Na área social, o mármore português no piso divide os ambientes com o taco. As paredes são de seda em mantas de espuma, que harmonizam com as cortinas de seda italiana. No teto de uma das salas, painel com anjos da artista plástica Yara Tupynambá. Chamam a atenção dos visitantes também os lustres clássicos em bronze e cristal, as diversas antiguidades e as porcelanas portuguesas pintadas à mão.
O Cidade Jardim é um antigo bairro residencial, onde moram algumas das mais tradicionais famílias mineiras. Foi planejado segundo o conceito inglês garden city (bairro-jardim), geralmente bairros nobres, destinados às classes sociais mais altas da sociedade. Abriga praticamente só casas, sendo que 80 das 250 foram indicadas para tombamento pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Belo Horizonte (CDPCM-BH), que reconheceu o bairro como patrimônio da capital.
O oftalmologista Luiz Alberto Laborne Tavares mora hoje na casa que foi dos avós, Cazimiro Laborne Tavares e Mercedes Furtado Tavares, construída em 1950 pelo arquiteto Raul Cirne. A residência foi comprada pela família em 1972, das mãos do cônsul francês da época.
A história de Luiz com a região é antiga. Ele nasceu em uma casa a um quarteirão da que mora hoje e estudou no Colégio Loyola. A filha Isabel também estuda lá e faz atividades, como inglês, na vizinhança. "A localização aqui é muito boa, com acesso por várias vias", diz o oftalmologista. Ele vai com frequência à praça Godoy Bethônico, em frente a sua casa, com a cachorrinha Lili, da raça shih-tzu. Sua namorada, Marinez Las Casas, mora em um apartamento em Lourdes e conta que encontra no Cidade Jardim aconchego.
É difícil imaginar também a possibilidade de um sítio na região central de Belo Horizonte com pés de laranja, limão, abacate e jabuticaba, 20 cachorros, galinhas, bem-te-vis e sabiás cantando pela manhã. Pois ele existe e está no Cidade Jardim. É lá que vive o compositor Pacífico Mascarenhas e sua mulher, Emília Margarida Mascarenhas. A casa em estilo rústico foi construída com material de demolição há 40 anos e projetada pelo próprio Pacífico. Abriga peculiaridades inusitadas em terreno de 2 mil m2. O destaque fica para o museu de antiguidades mecânicas, o hobby do colecionador. São mais de 20 carros antigos e mil calotas, além de maçanetas e pneus raros. A coleção é apenas um pedacinho do que ele juntou nos últimos anos. "Já tive 118 carros, mas vendi", afirma. Raridades estão por lá, como o Packard Super Eight Convertible Sedan de sete lugares de 1937 usado por Juscelino Kubitschek, o Cadillac Limousine de 1926 que pertenceu ao cantor argentino Carlos Gardel e o Lincoln Custom Limousine de 1941 usado pelo Ministério da Marinha, modelo idêntico ao do filme O Poderoso Chefão. "Não vendo nada mais", afirma Pacífico. E já que não vende, não pode nem pensar em sair do bairro. "As coisas que tenho aqui não caberiam em nenhum outro lugar", diz.
O advogado Abílio Machado Neto mora com a mãe, Maria Aparecida de Oliveira, em uma casa modernista construída no bairro em 1960 pelo arquiteto Sylvio de Vasconcellos. Como a maior parte das residências da região, espaço ao ar livre não falta ali. Os cinco filhos, 11 netos e cinco bisnetos almoçam todos os sábados com Maria Aparecida, de 96 anos. Abílio tem familiaridade com a região, já que está lá desde os 5 anos de idade. O trânsito, segundo ele, ficou muito complicado ao longo dos anos, principalmente nos horários de pico. A sua casa é uma das indicadas para tombamento. Abílio faz ressalvas em relação à legislação. "Vai limitar a venda, reforma e chance de negócios. Aqui pode se transformar em bairro fantasma." Ele afirma ser a favor de preservar o patrimônio, mas com critérios e contrapartidas. A vantagem do tombamento, segundo muitos moradores, por enquanto fica restrita basicamente à possível isenção do pagamento do IPTU, que é bem elevado na região. "As casas são grandes e antigas, quase todas precisam de reformas. Elas estão se deteriorando e perdendo o valor", diz Abílio..