporários ou mesmo definitivos. Dunga, por exemplo, foi um “chegado” e hoje é seu maior inimigo no futebol. Para Jaeci, depois que comandou a seleção brasileira, o técnico se tornou uma pessoa rancorosa. “Eu torci contra ele. Sabe por quê? Porque ele confundiu as coisas. Achou que, como a gente era amigo, eu não deveria fazer certas perguntas.

Mas eu apertei mesmo, estava ali para fazer jornalismo”.

 

 

 

Roger Flores, armador do Cruzeiro, diz que entende isso muito bem e esse é um dos motivos de ele gostar da companhia e respeitar o jornalista. Eles se conheceram em Búzios, há quase 18 anos, se aproximaram nas primeiras partidas do jogador com a camisa verde e amarela e, agora que os dois sotaques cariocas moram na mesma cidade, a relação se estreitou. Em festas de família, em Belo Horizonte, ambos frequentam a casa um do outro. Suas esposas também são amigas. “Quando não atuo bem, ele chama a atenção publicamente, como faz com outros jogadores. Não vejo problema. Até gosto desse compromisso com o público. Mas quando não estamos trabalhando, não gosto de falar de futebol. Ele é um cara bacana, refinado, conversamos de assuntos que estão em voga”, conta Roger.

 

Em 2000, Jaeci recebeu dois prêmios nacionais de jornalismo, o Ayrton Senna de Jornalismo e o Imprensa Embratel, com a série de reportagens Meninos dos Brasil, publicada no Estado de Minas em julho de 2000. Hoje, está “desencantado” com a internet – ele desativou o blog que tinha no portal Uai (na época, era o mais acessado), não usa Facebook nem Twitter, só e-mail.

Jaeci gosta mesmo de comentar o que está na mídia. Não abre mão de ler jornais impressos no café da manhã, diz que enquanto não tiver punição para internautas irresponsáveis não voltará a escrever para a rede e não deixa de dar sua opinião sobre os comentários online que seguiram à reportagem da revista Piauí com o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira. O texto deu o que falar porque expôs um empresário sem ética, interesseiro e mal educado nas várias situações em que a repórter Daniela Pinheiro o acompanhou. Jaeci diz que ela fez um bom trabalho. “Eu o conheço bem, ele é daquele jeito que ela escreveu mesmo”.

 

No programa de rádio 98 Futebol Clube, que satiriza o jornalista com
o personagem Jaeci Baralho: “As pessoas só imitam quem faz sucesso”
 

 

Como gosta de contar caso, o repórter falou de algumas vezes que esteve na casa de Ricardo Teixeira, tomando uísque e contato piada, mas que depois que sua coluna abordou o escândalo na CBF eles não se falaram mais. “Só que, se precisar, ligo para o celular dele agora”, garante. Sem medir palavras sobre o homem que se autointitula “dono” da maior entidade do futebol brasileiro, Jaeci diz que, por questões morais, se estivesse no lugar dele, abriria mão da presidência.

 

“Não acho certo a CBF ficar controlando quem vai transmitir os jogos do Campeonato Brasileiro. Se o Brasil fosse um país sério, a RedeTV! transmitiria, pois foi a única emissora que participou da licitação. Mas acontece que, por uma jogada política do Ricardo, a Globo pôde negociar diretamente com os clubes, e agora a Record está batendo (falando mal) porque queria ter ganhado. Enfim, as empresas retaliam de acordo com suas necessidades. Eu não concordo com isso”.

 

Há quem não concorde também que a CBF possa custear todas as viagens de jornalistas que vão a outros países cobrir jogos da seleção. Jaeci não vê problemas nisso, mas o colega de profissão Juca Kfouri, outro inimigo declarado que ele tem, já foi até processado por falar disso. Em um post de julho de 2006, Kfouri escreveu em seu blog que Jaeci estava cogitado para ser assessor de imprensa da CBF e que suas atitudes motivaram a confissão pública do jornal Estado de Minas, na Justiça do Trabalho, de que sempre viajara com tudo pago pela CBF.

 

Ao ser perguntado sobre o relacionamento com Kfouri, Jaeci responde de pronto: “Nenhum. Não gosto dele e ele não gosta de mim”. Poucos segundos depois, Jaeci se lembra de uma passagem bem polêmica. Em um jogo do Brasil contra a seleção de Ruanda, o goleiro Taffarel, que vinha sendo duramente criticado por Kfouri, defendeu dois pênaltis e deu a vitória ao Brasil. Ao fim do jogo, quando todos os jornalistas desciam as escadas do estádio de Marselha, Jaeci chamou para a briga em alto e bom som: “Cadê o babaca que fica falando mal do Taffarel?”. Kfouri teria saído sem falar nada. “Homem que não reage a uma provocação dessas não é homem. Ele é um verme. Não tem caráter”.

 

Com a mulher, Alexia, e os filhos, Lorenzo e João: início numa padaria
e casamento de 11 anos
 

 

Se uns não gostam, outros admiram exatamente esse estilo provocador. Zeca, como é mais conhecido Geraldo Teixeira da Costa Neto, o diretor-executivo do Estado de Minas, diz que a polêmica desperta a emoção, e que aposta em Jaeci porque se uns amam e outros odeiam, prevalece a capacidade dele de ter boas fontes. “Isso é a essência do jornalismo. O Jaeci antecipa 80% das contratações dos clubes de Minas. Ele erra? Sim. Mas o índice de acerto dele é bem maior que o de outros. E o torcedor é ávido por esse tipo de informação. Quando não sabe nem da tentativa de negociação, fica isolado”, opina Zeca.

 

Depois de acompanhá-lo em três copas do mundo, Zeca gosta de exaltar que nem todo jornalista que vai ao mundial consegue falar com os jogadores e Jaeci tem prestígio para isso. “Não é à toa que Sorín e Marques toparam participar do nosso Alterosa no Ataque”, diz, referindo-se ao programa lançado pelo grupo Diários Associados no início de julho, estrelado pelo jornalista, pelos dois ex-jogadores do Cruzeiro e do Atlético e ainda pelo apresentador Álvaro Damião.
O programa jogou nas alturas a adrenalina de Jaeci. Na terceira semana de exibição, ele não poupou críticas aos times mineiros, mesmo tendo a participação ao vivo do jogador Magno Alves e do presidente Alexandre Kalil. “O Galo está cheio de jogador come-e-dorme”, disse.

 

Flamenguista declarado, Jaeci Carvalho nasceu em Pernambuco e cresceu no subúrbio do Rio. Chegou a jogar na divisão de base do Vasco, “mas só porque morava no São Cristóvão”. Hoje, o bom aluno que não quis seguir a carreira militar como os outros homens da sua família tem um luxuoso apartamento no Belvedere, anda de Mercedes e usa roupas de marca. Aos 51 anos, não esconde de ninguém o quanto é vaidoso.

 

A mulher, Alexia, o chama de “Cari”, abreviando o apelido “Carioca”, e se diz realizada com os dois filhos e os 11 anos de casamento. Eles se conheceram em uma padaria e menos de dois anos depois o jornalista e a ex-modelo já estavam no altar. Um amigo dos primeiros anos de BH, o empresário Rodrigo Feltri, diz que Jaeci não mudou quase nada depois que ficou famoso: “Ele é muito carismático, comunicativo, faz amizade fácil. Já fizemos muita farra, aproveitávamos a night, mas o tempo nos deixou mais sossegados”, abrevia.

 

O estilo inconfundível inspirou a criação do personagem Jaeci Baralho no programa 98 Futebol Clube, da rádio 98 FM. As frases que os ouvintes mais gostam são as que o apresentador Guilherme Mello puxa os “nóix mineirox temox que valorizar ox timex daqui”. Carvalho, o original, gosta da brincadeira e já participou do programa: “As pessoas só imitam quem faz sucesso”.
As noitadas em boates, bem ao gosto de jogadores de futebol, estão sempre nas lembranças dele. No início da carreira de Ronaldo no Cruzeiro, eles foram juntos a um show da cantora Fernanda Abreu, em Contagem. “Era muito diferente, ele não tinha nem carteira de motorista. Fui dirigindo o carro dele e, chegando lá, pedi aos organizadores para deixar a gente entrar no camarim, porque ele queria tirar uma foto com ela. Na Copa de 98, na França, tinha show dela lá e foi ela quem pediu para tirar foto com ele”.

 

Em 1995, Jaeci tinha um furo jornalistico que lhe daria destaque internacional, mas preferiu guardar, visualizando o quanto poderia ser melhor se poupasse sua fonte. “Ronaldo já era destaque na Copa América e o Zagalo o deixou no banco. Eu virei pra ele e perguntei: ‘Ele te colocou na reserva, e aí?’. Ronaldo me respondeu: ‘Esse velho está gagá’. Se eu publicasse isso, seria queimação para ele na certa. Quantos furos com ele eu consegui depois?”

 

Assessores de imprensa dos principais clubes e de jogadores também conhecem bem Jaeci. Faz parte da sua rotina ligar para eles e para dirigentes dos times (muitos deles companhias frequentes nos melhores restaurantes da capital) para sondar pautas. “Mas, geralmente, eu mesmo pauto o que vou escrever na coluna ou dizer na TV. Banco minha opinião”.

 

 

 

Rodrigo Paiva, assessor da CBF, o conheceu nos anos 1980, no badalado sítio de Renato Gaúcho,no Rio. Hoje, faz parte do grupo que passa informações quentes para Jaeci. “Ele é profissional experiente, premiado, conhece como poucos a engrenagem do futebol. As reclamações dos jogadores e técnicos quanto a ele são as mesmas em relação a outros jornalistas”.

 

Rodrigo mostrou bom humor na conversa com Encontro. Só pareceu irritado quando perguntado sobre a “relação estreita” de Jaeci com a CBF: “As pessoas têm inveja dele, porque ele é um cara muito bem sucedido. Qual o problema de construir um bom relacionamento com as pessoas com as quais você fala sempre? Se tivesse alguma coisa errada, seria conflituoso ele ter o desgaste que teve com o Felipão (em uma entrevista, o ex-técnico do Cruzeiro e da seleção não gostou de uma pergunta feita por Jaeci), você não acha? Não posso falar nada em relação a isso. As pessoas é que falam demais...”

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