Revista Encontro

Especial educação | Intercâmbio

A família vai também

Viagens ao exterior para estudos estão cada vez mais comuns entre os mineiros, que também aderem à onda de intercâmbios em família, unindo o útil ao agradável: além de conhecer lugares novos e aprender ou aprimorar idiomas, os pais ficam mais perto dos filhos

Juliana Cipriani
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Foi-se o tempo em que intercâmbio era coisa de adolescente. Aquela cena no aeroporto dos pais se despedindo do filho com lágrimas nos olhos já não é mais tão comum. A moda agora é viajar em família, não importa a idade. Foi esta a opção da juíza Maura Angélica de Oliveira Ferreira, de 66 anos, e da professora Karina Rodrigues Ferreira, de 37. Em busca de um título de doutorado em ciências jurídicas e sociais, mãe e filha fizeram as malas e partiram para Buenos Aires, Argentina. Durante dois anos, voaram para o país vizinho nos meses de janeiro e julho para um período mínimo de 20 dias em sala de aula. O curso acabou, mas a experiência ainda está viva na memória delas. “Nós nos aproximamos muito.
A rotina era pesada e ficávamos juntas o dia inteiro. Isso intensificou a nossa relação de mãe e filha”, conta Maura. "Lá ficávamos mais juntas que aqui, onde temos, cada uma, uma rotina diferente", completa Karina, que é formada em psicologia e seguiu os passos da mãe, ao se formar também em direito.
 
Assim como Maura e Karina, é cada vez maior o número de familiares mineiros viajando juntos para fora do país – seja para estudar línguas, seja para completar a grade curricular, ou seja para experimentar uma vivência internacional. No Student Travel Bureau (STB), a procura pelo intercâmbio familiar cresceu 60% nos últimos dois anos, especialmente para aqueles pais com filhos entre 8 e 15 anos. "A família mineira é muito tradicional e, quando o filho manifesta o desejo de viajar, os pais têm receio de eles irem sozinhos", explica Fernanda Bicalho, gestora do STB em BH. Segundo ela, o intercâmbio em família é também boa chance para os pais na faixa etária entre 40 e 50 anos, que possivelmente não foram intercambistas na juventude. “Nesse momento eles veem a oportunidade de também viverem essa experiência e melhorarem na fluência da língua estrangeira”, diz Fernanda.
 
Karina e a mãe, Maura Ferreira, viajaram juntas para Buenos Aires e gostaram da experiência: ambas fizeram doutorado em ciências jurídicas e sociais na Argentina - Foto: João Carlos Martins

O estudo do inglês ainda é o mais procurado nas agências de viagens, com destinos principalmente para o Canadá, Estados Unidos e Inglaterra. Há aqueles que preferem alugar um apartamento ou flat, mas as próprias escolas oferecem a opção de hospedagem em casas de família ou residência estudantil. Esta foi a modalidade escolhida pela farmacêutica mineira Nelma Lourenço Matos Cruz, de 49 anos, a filha Mariana Lourenço de Matos Cruz, de 22, e o genro Rafael Krettolys, de 21. Os três passaram o mês de fevereiro em Nova York, nos Estados Unidos, para aprimorar a língua. "Eu faço curso de inglês, mas sempre tive dificuldade de falar, sou bem inibida. Para não ir sozinha, a Mariana, que tem o inglês fluente, foi junto e fez um curso avançado", explica Nelma, que se sentiu mais à vontade tendo a filha ao lado. Em níveis diferentes de aprendizado, cada um dos três ficou em uma turma, o que possibilitou conviver com maior número de pessoas. 
 
O intercâmbio nos EUA foi o terceiro de Mariana.
Ela já havia estudado espanhol no Chile e na Espanha, para onde voltará no ano que vem e terminará o estudo da língua. A experiência familiar foi tão boa que a mãe já pensa em fazer algum curso quando for visitar a filha na Espanha. A estudante de gestão pública também aprovou a viagem com a mãe e o namorado: "Dá um pouco mais de trabalho para conciliar as agendas, mas é muito gostoso, porque sentimos menos saudade de casa. Além disso, nos aproxima, porque passamos pelas experiências juntos", diz.
 
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As viagens de férias também foram influenciadas pelo intercâmbio familiar. Muitos pais têm optado por aproveitar o recesso escolar dos filhos para levá-los para estudar no exterior. "É uma moda que está pegando. Os pais tiram férias junto com os filhos e unem o útil ao agradável", afirma a diretora da Intervip, Paula Starling, onde a procura por esse tipo de viagem também está crescendo. Os programas de intercâmbio mais breves são conhecidos como summer (verão) ou winter (inverno) e o período de duração geralmente é de quatro semanas. Geralmente, envolvem atividades específicas para cada membro da família. 
 
No caso dos que preferem ir sozinhos, tem crescido a procura pelo intercâmbio para melhorar o currículo profissional. É o caso do estudante de economia Rafael Menezes Goulart, de 23 anos, que partiu em julho para Vancouver, no Canadá, e só volta de lá em dezembro.
Inspirado por um amigo que passou pela experiência, Rafael decidiu seguir o mesmo caminho: "O mercado hoje está extremamente exigente e, em alguns processos seletivos para estágios dos quais participei, uma gama representativa de pessoas considerou o intercâmbio uma experiência muito interessante e importante", conta. Apesar do interesse na língua, o choque cultural não deixa de chamar a atenção do futuro economista, que destaca o sistema de transporte coletivo como ponto forte da cidade.
 
Arthur Coelho, de 16 anos, que estuda inglês desde os 9 e vai morar no frio Canadá por um ano, com apoio da mãe, Luciana Coelho: hora de realizar um sonho - Foto: Leo Araújo 
 
Para os mais jovens, continua forte a alternativa do high school (ensino médio), em que eles ficam de seis meses a um ano para completar o ensino médio no exterior, como fará o estudante Arthur Coelho, de 16 anos. Ele estuda inglês desde os 9 anos e vai fazer o 2ª série do ensino médio morando em uma casa de família em Winnipeg, no Canadá. A vontade partiu dele, mas o apoio e incentivo da mãe, Luciana Coelho, de 45 anos, que é educadora, foi total. "Escolhemos o Canadá pela qualidade do ensino, que é um dos melhores do mundo, e por ser um país que respeita e acolhe a diversidade cultural. O objetivo é, em primeiro lugar, a educação. O inglês virá junto por imersão", afirma Luciana, que diz já sentir saudade antecipada do filho. 

Para Arthur, é hora de realizar o sonho de viver uma experiência cultural diferente. “Sempre quis morar fora, conviver com outra cultura. Vai ser uma forma nova de ver o mundo. Quero fazer o que eles fazem, comer o que comem e ver o mundo de outro jeito. Espero que me acolham”, diz o jovem. Além da preparação psicológica e os encontros e dinâmicas com outros intercambistas, Arthur ganhou mais confiança depois que convenceu quatro amigos a irem junto. "É muito importante ter uma amizade, porque acaba que no início a gente se sente sozinho, e é bom dar força um ao outro", diz. Luciana embarcou o filho em 31 de agosto e o espera só em julho do ano que vem. "Já estou sofrendo, mas é um sonho dele", afirma. Resta saber se ele volta, pois Arthur já adianta que seu desejo é fazer faculdade e morar fora. "Pretendo voltar para visitar, mas temos de ver como vai ser", diz. Provavelmente, o filho voltará bem mais amadurecido. 
 
Para o diretor da Greenwich Tour, André Vasconcelos, os estudantes ganham muito com a oportunidade de morar fora do Brasil: mais responsabilidade, maturidade e independência - Foto: Samuel Gê 

Esse é um ganho que, invariavelmente, segundo o diretor da Greenwich Tour, André Vasconcelos, os estudantes obtêm nos intercâmbios culturais. "Há um aumento da maturidade e da independência, porque eles não vivem com os pais e terão mais responsabilidades", avalia. Segundo Vasconcelos, para o intercâmbio cultural, os destinos mais procurados pelos mineiros são os países de língua inglesa, como Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, Austrália, Nova Zelândia e Irlanda. Ultimamente, também a Itália, Alemanha e França têm entrado no circuito.
 
Para a fundadora do Greensystem Intercâmbio e Idiomas, Ana Maria Fulgêncio, que trabalha há 40 anos com o envio de pessoas ao exterior para estudos, está havendo uma revolução no setor. O que antes era experiência possível somente para alunos da faixa dos 15 aos 18 anos agora se estendeu para todas as idades e formas. Para programas de férias, a Greensystem envia cerca de 600 alunos ao ano para países como Espanha, Canadá e Inglaterra. Para o high school, que caiu um pouco pelo aumento do custo, são cerca de 100. Já para os cursos de inglês em qualquer tempo também são cerca de 500 a 600 intercambistas anuais. De acordo com ela, o preço do intercâmbio subiu porque antes os jovens eram recebidos por voluntários. Hoje, há todo um sistema em que as famílias são pagas para hospedar ou a opção é o boarding school, quando os estudantes moram nas escolas.
 
A estudante Mariana Cruz e o namorado, Rafael Krettolys, ladeiam a mãe dela, a farmacêutica Nelma Cruz: os três fizeram intercâmbio nos Estados Unidos para estudar inglês - Foto: Arquivo pessoal 
 
Segundo Ana Maria Fulgêncio, o intercâmbio em família também vem crescendo na Greensystem e é muito indicado, mas é preciso um planejamento, em função dos custos. "As pessoas estão acreditam que quanto mais cedo se começa a aprender melhor, e estão levando as crianças", diz. De acordo com ela, as escolas que antes introduziam o inglês aos 9 anos de idade, agora, colocam a língua na grade curricular aos 3 ou 4 anos. Por isso, a tendência para o intercâmbio familiar é de crescimento. "As famílias percebem essa necessidade, mas é uma experiência ainda não tão divulgada e cara, porque tem de pagar cada curso e ainda a hospedagem. Então é preciso juntar um dinheiro: é um projeto e um investimento mais alto", explica.
 
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