E se engana quem pensa que as crianças ainda engatinham nesse meio. Segundo levantamento divulgado no ano passado pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), a faixa etária de brasileiros entre 10 e 15 anos é a segunda que mais navega na web pelo smartphone, atrás apenas dos jovens entre 16 e 24. Isso porque não temos a comparação com o público de 5 a 9 anos, pois, até o último estudo, essa faixa não era incluída no escopo (para o próximo levantamento, já será).
Esse cenário de "precocidade digital" exige que pais reflitam, cada vez mais cedo, sobre como agir quando os filhos começarem com o temido pedido: "me dá um celular?". E, verdade seja dita: casos recentes, especialmente relativos ao WhatsApp, não deixam de assustar quem está passando por esse momento de decisão. Mostram, também, como os responsáveis ainda não têm a resposta certa sobre o que fazer - o que pode gerar reações extremas. Um exemplo é o episódio do adolescente mineiro de 15 anos que divulgou no aplicativo, sem consentimento da namorada, um vídeo dos dois em momento de intimidade - e, em seguida, a mãe do garoto se filmou batendo no filho para mostrar à namorada que ele tinha sido punido pelo que fez. Esse vídeo também vazou e gerou polêmica na internet neste mês.
O fato é que não existe resposta certa sobre quando é a época ideal para as crianças começarem a ter acesso ao smartphone e, mais especificamente, ao WhatsApp. No entanto, é consenso entre especialistas a importância da orientação e da proximidade dos pais quando decidirem permitir esse uso. Aliás, segundo a psicóloga e psicanalista Túlcia Poggiali, pais devem preparar seus filhos para essa situação antes mesmo de autorizá-los. "A formação que a criança vem recebendo, desde pequena, será a base para que os equívocos do uso do WhatsApp, por exemplo, sejam evitados", diz. Afinal, a educação em termos dos comportamentos moral e ético adequados deve acontecer desde os primeiros anos de vida. Não estabelecer limites previamente e tentar mudar as regras de forma abrupta, diz Poggiali, pode trazer reação de difícil controle.
Segundo a especialista, o diálogo aberto e franco é o caminho, e é preciso conscientizar os pequenos dos riscos e do uso inadequado do aplicativo, como a exposição pessoal e familiar, o contato com estranhos, o risco de isolamento social e o comprometimento do rendimento escolar.
É na filosofia de diálogo transparente que apostam Rodrigo Neves, diretor comercial da TIM Minas Gerais, e sua mulher, Luciana Bellato. Os três filhos do casal, Arthur, Giulia e Sofia Bellato, de 11, 10 e 5 anos, respectivamente, já têm smartphones e são autorizados a usar o WhatsApp. Os dois mais velhos já têm grupos de amigos no aplicativo e aproveitam o recurso para conversar com os coleguinhas com quem conviviam em São Paulo e Recife, onde já moraram. Já a caçula, que ainda está em processo de alfabetização, consegue apenas marcar emoticons e gravar áudios, que manda para pais, avós e madrinha.
Para Rodrigo, o contato com a tecnologia é inevitável e, portanto, a opção da família é por construir uma relação de confiança e de diálogo com os filhos, no intuito de orientá-los bem quanto ao uso das ferramentas, seus possíveis problemas e riscos.
Pais que decidem autorizar o acesso dos pequenos ao WhatsApp devem estar sempre atentos aos filhos, segundo Poggiali, acompanhando de perto as atividades, o comportamento e as relações pessoais dos pequenos. Mas a psicóloga lembra que é sempre função e dever dos pais estabelecer limites. Então, cabe a eles avaliar se os filhos têm maturidade suficiente para compreender vantagens e desvantagens da ferramenta, além de ter condições de aceitar os limites do uso. A partir daí, decidem autorizar ou não. Para ela, o uso antes dos 9 anos pode ser inadequado. "A proibição, quando escolhida pelos pais, é no intuito de evitar que os filhos fiquem expostos a situações que estão fora do seu entendimento e para as quais não estão preparados emocionalmente", diz.
Essa é a opção atual do advogado José Otto Segui Temporão e sua mulher, a engenheira Cristiane Pinheiro Lima Temporão. O filho caçula, Bernardo, de 8 anos, ainda não tem celular. O mais velho, Caetano, de 10 anos, tem smartphone, mas não pode usar o WhatsApp ou outras redes sociais. As ressalvas, segundo o advogado, são várias.
Apesar de restringir as redes sociais, o advogado permite o uso de outros recursos, como mensagens SMS, pois, de acordo com ele, essa comunicação é mais restrita "pessoa a pessoa", mais direcionada. "A questão é a interação social, os grupos de conversa. Crianças são distraídas, podem escrever o que não devem, o coleguinha pode entender errado. Elas não enxergam a consequência da má interpretação", diz. Contudo, José Otto sabe que é uma questão de tempo e tem tranquilidade ao responder aos filhos, quando eles questionam por que os coleguinhas usam o aplicativo e eles não. "Digo que eles também poderão usar. É só questão de respeitar o tempo", explica José Otto.