Revista Encontro

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É preciso investir no entorno

Nayara Menezes
None - Foto: Geraldo Goulart, Cláudio Cunha, Júnia Garrido, Maíra Vieira

Infraestrutura é um daqueles temas que provocam duas percepções nas pessoas – uma corretíssima; e outra, incompleta. A primeira é que se trata de um assunto (além de árido) de absoluta relevância para o desenvolvimento de uma região e de um país. Certo. Independentemente da coloração ideológica, economistas e políticos concordam que a ausência de investimentos nesta área fará com que o Brasil perca sua capacidade de crescer e desenvolver-se. Isso também vale para estados e muncípios.

 

A segunda percepção, também partilhada pela maioria, é o que o tema infraestrutura está muito longe do dia a dia das pessoas, uma discussão, portanto, da alçada governamental e da macroeconomia. Não chega a ser um rotundo equívoco, mas é uma visão parcial da realidade. Investimentos nesta área precisam ser planejados com antecedência, exigem somas altíssimas e o envolvimento direto do governo de um país. O que, convenhamos, torna tudo mais burocrático, lento e, portanto, distante das preocupações cotidianas dos cidadãos.

Mas esta distância é enganosa. Poucas coisas mudam tanto a vida de um brasileiro (pobre ou rico; instruído ou iletrado) quanto uma obra de infraestrutura.

 

Fala-se muito nos programas sociais, de distribuição de renda. Mas os números mostram que determinadas obras são muito mais eficazes nesse sentido do que o mero repasse de dinheiro. Porque são obras que facilitam a vida, barateiam os custos e criam um novo horizonte. Obras como a da Cidade Administrativa e da Linha Verde são dois bons exemplos. Mas, face aos enormes e crescentes problemas de trânsito e de deslocamento nas grandes capitais, como BH, é preciso pensar sempre à frente. É essa a proposta do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana de Belo Horizonte, publicado no ano passado e que começa a dar ares de implantação este ano.

 

Obra na trincheira da avenida José Cândido da Silveira: Linha Verde é uma das soluções propostas para melhorar a vida da população de BH e região
 

 

O PDDI, sigla que batizou o projeto, foi elaborado pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar), da UFMG e encomendado pela Secretaria de Estado Extraordinária de Gestão Metropolitana. O plano, feito para ser implantado até 2050, prevê 28 políticas agrupadas em quatro principais eixos: acessibilidade, sustentabilidade, seguridade e urbanidade. Segundo o secretário de Gestão Metropolitana, Alexandre Silveira, um dos principais conceitos apontados pelo plano foi a necessidade de mudar o modelo de desenvolvimento: “Hoje, temos um modelo em que os 34 municípios da região metropolitana convergem suas necessidades para Belo Horizonte”. Esse modelo, como destaca o secretário, cria uma série de complicadores, como aumento na demanda por saúde, educação, emprego e geração de renda, e, principalmente, “imobiliza a região metropolitana, do ponto de vista da mobilidade urbana”, diz Silveira.

 

O estudo propõe então, um novo modelo para a região, chamado policêntrico. “A ideia é criar outras centralidades, polos de desenvolvimento, que sejam contemplados com emprego e renda, comércios, equipamentos públicos e privados”, explicao secretário. Mas, para que isso aconteça, é necessária uma grande mudança: “Hoje quando se olha a região, podemos dividi-la em Belo Horizonte e o resto. Mesmo lugares mais ricos como Betim, Contagem, Nova Lima e Lagoa Santa são frágeis diante de BH.

Os municípios são extremamente dependentes da capital”, diz Roberto Luís Monte-Mór, professor da UFMG e coordenador geral do PDDI.  Segundo ele, há um excesso de centralização e concentração. “É fundamental investir no entorno. Só assim acontecerá uma desconcentração de bens e serviços”, diz ele.

 

Para desenvolver as novas centralidades propostas pelo plano, a melhoria da acessibilidade é fundamental. “Não adianta implantar um belo hospital ou uma ótima escola em um município se as pessoas não conseguem chegar até lá”, diz o professor Monte-Mór. Por isso, o eixo Mobilidade é um dos primeiros a serem atacados pelo PDDI. “Muitas vezes para ir de um município a outro as pessoas precisam passar por Belo Horizonte. O que queremos é mudar isso; propomos vias regionais, que liguem os municípios sem a necessidade de passar pela capital. O que já desafogaria, e muito, o trânsito da cidade”, diz o coordenador do plano.

 

Alexandre Silveira, secretário de Gestão Metropolitana : “O modelo de desenvolvimento atual
traz complicadores, porque concentra em BH as necessidades dos municípios da região metropolitana"
 

 

A política de mobilidade prevê seis programas principais para melhorar o trânsito de carros, pedestres e ciclistas. Alguns desses programas já estão em fase de estudo para serem transformados em projetos executivos do governo. “Temos uma malha ferroviária que passa por pelo menos 20 municípios da região metropolitana.

Porém, a maior parte dela está abandonada ou subutilizada, ou seja, é usada apenas para transporte de cargas”, informa Leandro Cardoso, professor do Departamento de Engenharia dos Transportes da UFMG. A sugestão do plano é que a malha ferroviária seja adequada para o transporte de passageiros, o que aliviaria o fluxo nas rodovias. A UFMG já está fazendo um estudo de viabilidade, contratado pelo governo do estado, que investiu R$ 1,5 milhão para mapear os locais onde a linha férrea poderia ser aproveitada para o transporte de pessoas.

 

Outro estudo avançado sobre a mobilidade diz respeito à ampliação do metrô no entorno da capital mineira. O projeto é ousado e sugere a implantação de cinco ramais ferroviários que atenderiam a grande parte da região. “O metrô poderia cortar as principais cidades da Grande BH e, ainda, integrar com outros meios de transporte como os ônibus e até as bicicletas”, afirma Leandro. O professor, porém, sabe que este é um projeto de longo prazo, pois exige investimentos volumosos. No último mês, no entanto, a presidente Dilma Rouseff acendeu uma esperança para os usuários do transporte coletivo em Belo Horizonte.

 

Roberto Luís Monte-Mór, professor da UFMG e coordenador geral do PDDI: "Só investindo no entorno acontecerá uma desconcentração de bens e serviços"
 

 

O Ministério das Cidades, por meio do programa PAC da Mobilidade, anunciou uma verba de R$2 bilhões em financiamentos do governo federal para a expansão do metrô em Minas e construção de terminais de ônibus. A primeira fase do projeto do governo do estado prevê a ampliação da linhas 1 (Eldorado-Vilarinho) e criação da Linha 2 (Calafate-Barreiro) e 3 (Lagoinha-Savassi). Com estas primeiras intervenções, o metrô ampliaria sua capacidade atual de 200 mil passageiros/dia para 980 mil.

 

Já em relação à malha rodoviária, o PDDI também estabelece, além da implantação de vias, que fariam a ligação entre municípios, com a criação de um grande anel rodoviário que faria o contorno de toda a RMBH. O Rodoanel faria conexão entre a BR-381, saída Vitória, com a rodovia na saída para São Paulo, cruzando a BR-040, além de outras rodovias estaduais, como a MG-10. Mas o secretário de Gestão Metropolitana, Alexandre Silveira, admite que é um projeto para longo prazo. “A primeira parte deste anel, que será o Anel Viário Norte, que ligará Betim a Ravena, já conta com projeto executivo em andamento, mas ainda demanda tempo e recursos pesados do governo federal”, diz. Segundo o secretário, o que a população mineira pode esperar em curto e médio prazo, em termos de rodovias, é a duplicação da BR-381, promessa de campanha da presidente Dilma, e a revitalização do Anel Rodoviário já existente. “Se a presidente cumprir com essas duas promessas durante o mandato, já está de bom tamanho”, afirma o secretário. De fato, se isso acontecer, a consequência será a melhoria de vida da população de BH, o que ajudaria as pessoas a perceber que um dos objetivos centrais dos investimentos em infraestrutura é justamente esse.

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