Precisamos falar sobre Tilda
Um longa-metragem que ambicione participar de festivais e, consequentemente, ser competitivo na atual “temporada do ouro” deve prezar e perseguir qualidades básicas.
Ou seja, ser escancaradamente subversivo. Não no sentido de se opor ou negar tudo aquilo que os grandes mestres fizeram, mas, sim, primar pela inovação, por novas soluções e caminhos. No cinema subversivo, sempre achamos alto risco nos enquadramentos, na montagem, na direção como um todo. São os novos jeitos e as saborosas ousadias que ditam o que passará a ser respeitado e aplicado no universo da sétima arte.
O eletrizante Precisamos Falar Sobre o Kevin (We Need to Talk About Kevin) atinge a subversão do início ao fim. Vale a pena apontar, desde a apresentação muitíssimo original de seu título.
Na pele da mãe do adolescente, a atriz britânica Tilda Swinton demonstra, a cada cena, a razão de ser considerada uma das maiores atrizes do cinema na atualidade. Seu esforço e interpretação fazem jus a todos os fartos e entusiasmados elogios que vêm recebendo, desde a primeira exibição do filme no último Festival de Cannes. Tilda retrata a infinita impotência e, também, fraqueza de uma mãe, que chega a buscar o auxílio do parceiro, interpretado pelo boa-praça John C. Reilly, mas que assume sozinha, em circunstancial momento, todo peso e receio da convivência às claras com seu primogênito.
Em Precisamos Falar Sobre o Kevin, descobrimos também a Tilda engajadíssima nos projetos que seleciona. Sua dedicada participação como produtora do longa-metragem reforça que um grande nome é vital e determinante para que uma obra diferenciada seja, de fato, tirada do papel.
Detalhes importantes marcam o grande talento dessa atriz madura, detentora de uma beleza franca e andrógina. No filme, um corte de cabelo, por exemplo, orienta todo o percurso de uma vida social plena em aparências e intranquila na intimidade. Poucas como Tilda Swinton sabem esgotar este recurso na sua inteireza e torná-lo essencial à composição da personagem.
Ganhadora do Oscar de melhor atriz coadjuvante em Michael Clayton – Conduta de Risco (2007), Tilda é maior prova de que a lenda sobre o fato de um ator ter sua carreira francamente devastada após vencer o prêmio da Academia não passa, na verdade, de uma grande balela. Aliás, trajetórias muito similares de grandes colegas, como Laura Linney e Patricia Clarkson (que não venceram o Oscar), não tiveram, até o momento, a mesma ascensão. Como justificativa para este descompasso, podemos apelar para o “componente-sorte” ou, quem sabe, para os segredos que imperam na indústria de Hollywood.
Para fazer justiça, impossível concluir sem antes destacar o desconhecido ator Ezra Miller, no papel do garoto do título. Seu trabalho chama atenção pela precisão em dispensar com segurança todos os exageros que a grande maioria dos psicopatas do cinema sempre esbanja. Além disso, a parceria com Tilda Swinton é certeira no sentido de tratar e atingir cenas fortíssimas com espantosa e máxima naturalidade.