Revista Encontro

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O táxi sumiu?

Daniela Costa
None - Foto: Junia Garrido, Geraldo Goulart

Não, você não está enganado. Realmente está faltando táxi em Belo Horizonte. As evidências comprovam e especialistas explicam os motivos. Basta lembrar, para começar, que a única licitação realizada para ampliação da frota na cidade foi há 16 anos.

 

Na época, foram liberadas 420 novas placas de táxi. A cidade contava então com pouco mais de 2 milhões de habitantes. De lá para cá, o crescimento da população foi de 13%, ou 284 mil pessoas a mais. Já o aumento dos táxis foi zero.

 

O presidente da OAB/MG, Luís Cláudio Chaves, reclama da demora no atendimento: "Recentemente quase perdi um evento por conta da ineficiência"
 

 

Para agravar a situação, das placas permitidas, apenas 287 estão em atividade. Juntamente com as antigas, o contingente atual é de 6000 placas, numa proporção de 395 habitantes para cada táxi.

BH perde para o Rio (apenas 198 cariocas para cada táxi), Belém (278), São Paulo (345), Porto Alegre (359) e Salvador (368).

 

E olha que a comparação pode ficar ainda pior para a capital mineira, como lembra Eduardo Caldeira, vice-presidente da Associação dos Taxistas do Brasil (Abratáxi). “Se levarmos em conta que Belo Horizonte possui convênio de praça livre com alguns municípios, como Contagem (380 táxis), Ribeirão das Neves (11) e Ibirité (25), a média vai para 600 habitantes para cada táxi, tornando a defasagem ainda maior”, afirma.

 

O projetista Luiz Cláudio dos Santos (ao centro,

ao lado de taxistas) usa táxi três vezes por dia e

achou a forma de driblar a falta do serviço, usando

sempre o mesmo ponto: “Virei cliente preferencial”

 

 

A BHTrans discorda e defende que não há a necessidade da ampliação do número de táxis.“Não podemos ser precipitados ao dizer que está faltando táxi e colocar mais carros na rua porque temos de dar sustentabilidade aos profissionais da área. O ideal é que o trânsito seja melhorado”, afirma Jussara Bellavinha, diretora de atendimento da empresa. Há projetos sendo pensados para a Copa das Confederações, em 2013, e para a Copa de 2014, mas a BHTrans não dá detalhes. Até o fim de 2011, também está prevista a criação de mais pontos de táxi próximos aos principais bares e restaurantes. E a implantação de 300 táxis especiais com cor diferenciada e mais luxuosos já teve início.

 

Outra questão ainda indefinida, mas já prevista, é a realização de licitação para ampliação do táxi acessível destinado a pessoas com necessidades físicas. Por conta do alto custo da adaptação dos veículos, atualmente existe apenas um deles circulando em BH. Bellavinha concorda, ainda, que existe uma defasagem real de táxi em horários de pico no período da tarde, mas afirma ser uma exceção e não a regra. “Não podemos mensurar a qualidade ou eficiência de um serviço com base apenas em momentos específicos”, diz.

 

 

 

Opinião que não é compartilhada por Osias Batista Neto, consultor em transporte e trânsito e ex-presidente da BHTrans. Para ele, a frota tem de ser redimensionada com base nos horários e períodos críticos. “É exatamente nos momentos de chuva, nos feriados e horários de pico que o usuário precisa ainda mais da prestação do serviço, e muitas vezes não é atendido”, afirma.

 

Há várias razões para o táxi ter sumido. O envelhecimento da população é um deles, já que um número crescente de idosos usa táxi. A ascensão econômica fez com que mais pessoas optem por pagar por esse tipo de transporte.

O alto custo de manutenção do carro próprio, a falta de estacionamento nas ruas, a ineficiência do transporte público e o medo da violência também são fatores determinantes.

 

O taxista Darley Nunes Otoni lamenta não atender a todos: “Muitos dão sinal, mas a preferência é dos conveniados da cooperativa”
 

 

Outro problema para achar táxi está no endurecimento na aplicação da Lei Seca na cidade, com a intensificação das blitze nas avenidas nos últimos dias. Isso obrigou os motoristas que querem beber à noite a procurar opções de transporte – a principal delas é o táxi. Em períodos de fiscalização ostensiva, o número de corridas noturnas chega a aumentar 30%. Nos fins de semana, os taxistas calculam que a Lei Seca aumentou a demanda em 50%.

 

O Sindicato dos Taxistas (Sincavir) garante que a frota atual é suficiente para atender a toda população. “O que acontece na verdade são demandas localizadas em horários de pico, especialmente nas zonas central e sul. Quando ocorre demora no atendimento é por conta dos congestionamentos no trânsito”, afirma Dirceu Efigênio, diretor-presidente do sindicato.

 

Ana Maria Moreno, servidora pública, reclama: “Às vezes não consigo atendimento nem perto de casa”
 

 

O diretor operacional da Ligue Táxi BH, Robson Pereira, pondera que mesmo com a demanda maior, não há razão para aumentar a frota. “O trânsito realmente é o principal vilão, além do alto número de obras na cidade. Ambos provocam o retardamento da corrida”, afirma. Já o presidente da empresa, Ataul Roberto de Castro, diz que, com a Lei Seca, seriam necessários mais 100 veículos em sua frota para suprir a demanda, que aumentou em média 20%. A frota atual da Ligue Táxi BH é de 310 carros.

 

A aposentada Walkíria Teixeira Campos, 59 anos, tem dificuldades para encontrar carro disponível à noite.

Ela já precisou de táxi no final de semana, entrou em contato com quatro cooperativas e dois pontos em seu bairro, mas em todos enfrentou fila de espera.

 

O advogado e presidente da OAB/MG, Luís Cláudio Chaves, diz que recentemente ficou aproximadamente uma hora tentando falar em cooperativas de táxi, sem êxito. A solução foi pegar carona com um amigo para ir ao evento programado. “Há muito tempo observo a ineficiência em BH, especialmente em relação ao Rio e São Paulo. Com a Lei Seca, a situação ficou ainda pior”, afirma.

 

 

 

De acordo com Léo Quintino, editor do portal BH.táxi, diariamente são recebidas cerca de 100 reclamações. Todas relatando falta ou atrasos. “O curioso é que não é apenas em horários de pico. No sábado à noite e quando acontecem grandes eventos na cidade, a queixa também é constante”. As queixas não são sobre os taxistas, que em geral são bem avaliados pela população. “O problema é a oferta de carros. Alguns afirmam chegar ao extremo de esperar uma hora e meia por um táxi”, diz Quintino.

 

Há 10 anos trabalhando como taxista, Darley Nunes Otoni confessa que nem sempre consegue atender a todos. “No meu caso, que trabalho em uma cooperativa, deixo de atender a muita gente na rua, por causa do atendimento a alguém que nos ligou.”

 

No volante há 19 anos, José Cesário da Silva afirma receber muitas reclamações sobre a falta de táxi. “Mas, como a última licitação foi em 1995, acredito que seria viável realizar um estudo para verificar quantas placas mais seriam necessárias”. Ele dá uma dica aos usuários: “Para não ficar na mão, peça o carro com pelos menos 40 minutos de antecedência”.

 

Trânsito na rua da Bahia em horário de pico, no início da noite: vilão da falta de táxi na cidade
 

 

O projetista de minas, Luiz Cláudio Leite dos Santos, 50 anos, optou pela fidelização para ser bem atendido. Encontrou um ponto de táxi próximo à sua casa e se tornou cliente assíduo. “Como faço pelo menos três viagens de táxi por dia, me tornei parceiro dos taxistas locais”, explica. “Virei cliente preferencial e, sempre que preciso, não fico esperando.”

 

Durante a semana a espera também não é pequena, chegando a 50 minutos em alguns casos. A servidora pública Ana Maria Rocha Moreno, 38 anos, já teve péssimas experiências e quase perdeu um voo. Depois disso, opta por pontos de táxi em seu bairro. “Às vezes não conseguimos nem completar a chamada nas cooperativas. Quando nos atendem, o táxi demora a chegar, quando chega...”

 

Por conta da violência, boa parte dos taxistas opta por trabalhar em cooperativas, atendendo apenas a chamadas vindas do rádio e dando preferência a clientes cadastrados. Com isso, quem não tem o hábito de ligar para as empresas enfrenta um problema adicional. “Já fui assaltado, e vários dos meus colegas também. A média é de dois a três por dia na cidade”, afirma Jean Soares de Andrade, 29 anos e taxista há seis.

 

José Cesário, que há 19 anos é taxista em BH, dá a receita para o momento: “O ideal é pedir o carro com pelo menos 40 minutos de antecedência”
 

 

Apesar das controvérsias, o serviço de táxi de BH ainda é tido como um dos melhores do Brasil. Os candidatos são obrigados a fazer curso inicial obrigatório, curso de reciclagem e participar de fóruns mensais. Periodicamente, também são submetidos a recadastramento.

 

Osias Batista Neto, ex-diretor da BHTrans, vê o serviço com bom olhos. “Em termos de organização, acredito ser o melhor do país.” Ele aprova a nova Lei 12.468, que regulamenta a profissão dos taxistas e proíbe que as placas sejam transferidas para herdeiros. “Assim, a licença retorna ao município, o que deveria ser geral para evitar o comércio ilegal”, diz Osias Neto.

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