O tom natural usado pelo advogado, contudo, tem justificativa: assim como ele, dezenas de empresários, executivos e profissionais liberais de Belo Horizonte estão optando por deixar o carro em casa e cumprir compromissos profissionais ou de lazer no próprio avião ou helicóptero – e sentados na cadeira de piloto, ou seja, no comando da aeronave.
No caso de Tostes, o desejo foi motivado pela necessidade de locomoção rápida devido a demandas da profissão. Ele gostou tanto que a aeronave agora é utilizada para lazer e um novo modelo, mais sofisticado, já foi encomendado. “A aeronave é essencial para mim, pois tenho clientes em cidades no interior de Minas Gerais. Além disso, tenho uma fazenda em Itabirito (55 km de Belo Horizonte) e, de carro, gasto em média uma hora e 20 minutos no trajeto. De helicóptero, são apenas 10 minutos”, diz. A nova aeronave, um R66, de cinco lugares, foi considerada ideal pelo advogado. “Nela, cabem minha esposa e meus três filhos.” Para viajar com a família, Tostes pretende entrar agora para o curso de piloto de helicóptero.
O desejo de voar também pode ser motivado pelo fascínio que a atividade desperta.
Hoje, ela é uma das alunas da Net Aviation, uma das 10 escolas de pilotagem instaladas no Aeroporto Carlos Prates, considerado referência na formação de profissionais do setor. “Quando me sentei no banco do piloto pela primeira vez, foi uma sensação muito boa.” O pai, Faissal Emílio Dabien Haddad, é empresário rural, mora em Araxá e, além de dar apoio ao sonho da filha, pretende adquirir um avião Cessna 172 para usarem nos momentos de lazer.
Seja por necessidade, para ficar livre do trânsito pesado, seja por paixão, o fato é que a população de maior poder aquisitivo da capital mineira está realmente partindo para o voo solo. Em 2012, nas 10 escolas de aviação situadas no Carlos Prates, foram formados 800 pilotos. Este ano, apenas até o final de fevereiro, já são 400 alunos inscritos nas aulas teóricas e práticas de avião e helicóptero. O mercado de aeronaves também está aquecido. De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), em 2010 havia 1.308 aeronaves (aviões e helicópteros) registradas em Minas Gerais. Este número subiu para 1.668 no ano passado – um crescimento de mais de 27% na frota. “O belo-horizontino com maior poder econômico está investindo em cursos para obter brevê (habilitação para voar) e na aquisição de aeronaves”, confirma Renato Franco, diretor de operações da Net Aviation. Números da Anac mostram que em 2007 foram emitidas no país 1.034 licenças (brevês) de piloto privado de avião e 170 de helicóptero. No ano passado, os números saltaram para 3.161 e 807, respectivamente.
O médico angiologista Antônio Carlos Moura da Silva, de 46 anos, é outro bom exemplo da nova tendência que movimenta os ares mineiros.
No caso do engenheiro civil Renato Las Casas, de 29 anos, a paixão por voar – e por seu helicóptero – vem da infância. “Diferentemente dos garotos que normalmente gostam mais de comprar e dirigir carros, eu sempre fui interessado em aeronaves”, diz. Ele começou o curso de piloto no início de 2012, quando o pai, que é empresário do ramo de loteamentos, aguardava a chegada da aeronave R66. Las Casas cursou as aulas práticas no Carlos Prates e já usa o helicóptero para levar os amigos e parentes para o balneário Escarpas do Lago: “Em um fim de semana de carro, dependendo do trânsito, chego a gastar de três a cinco horas para chegar lá, além do risco de andar nas estradas, que é infinitamente maior que no helicóptero. Agora, faço esse trajeto em apenas 60 minutos”.
Há, por fim, mais uma razão para pegar o manche: o prazer de estar no comando.
A verdade é que o sonho de voar com asas próprias sempre seduziu a humanidade. A lenda diz que Ícaro, encantado com as asas de cera construídas por seu pai, Dédalo, voou tão alto com elas que o sol derreteu as penas. A história do século XIX é marcada por várias tentativas de voos solo, e várias delas terminaram em verdadeiras tragédias. No início do século XX, o mineiro Santos Dumont assombrou o mundo e sobrevoou Paris, colocando seu nome na história. Agora, no século XXI, os novos Ícaros estão mostrando que estar no comando de uma aeronave pode ser uma boa opção para quem deseja segurança, rapidez e independência.