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Os caras do showbiz

Com a vinda de estrelas internacionais, como Elton John e Paul McCartney, BH entra na rota dos grandes shows musicais. Conheça os produtores que estão trazendo os astros mundiais para a cidade

João Pombo Barile
Viajar o ano todo sem pausa para fim de semana ou feriado.
Reuniões tensas e intermináveis com empresários de estrelas como Paul McCartney, Elton John e Beyoncé. Arriscar milhares de reais num único espetáculo. Ganhar, ou perder, muito dinheiro numa única noite. Esse é o arriscado cotidiano do produtor musical. Tipo de empresário raro em BH até alguns anos atrás, quando a cidade raramente figurava na agenda dos shows internacionais (sempre restritos ao eixo Rio-São Paulo), eles aos poucos começam a se firmar na cidade. Seduzidos pelo universo da música e pelas altas (e sigilosas) cifras de um mercado que só no ano passado movimentou, segundo cálculos de empresas do setor, cerca de R$ 11 bilhões, a figura do produtor mineiro vem mesmo se fortalecendo nos últimos 10 anos.

Mas, afinal, quem são eles? Qual a cara dos profissionais que trabalham para colocar a cidade no roteiro dos principais artistas mundiais? Para início de conversa, não são muitos – ainda. Alguns entraram no mercado recentemente.
Outros já percorreram uma longa estrada. Em comum, acreditam que o mercado de BH é bom, está em transformação e vai ficar melhor, mas ainda tem etapas importantes a vencer. “Quando comecei a produzir shows, o mercado belo-horizontino era muito diferente de hoje. A cidade era menor. E, na boa: nós éramos mesmo bastante amador”, confessa o produtor Lúcio Oliveira. Considerado por todos os outros produtores da cidade o precursor do segmento, o proprietário da Artbhz conta que, no início, tudo era feito mesmo na base do improviso. “Para se ter uma ideia, eu era estudante de engenharia civil e entrei no negócio meio por acaso. Não existia escola para formar ninguém. Fazíamos tudo na raça. Aprendia fazendo”, conta.

Há 30 anos no mercado, Lúcio foi o responsável pela revitalização do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) na década de 1980. Fechado durante anos por causa do regime militar, a reabertura do espaço da rua Gonçalves Dias se transformou num marco na história dos shows na cidade.  “Foi ali que comecei a aprender o meu ofício”, conta, orgulhoso. Ao longo de sua carreira, junto aos irmãos Evando José Lara e Gegê Lara, seus sócios durante uma época, ele foi o responsável pela vinda a Belo Horizonte de nomes como B.B. King, Eric Clapton, Bob Dylan, Sting, Julio Iglesias, Paul Simon e Mercedes Sosa.

- Foto: Cláudio Cunha
O homem que reuniu os Mutantes








Mas será que a baixa profissionalização do setor, tão característica do início dos anos 1980, ainda é um problema para os produtores? Aqui, as opiniões se dividem. “Desde a época que eu trabalhava com rádio já percebia que o profissional de evento era mais um promoter, um festeiro, do que propriamente um profissional de comunicação. O setor era muito pouco profissionalizado e isso me incomodava muito”, conta Márcia Ribeiro, que, junto a Gegê Lara, comanda hoje a Nó de Rosa Produções. A empresária foi a responsável pela vinda de nomes como Paul McCartney, Guns n’ Roses, Iron Maiden e Ozzy Osbourne à capital.
Para ela, ainda hoje o setor enfrenta um baixo índice de profissionalização. “Os meus fornecedores são meus inimigos”, desabafa a produtora, depois de ter tido alguns problemas com a organização do show de Paul no início de maio. “Ninguém pode imaginar a dificuldade que tivemos para realizar o show”, diz.

Responsável pelo maior evento de música baiana fora da Bahia, o Axé Brasil, Leo Dias, da DM Produções, relativiza o problema com os fornecedores. Tendo no currículo a experiência de 15 anos de Axé Brasil e a realização de shows de artistas como David Guetta, Infected Mushroom, Black Eyed Peas, Maroon 5, Cindy Lauper, Offspring, Stanley Jordan e Erik Morillo, para ele o mercado de BH não é menos profissional do que, por exemplo, Curitiba ou Recife. “É claro que existem problemas. Mas não acho que, nem de longe, aqui é o pior lugar do Brasil para se trabalhar. Claro: se você compara com São Paulo, é diferente. Mas se compararmos nossa cidade com as outras cidades brasileiras do mesmo tamanho, estamos longe de ser o lugar mais difícil para se organizar um evento. Além disso, hoje posso trabalhar com fornecedores de todo o país”, explica.

- Foto: Cláudio Cunha
O professor






Outro que não acredita na falta de profissionalismo em BH é o produtor Alessandro Queiroga. Atuando na área desde 1982, primeiro no Rio e depois em Belo Horizonte, e tendo no currículo a realização de shows de nomes como Tom Jobim, Baden Powell, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gal Costa, Maria Bethânia, Dianna Schuur, Charles Aznavour, Madredeus e Madeleine Peiroux, para Queiroga todo segmento tem diversidades na qualidade da prestação do serviço – e no segmento de cultura e entretenimento não poderia ser diferente. “Temos hoje excelentes produtores e promotores. O grau de profissionalismo é um dos melhores do Brasil. São empreendedores persistentes, diante da característica que temos aqui, em que a primeira coisa a se fazer é colocar dificuldade para a realização de grandes ideias e projetos. Mas os produtores são guerreiros. Vão lá e fazem acontecer”, afirma.

Para Leo, o grande problema do setor hoje não é o pouco profissionalismo, mas sim a falta de costume do público e dos produtores para eventos de dimensões maiores. “Este ano, por exemplo, com o novo projeto do Mineirão, é claro que tive alguns problemas na organização do Axé Brasil. Assim como sei que os outros produtores também enfrentaram problemas. Mas acho isso normal. Afinal de contas, foi o primeiro ano de uso da nova Arena Minas. E tudo ainda é novidade, tanto para nós quanto para o público”, diz.

Outro importante produtor mineiro é Aluizer Malab. Empresário da banda Pato Fu há quase 20 anos e responsável pela volta da banda Os Mutantes numa excursão histórica que rodou a Europa e os EUA, ele foi o responsável pela reabertura do Mineirão com o show de sir Elton John. Malab também não acredita que o problema seja a falta de profissionalização. Pelo contrário. Para ele, o mercado já é bastante profissionalizado. E vive um grande momento de transformação. “Antes da minha geração, as coisas eram mais românticas. Tenho uma grande admiração por um cara como o Lúcio, que organizava eventos maravilhosos e se arriscava muito. Mas hoje é diferente. A partir dos anos 1990, sobretudo com as leis de incentivo, muitos escritórios foram abertos e o mercado ficou mais complexo e com uma grande concorrência. Concorrência que, aliás, muitas vezes atrapalha todo mundo”, afirma Malab, tocando num ponto que parece ser mesmo fundamental: a falta de união do setor. “Somos completamente desunidos, desarticulados. E este é, sem dúvida, o grande problema do setor”, afirma Lúcio Oliveira. “Hoje, como vice-presidente da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), constato semanalmente, junto ao Leo Dias, que é o presidente, a dificuldade de conseguirmos nos unir. Cada um só olha para o próprio umbigo”, afirma o empresário.

- Foto: Pedro Nicoli
O axé com cara de Minas











Do alto da sua experiência de três décadas, Lúcio toca no ponto que será crucial para o crescimento – ou estagnação – do setor nos próximos anos, não só em BH, mas em todo o país: o preço dos ingressos. “Agora mesmo estamos discutindo, em Brasília, a lei da meia-entrada. No Brasil existe um subsídio absolutamente sem controle, já que ninguém controla carteirinha de estudante falsa, e nós somos tão desunidos que não conseguimos nos unir nem mesmo para essa questão fundamental”, afirma.

O resultado da falta de controle sobre a meia-entrada é nefasto para o setor e para os consumidores sem carteirinha. Não raro, o preço do ingresso de um show internacional é maior que um salário mínimo. Motivo: sabendo que muita gente compra seu ingresso com carteirinha de estudante falsa (feita facilmente pela internet), o produtor multiplica por dois o preços do ingresso. Quem perde? “O cidadão brasileiro honesto que não topa burlar a lei. Este é o único país do mundo em que o governo estabelece um subsídio e não paga por ele”, afirma Lúcio.


- Foto: Divulgação
Ela fez o Paul falar uai










A solução para resolver o problema crucial do alto preço dos ingressos tem sido contornada pelas quatro mais importantes produtoras brasileiras – Geo Eventos, Time For Fun (T4F), Plan Music e XYZ Live – com a captação de patrocinadores. Numa entrevista recente, o empresário Roberto Medina, criador do Rock in Rio, revelou que nos seus eventos só a metade do preço do ingresso é paga pelo consumidor. A outra parte vem de patrocínio. “O patrocínio é mesmo fundamental. Mas, infelizmente, aqui em BH não tem o peso que deveria ter”, diz Márcia Ribeiro, da Nó de Rosa. “No Brasil, os patrocinadores parecem estar mais interessados no eixo Rio-São Paulo e nas cidades litorâneas”, afirma.

Pode ser – mas, de olho no promissor mercado mineiro, em julho do ano passado, a T4F (maior do ramo de espetáculos no Brasil) fechou contrato de quatro anos para gerenciar o Chevrolet Hall, uma das principais casas de espetáculos de BH. O grupo, que já administra espaços importantes por toda a América Latina – como o Credicard Hall e o Teatro Abril, em São Paulo, o Citibank Hall, no Rio de Janeiro, e o Teatro Ópera Citi, em Buenos Aires –, aposta no potencial da cidade. O contrato, fechado com os Irmãos Maristas (donos do espaço), trouxe a verticalização de todo o processo da casa, ou seja, contratação e produção de shows nacionais e internacionais, comercialização de patrocínios, venda de ingressos, alimentos, bebidas e merchandising, além da realização de eventos privados. A monopolização de um espaço nobre na cidade mais uma vez dividiu a opinião dos produtores.

“Para o mercado regional, a vinda da T4F não foi boa, já que eles verticalizaram o negócio. O poder de barganha deles para fecharem shows é incomensuravelmente maior do que o dos produtores locais. Fiz muitos shows lá e hoje não faço mais nenhum”, conta Lúcio. Já Leo Dias prefere não se queixar. “É tudo uma questão de negócio. Eles conseguiram o contrato e pronto. Estão no direito deles. Se eu pudesse, também gostaria de ter o Chevrolet Hall só para mim”, diz. Recentemente, surgiram rumores de que a T4F estaria negociando a compra da Plan Music – justamente a empresa que trouxe Paul McCartney ao Brasil. Em nota, a T4F diz que “não comenta boatos”.

- Foto: Maurício/dCSETEspecialista em camarotes




Para tentar sanar a falta de espaços, que ainda parece ser um problema na capital, algumas iniciativas começam a serem tomadas. Todos os produtores parecem já ter percebido que, além de profissionalização do setor e busca de patrocínio, a terceira variável para consolidar definitivamente BH na rota dos shows internacionais é a necessidade de a cidade  ter espaços adequados. Se é verdade que a coisa melhorou muito nos últimos anos com a construção de espaços importantes como a Minas Arena, Expominas e Chevrolet Hall, a demanda do mercado, entretanto, parece maior. Nos bastidores, especula-se sobre dois projetos: um na Pampulha e outro no bairro Olhos D’água, em Belo Horizonte, próximo ao BH Shopping.

Na Pampulha, o local seria em um enorme terreno da avenida Clóvis Salgado, ao lado da Toca da Raposa I. Utilizado no ano passado para a montagem do Cirque du Soleil, o espaço poderia se transformar em um ambiente para eventos médios. Alguns empresários e produtores já estão se articulando e pressionando a PBH na tentativa de o local se tornar um espaço definitivo para BH. No Olhos D’Água, o estágio está mais avançado: o espaço deve começar a ser construído até o fim deste ano e início de 2014. Já tem até projeto arquitetônico pronto e deve demorar três anos para ficar pronto. O cenário musical de BH agradece..