Revista Encontro

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Queridinho de fato, não de direito

José João Ribeiro
Nicolas Cage em cena de Motoqueiro Fantasma: Espírito de Vingança - Foto: Divulgação

Há poucas semanas, o jornal Folha de S. Paulo trouxe com destaque em sua primeira página a curiosa chamada “O Queridinho dos Brasileiros”. Na excelente reportagem do crítico Rodrigo Salem, a confirmação protocolar de que o nome com maior apelo nas bilheterias do país é o do ator Nicolas Cage. Ganhador do Oscar no longínquo ano de 1996, o quase cinquentão sobrinho de Francis Ford Coppola perdeu há bastante tempo a enorme influência que exercia perante os estúdios e o respeito da crítica especializada.

 

Nicolas é um claro exemplo de péssimo direcionamento de carreira, vide suas desastradas escolhas. Hoje, parece nem ligar ao emprestar seu nome a produções constrangedoras. Mas, no Brasil, nada disso importa. As distribuidoras locais já mandaram mensagens suficientes para o ator, todas pontuando que este é o melhor mercado para ele, com um público fortemente cativo.

 

O triste e corrosivo Despedida em Las Vegas, em que Nicolas Cage arrebatou a Academia, já completou 17 anos. Após esse merecido triunfo, Cage certamente resolveu que era chegada a hora de fazer dinheiro.

Incorporou um caricato herói de filmes de ação. Pouquíssimas foram as escapadas, centradas no quesito arte, como os complexos trabalhos em Adaptação e em Vício Frenético. Seu último grande sucesso de bilheteria nos Estados Unidos foi há mais de cinco anos, com A Lenda do Tesouro Perdido: Livro dos Segredos. Em 2011, estrelou cinco produções. Todas fracassaram na América.

 

O público brasileiro desconhece essa derrocada. Nicolas Cage reina supremo nas salas de exibição por aqui. A segunda maior bilheteria deste ano até agora (Motoqueiro Fantasma: Espírito de Vingança) é protagonizada por ele. O longa metragem, que já lucrou desde o lançamento em fevereiro impressionantes R$ 28 milhões, “sepulta” de vez um promissor anti-herói do universo HQ. E todo esse fôlego não termina em um só título. O nome Nicolas Cage é capaz de turbinar os rendimentos de filmes considerados muito ruins. Presságio, em 2009, recebeu uma massiva campanha de divulgação e assim, a Paris Filmes, distribuidora nacional responsável, obteve um lucro nove vezes maior do que desembolsou para comprá-lo. Espanto para os pessimistas de plantão.

 

A explicação para o sucesso do ator se manter intacto em território nacional vai ao encontro de suas escolhas. Filmes de ação e de traquejo sobrenatural agradam muito nosso público.

Basta pinçar as “pérolas”: O Vidente; Caça às Bruxas; Fúria sobre Rodas; e por aí, vai. Soma-se a tudo isso que nos países latinos o frequentador de cinema é extremamente conservador. Um astro que projetou sua carreira ao encontro da “preferência nacional” dificilmente rompe no imaginário de seus fãs. Profissionais do naipe de Charles Bronson, Steve Seagal e Chuck Norris dificilmente, em outras bandas, têm a mesma legião de fãs que reúnem por aqui.

 

Em contrapartida, o crescimento econômico do país reflete no aquecimento do número de espectadores, nas salas de exibição. Recordes e mais recordes não param de acontecer. O gosto da plateia, aos poucos, sofrerá sensíveis transformações e o acesso a novas mídias determinará o surgimento oportuno de talentosos nomes. Os que apostarem na acomodação do “pagante médio” serão pegos de surpresa na exigência inevitável e repentina por mais e mais qualidade.

 

Uma parcela do público já sabe reconhecer aquilo que é bom de fato. No momento, os queridinhos por direito são bem outros: Michael Fassbender, ator alemão conhecido pela versão jovem de Magneto em X-Men – Primeira Classe, que vem se destacando em imperdíveis produções (Shame e Um Método Perigoso); e Ryan Gosling, protagonista do mais sofisticado e perfeito filme americano dos últimos anos, Drive. A hegemonia de Cage (tomara!) terá seus dias contados..

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