Revista Encontro

Entrevista | Antonio Augusto Anastasia

"Diversificar a economia mineira é obsessão"

Candidato ao Senado pelo PSDB, o governador Anastasia fala dos 11 anos da gestão tucana em Minas, do choque de gestão, dos candidatos ao governo do estado e afirma que é preciso agregar valor ao que se produz aqui

Bertha Maakaroun
- Foto: Cláudio Cunha

Não é de hoje que a diversificação da economia de Minas, para superar a tradicional indústria de commodities baseada no minério de ferro e no agronegócio e agregar valor ao produtos mineiros, preocupa a iniciativa pública e privada. E essa é a grande meta de médio e longo prazos que, na opinião do governador Antonio Anastasia (PSDB), deve ser perseguida com obsessão pelos governantes mineiros. “Atrair para cá empresas de perfil econômico variado e garantir aqui o ciclo completo do minério de ferro – minério, aço, siderurgia e o produto final. Esse é o grande desafio”, diz Anastasia.  Para cumprir essa tarefa, dois elementos são fundamentais. O primeiro é melhorar a infraestrutura e o segundo, apresentar incentivos fiscais que tornem atraente o estado, prejudicado pela ausência de porto marítimo. 
Dentro de um quadro federado, entretanto, são poucos os instrumentos que os estados têm de estímulo às empresas, considera Anastasia. E, no tocante à infraestrutura, há grande dependência do governo federal para investimentos de vulto, uma vez que as rodovias, as ferrovias, os aeroportos de Confins, de Uberlândia e de Montes Claros são todos do governo federal. Pregando uma revisão do pacto federativo, Anastasia considera: "Não podemos ficar à mercê da decisão discricionária do governo federal.
Temos de descentralizar as ações para os governos estaduais". 

- Foto: Cláudio Cunha

Anastasia, que deverá se desincompatibilizar do cargo no início do ano que vem,  é cauteloso e prefere não assumir que é o candidato do PSDB ao Senado – embora já esteja definido pelo partido (leia-se Aécio Neves) que ele será, assim como também já está estabelecida a chapa que concorrerá ao governo: Pimenta da Veiga (PSDB) e Dinis Pinheiro (PP), atual presidente da Assembleia Legislativa de Minas. Publicamente, contudo, Anastasia ainda prega que a vaga ao Senado poderá ser cedida a candidatos da base de apoio. 

Também é sabido que o desejo do governador é o de seguir carreira na iniciativa privada. "Eu não tenho nenhuma ambição do tipo 'quero ser senador'. A minha pretensão sempre foi a de concluir o mandato e voltar à minha atividade de servidor público, de professor, de consultor", afirma. 

ENCONTRO - O sr. está a pouco mais de um ano do fim do mandato, em que pese deva se desincompatibilizar já no início do ano que vem para candidatar-se ao Senado Federal. Qual é o balanço desses 11 anos de governo tucano em Minas? 

ANTONIO ANASTASIA - Este é um governo de continuidade, que se iniciou em 2003 com Aécio Neves. Quando entramos, Minas Gerais tinha uma situação conhecida: baixa autoestima das pessoas, baixo nível de investimento, não tínhamos crédito nacional ou internacional e naquele momento não tínhamos boas condições para a atratividade de empresas. Então, iniciou-se um processo novo, que é conhecido como certa revolução administrativa, com objetivo de trazer para o estado mecanismos inovadores de gestão pública.  Mudamos o estilo de governo. Colocamos à frente da administração pública um conjunto de jovens oriundos da Escola de Governo. Hoje, em relação aos estados brasileiros, temos, de longe, o melhor quadro de pessoal em termos gerenciais. Esse legado se associa ao critério de governo, com base em resultados e em metas que colocou a gestão pública na agenda nacional. O resultado concreto desses novos mecanismos foi a reversão daquele cenário.
O estado cresceu economicamente, recuperou a sua autoestima, tivemos grandes investimentos vindos para Minas Gerais e ao mesmo tempo conseguimos realizar uma grande obra de infraestrutura pelo estado afora, que permitiu maior atratividade de empresas. Conseguimos avanços e reconhecimento expressivo não só do Banco Mundial, como das agências internacionais. Em minha área específica, que é o planejamento, reintroduzimos uma cultura apagada em Minas. Por outro lado, há outro legado que existe aqui e é subjetivo. É de credibilidade do governo. Um governo reconhecido como honesto, sério, que se pauta com rigor e fundamentalmente respeita a segurança jurídica, que respeita os indicadores.

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Em termos de indicadores, que são dados objetivos, quais são as estatísticas de seu governo em áreas como a saúde, a segurança pública e a educação?

Temos o primeiro lugar da educação pública no Brasil, o que é indicado pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Minas é também o primeiro estado nos indicadores de saúde do governo federal da região Sudeste. Temos, em relação à taxa de homicídio entre os estados que tratam esse indicador de forma confiável, a quarta melhor posição no Brasil. O dado é do Ministério da Justiça. A maior longevidade da região Sudeste, a quarta do Brasil, está aqui também.
Conseguimos aumentar o número de estradas pavimentadas em mais de 5 mil quilômetros. Ligamos praticamente quase todos os municípios mineiros por asfalto e levamos telefonia a todos eles. Então, acho que o legado físico é muito robusto e é sentido pelas pessoas. 

Mesmo com esses dados que são expressivos, todas as pesquisas de opinião apontam as áreas da saúde, da segurança pública e, em terceiro lugar, da educação pública como as mais problemáticas na percepção dos eleitores. Se tiver de eleger áreas que não foram bem, que precisariam ser repensadas, quais apontaria?

Todas as áreas têm problemas, até na Suíça. Mas se fizer uma enquete entre as pessoas, a primeira é saúde, pois é uma demanda infinita, sempre vai precisar. E entre os governantes é a segurança pública, pois segurança é algo que está muito fora do controle absoluto, depende de vários fatores exógenos, externos ao governo do estado. Então, temos essas duas políticas como aquelas em que há sempre reclamação maior. Mas temos dois problemas que acho que são maiores no estado. Um é a desigualdade regional, que é um dado importante de Minas que, lamentavelmente, é fruto de nossa realidade. Temos situação de absoluta desigualdade entre o grande Norte e o Centro-Sul do estado. Isso foi diminuído, levamos infraestrutura, fizemos muito, mas ainda os indicadores daquela região são menores do que o resto do estado, e é um processo de longo prazo mudar isso. E outro que é obsessão que tem de ser perseguida, pois vai permitir resolver os outros problemas, é agregar valor ao produto mineiro.

- Foto: Cláudio Cunha

Sempre a diversificação da economia...

É, o perfil da economia. Somos condicionados, tradicionalmente, à indústria de commodities – minério e agronegócio. Excelente. O Chile é rico com os dois. Só que precisamos de mais. Como vamos fazer isso? Primeiro, temos de levar infraestrutura, sem a qual não modifica este cenário. Criar os incentivos fiscais necessários, levando em conta um quadro em que o estado federado tem poucos instrumentos de estímulo às empresas. E, ainda, Minas Gerais é prejudicada pela ausência do porto marítimo. Então, devemos atrair para cá empresas de perfil econômico variado e garantir aqui o ciclo completo do minério de ferro – minério, aço, siderurgia e o produto final. Esse é o grande desafio. Por isso, a vinda para cá da indústria de blindados, a vinda da ciência da saúde com a Biom Technology e a produção da insulina, a Six, de semicondutores... São investimentos que podem modificar o perfil econômico do estado, que é um projeto de médio e longo prazos. A economia do estado cresceu demais, mas, ainda assim, está aquém daquilo que precisamos. Quando agregarmos mais valor aos produtos, arrecadaremos mais tributos e aí conseguiremos melhorar ainda mais a saúde, a segurança e a educação. Veja a diferença de Minas Gerais em relação a São Paulo, que tem o dobro de nossa população e um território menor do que o nosso. O orçamento de São Paulo é o triplo do de Minas. O Rio de Janeiro é pior ainda: tem orçamento maior e uma população e um território menores do que o nosso.

Há uma queixa reiterada em Minas, ao longo das últimas décadas, de que, por termos tido sempre governos de oposição ao governo federal, aqueles investimentos de porte feitos em outros estados não acontecem aqui. Como está a relação com o governo federal nesse sentido?

Em Minas, na década de 1990, tivemos um governo que coincidiu – o governador Eduardo Azeredo (PSDB) e o presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Não há dúvida de que temos necessidade maior de investimentos federais. Por que motivo? Primeiro, porque em matéria de infraestrutura – a mais pesada – é quase toda federal. As rodovias, as ferrovias e o aeroporto de Confins, de Uberlândia e de Montes Claros são do governo federal. De fato, há uma dívida da esfera federal com Minas. O metrô, o Anel Rodoviário e a duplicação da BR-381 são exemplos disso. Enquanto isso, outros estados, como o Rio, receberam nos últimos anos investimentos muito expressivos da esfera federal. Acho que Minas Gerais está a merecer mais do governo federal.

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Qual é a expectativa em relação às obras estruturais necessárias, como a do metrô?

É simples de resolver o problema. Não podemos ficar à mercê da decisão discricionária do governo federal. Temos de descentralizar as ações para os governos estaduais. Isso vale não só para Minas. No momento em que tivermos sob nossa responsabilidade o metrô, o Anel, as estradas federais, o aeroporto e as ferrovias, o problema é nosso. O governo federal tem muita dificuldade de execução das coisas. A 381 é exemplo disso. Tem a vontade de fazer a obra, tem o recurso, mas não consegue. Então, isso acaba penalizando os estados pela falta de descentralização.  Mas, claro, para receber essa massa imensa de infraestrutura, supõe-se que parte dos recursos –  hoje 70% são da União – também sejam distribuídos. Então, a federação brasileira só vai funcionar – e nós só vamos resolver problemas de gargalo e de infraestrutura – quando houver confiança. E faço parêntese, por justiça, isso não é coisa deste governo federal que está aí. Essa concentração dos recursos na esfera federal vem do governo militar. 

O sr. vai se desincompatibilizar do cargo no início do ano que vem?

Eu nunca planejei ser vice-governador nem governador. Como também nunca planejei ser candidato ao Senado. O meu pressuposto, o compromisso número um, é completar o mandato até o fim do ano que vem. Mas há de fato um movimento dos partidos aliados para a candidatura. Essa decisão será tomada no momento oportuno. O fundamental, nesta altura, é a definição da cabeça de chapa: quem é o candidato a governador. Acho que até o fim do ano devemos ter o nome.

- Foto: Cláudio Cunha

Como será essa chapa?

Temos de conversar com os diversos partidos da base aliada.  Eu não tenho nenhuma ambição do tipo ‘quero ser senador’. A minha pretensão sempre foi a de concluir o mandato e voltar à minha atividade de servidor público, de professor, de consultor, que é uma atividade menos cansativa, para usar a palavra elegante. Não sou uma pessoa  rica. Pelo contrário, a minha declaração é pública. Eu empobreci muito no governo. Eu só tenho um apartamento. Tenho de trabalhar dando aulas e advogando. 

As pesquisas de intenção de voto ao Senado colocam-no, neste momento, com uma posição confortável na disputa...

Primeiro, fico lisonjeado e agradecido pelo reconhecimento. Se me perguntarem à queima-roupa: você quer se candidatar? A resposta é não. Não tenho pretensão pessoal de me candidatar. Agora, não vou dizer que não serei candidato, pois isso vai depender das circunstâncias. Eu sou uma pessoa integrada ao grupo. O grupo me elegeu. Por isso mesmo, tenho as vinculações a esse grupo. Acredito que tenhamos muitos nomes e até necessidade de composição partidária para a feitura da chapa. Porque teremos, a meu juízo, um candidato do PSDB ao governo do estado. E eu sou do PSDB também. Então não sei se teremos canditados do PSDB ao governo e ao Senado. Vai depender das conversas com os partidos – que são muitos – que integram a nossa base. 

Quando o sr. fala em seu grupo político e a maior probabilidade de a cabeça de chapa majoritária ser do PSDB, qual é o nome?  Pimenta da Veiga tem sido apontado como o candidato e o deputado Marcus Pestana também se lançou. Para vice, o mais cotado é Dinis Pinheiro, que inclusive se filiou ao PP. Há disputa interna no PSDB?

Na verdade, já se cogitava o Marcus Pestana ser candidato há mais tempo, assim como o próprio Dinis Pinheiro, quando estava no PSDB, e o próprio Alberto Pinto Coelho. Nesse meio-tempo, surgiu o Pimenta, que se mudou para BH. O Pestana, na posição de presidente do partido, tem legitimidade para dizer que também está disponível, que tem interesse, e o nome dele foi lembrado. Isso é próprio da vitalidade interna do partido e é uma questão que não terá desdobramentos mais significativos. Quanto ao  Dinis, é uma liderança jovem, dedicada, tem prestígio imenso com os prefeitos no interior. Tenho viajado pelo estado inteiro, muitas vezes o Dinis está comigo e vejo o carinho que os prefeitos e lideranças locais têm por ele. Numa chapa, o Dinis é nome fortíssimo, porque garante e dá prestígio. O Dinis foi para o PP, então isso é muito importante. Se os nomes serão esses ou não, isso será confirmado no momento oportuno. Já tem um do PSDB e um do PP. O Senado será do PSDB também? Essa ponderaçao será feita no ano que vem. 

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Em sua opinião, qual a chance de um nome do PSB concorrer ao governo de Minas, partido que integra o seu governo, mas que, com a candidatura de Eduardo Campos à Presidência da República, tem pressionado muito os líderes no estado por palanque local próprio?

Primeiro, acho muito natural. Eu acho que essa figura de palanque duplo ou triplo é completamente artificial e de difícil compreensão ao eleitor. Se o PSB tiver um candidato – e tudo indica que terá – à Presidência da República, tudo sinaliza que deverá ter um candidato também ao governo de Minas. O fato de o PSB ter ficado esse tempo conosco no governo não altera em nada. Tenho hoje dois secretários do PSB, o prefeito de BH é do PSB, nosso aliado político, trabalhamos muito por sua eleição. 

Esse candidato do PSB poderá ser o prefeito Marcio Lacerda?

Em tese, sim. Ele é filiado ao PSB, tem as condições, uma performance nas pesquisas muito positiva. É um nome muito considerado. Mas ele tem declarado que não é candidato em nenhuma hipótese. Então, dependerá da sua vontade de deixar a prefeitura ainda faltando dois anos e meio para o final de seu segundo mandato. Agora, no caso dele em especial, pelo relacionamento que tem com o nosso grupo e pelo relacionamento até pessoal que tem com o virtual candidato da oposição, que é o Fernando Pimentel, poderá ficar numa situação de dúvida.

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Pensando na candidatura do senador Aécio Neves (PSDB) à Presidência da República, para além do DEM, tradicional aliado, quais são as alianças possíveis a serem trabalhadas?

A candidatura do Aécio ainda não foi proclamada, mas no PSDB ela será afirmada como a da oposição do Brasil à Presidência da República. Claro que o PSDB vai agregar outros partidos. As conversas existem não só com o DEM, mas com o PPS, o PV, o PTB, o PDT, o PP. Alguns partidos, integram hoje o governo federal, outros não, mas estão todos disponíveis para conversar, até porque não sabemos as condições exatas, o que vai acontecer no ano que vem e como o governo federal chegará lá com as dificuldades econômicas que estamos tendo e com a situação política como um todo no Brasil. O senador Aécio tem uma grande capacidade de diálogo, ele tem a capacidade de articular, de ouvir, tem grande respeitabilidade das lideranças do Congresso Nacional. Então, tenho muita convicção de que teremos base política sólida e também dissidências de partidos que hoje integram a base do governo federal, que podem até ficar lá, mas haverá lideranças representativas conosco. Esse quadro só vai se clarear lá para maio, junho do ano que vem. O senador está entusiasmado, está recebendo apoios. E o mais importante é que a candidatura do Eduardo Campos, que também se firma, é de oposição. Estamos tendo polos de oposição que vão para o segundo turno e, no segundo turno, é natural que haja uma convergência dos discursos de oposição. Acredito que teremos no PSDB uma candidatura muito competitiva, que irá ao segundo turno e que agregará o discurso da oposição. E claro que vemos que o próprio governo federal, com toda a estrutura que possui, não tem mais de 40% dos votos. Então, há 60% de eleitores que não estão definidos com o governo.

Aécio e  Eduardo Campos, pelas pesquisas, hoje, teriam de disputar uma vaga no segundo turno. Isso poderá afastá-los politicamente de uma eventual convergência no segundo turno?

O adversário do PSDB  é o PT, que está no governo federal. E nós apontamos as suas deficiências e eventuais falhas e queremos conquistar esse voto. Agora, o Eduardo Campos tem também o seu campo e disputa esse mesmo voto, mas não há conflito entre as candidaturas de oposição. Ao contrário, elas dialogam, porque sabemos que lá na frente haverá uma convergência.
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