Revista Encontro

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"Primavera de temporais"

Flávia Ayer
None - Foto: Geraldo Goulart

Quem acha que já “morreu de calor” em setembro, quando os termômetros se mantiveram acima dos 30 graus, é bom se preparar. A previsão para o período chuvoso que tem início neste mês é de recordes de temperatura e precipitações acima da média. O coordenador regional do centro de meteorologia Climatempo, Ruibran dos Reis, 55 anos, mais da metade deles dedicada a antecipar os fenômenos dos céus, alerta também sobre a forte possibilidade de chuva de granizo ainda este mês. Capixaba, 55 anos, Ruibran é graduado em meteorologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFJF), mestre em engenharia sanitária e meio ambiente pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutor em geografia e tratamento da informação espacial pela Pontifícia Universidade Católica (PUC). Ele, que já trabalhou na Força Aérea Brasileira (FAB), no planejamento energético da Cemig, é, desde o ano passado, diretor regional do centro de meteorologia Climatempo em Minas. Desde 1998, é professor da PUC Minas e, atualmente, leciona no curso de pós-graduação em mudanças climáticas.

 

1 | ENCONTRO – Vivemos em setembro um inverno com recordes de temperatura. Por que tanto calor?
RUIBRAN DOS REIS –
No fim do inverno, por causa da posição da Terra em relação ao sol, o hemisfério Sul já começa a receber maior quantidade de radiação. Aliado a isso, tivemos uma sequência de quase 120 dias sem chuva e, consequentemente, baixa umidade relativa do ar, com índices de 13%, característicos de clima desértico.

 

2 | ENCONTRO – Trata-se de algo atípico?
RUIBRAN DOS REIS –
Belo Horizonte tem seguido uma tendência mundial do aumento das temperaturas.

Desde a década de 1980, as máximas aumentaram de forma geral no planeta. Nos anos 1940, em BH, tínhamos máximas em torno dos 33 graus. Em 1987, batemos o recorde de 36,9 graus e temos grande possibilidade de superar essa marca este ano, chegando a 38 graus. Da mesma forma, a menor temperatura registrada na região metropolitana foi de 3,1 graus em 1979 e, nos últimos anos, praticamente não se observa mais mínimas abaixo dos 9 graus.

 

3 | ENCONTRO – O que esperar então da primavera este ano?
RUIBRAN DOS REIS –
Se antes ela era uma estação de transição, atualmente o que a diferencia do verão é o tipo de chuva. Diferentemente das chuvas estacionárias do verão, nossa primavera será de forte calor e temporais no fim de tarde. Há possibilidade de chuva de granizo a partir da segunda quinzena de outubro.

 

4 | ENCONTRO – Qual a razão dessas mudanças nas estações?
RUIBRAN DOS REIS –
São as consequências do aquecimento global, que também se fazem presentes em Minas. Por causa do maior lançamento de gases na atmosfera, a Terra está retendo mais calor. A temperatura média do planeta subiu 0,7 grau no último século e, com a intensificação do efeito estufa, espera-se um aumento de mais 1 grau em 30 anos.

 

5 | ENCONTRO – De que forma a urbanização está relacionada a esse processo?
RUIBRAN DOS REIS –
Diretamente. Estamos acabando com nossas áreas verdes, que absorvem a energia, e substituindo-as por materiais que transformam a radiação em calor. Em BH, o clima, que era úmido e frio, agora é quente e seco. A cada inverno, as temperaturas estão ficando mais elevadas e, no verão, quando há muita disponibilidade de umidade, as chuvas viram temporais.

 

6 | ENCONTRO – Em que medida os recordes de temperatura são influenciados pelo avanço tecnológico e maior precisão dos equipamentos meteorológicos?
RUIBRAN DOS REIS –
Discute-se muito a influência da tecnologia, mas equipamentos meteorológicos já são bastante precisos há algum tempo. Normalmente, eles duram 50 anos e são bastante eficientes. Minas Gerais é referência na área.

Temos registros das temperaturas desde 1912.

 

7 | ENCONTRO – Qual o grau de confiabilidade das previsões meteorológicas?
RUIBRAN DOS REIS –
Nunca teremos um acerto de 100%, porque são muitos os fatores relacionados ao tempo. Nos modelos de previsão de cinco dias, a confiabilidade chega a 93%. No caso das previsões climáticas, com análises para três a seis meses, o acerto cai para 70%, pois já é preciso considerar fenômenos como El Niño e La Niña.

 

8 | ENCONTRO – De que forma El Niño interfere no Brasil e em Minas?
RUIBRAN DOS REIS –
O El Niño é um fenômeno caracterizado pelo aquecimento da temperatura do Oceano Pacífico na costa do Peru e do Equador. Isso geralmente ocorre no Natal, daí o nome “O menino”. Essa bola de umidade que vem do mar sobe e gera umidade e calor em várias partes do mundo. No Sul do Brasil, encontra frentes frias e provoca muita chuva. No Nordeste, intensifica as secas e, em Minas, gera muito calor e chuvas em forma de temporais.

 

9 | ENCONTRO – E o La Niña?
RUIBRAN DOS REIS –
Provoca efeitos contrários ao El Niño, pois há um resfriamento das águas do Pacífico.  No Brasil, em épocas de La Niña, chove bastante no Nordeste. Em Minas, as temperaturas caem. Agora estamos sob a influência do El Niño, que vai provocar o aumento do calor e temporais na primavera. Devido ao aquecimento global, o El Niño está ficando cada vez mais forte.

 

10 | ENCONTRO – Podemos nos preparar para chuvas acima da média histórica?
RUIBRAN DOS REIS –
Em outubro, teremos chuvas abaixo da média histórica e na forma de temporal, mas em janeiro e fevereiro as chuvas vão ficar em torno de 40% acima da média e a possibilidade de enchentes no Sul de Minas é altíssima.

 

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