Cobertura vacinal: segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria, atualmente a taxa de imunização está abaixo da meta para vacinas de rotina - Foto: Pixabay
Não é mais coisa do passado.
Doenças que já não circulavam no país ou que tinham número de
casos pouco significativo voltaram a causar preocupação. O
sarampo é o exemplo mais recente. Quase três anos depois de receber da Organização Pan-Americana de Saúde o certificado de eliminação da circulação do vírus, neste ano o Brasil voltou a registrar números expressivos de ocorrência da
doença.
Especialistas são unânimes em apontar que a
cobertura vacinal alta é a principal forma de evitar esse tipo de quadro. Os motivos por trás da perda de fôlego na cobertura são diversos e complexos, envolvendo o governo, que deve informar amplamente a população e garantir o fornecimento de
vacinas; os profissionais de saúde, que precisam orientar os pacientes quanto à questão; e as famílias, que devem se engajar nessa batalha e estar atualizadas quanto às
vacinas dos
filhos.
Segundo o pediatra e epidemiologista José Geraldo Leite Ribeiro, secretário do departamento de vacinas da Sociedade Brasileira de Pediatria, é difícil a manutenção da porcentagem de cobertura, sendo raros os países que conseguem sustentá-la.
Na última quarta-feira (21 de agosto de 2019), o Ministério da Saúde anunciou uma dose extra da vacina contra o sarampo, que deve ser tomada por crianças que tenham mais que seis meses e menos que um ano de idade. Isso porque quase 1.700 casos da doença foram registrados entre 19 de maio e 10 de agosto somente em São Paulo.
José Geraldo Leite Ribeiro, secretário do departamento de vacinas da Sociedade Brasileira de Pediatria: "Só temos uma doença erradicada no mundo, que é a varíola. Das outras, se não estamos vendo casos, é porque estamos vacinados contra elas" - Foto: Clóvis Campos/AMMG/DivulgaçãoVale lembrar que essa dose extra não substitui a chamada tríplice viral, que deve ser aplicada quando os bebês completam um ano e protege contra o sarampo, a caxumba e a rubéola. A nova vacina também não anula a necessidade da tetraviral (sarampo, caxumba, rubéola e varicela), aplicada nos bebês ao quando chegam aos 15 meses de idade.
Da parte das famílias, um dos comportamentos percebidos é que, ao não verem mais a ocorrência de algumas doenças, preocupam-se menos em se proteger contra elas. Contudo, segundo José Geraldo Leite Ribeiro, a proteção vacinal é justamente o motivo pelo qual esses patógenos não mais circulam.
"Só temos uma
doença erradicada no mundo, que é a varíola. Das outras, se não estamos vendo casos, é porque estamos vacinados contra elas", afirma.
Assim, é papel dos
pais estar constantemente atentos ao
calendário vacinal: tanto as
crianças precisam ser imunizadas contra toda a gama de
doenças para as quais a rede pública fornece
vacinas quanto essa imunização deve ser feita no momento correto. Não é indicado que doses sejam dadas atrasadas, por desatenção dos responsáveis ou deliberadamente (por medo de reações em bebês muito pequenos, por exemplo). "É preciso conversar com o pediatra ou médico de família, que deve orientar os
pais quanto ao momento da imunização", afirma José Geraldo. "As
vacinas precisam ser dadas o mais cedo possível, dentro do recomendado, para que venham antes das
doenças. Se o momento da
vacinação é adiado, o risco de contato com o patógeno é maior. E em uma criança muito pequena, a infecção pode ser muito mais grave."
Estevão Urbano, presidente da Sociedade Mineira de Infectologia: "A vacina é um direito e um dever. Mas acho que deveríamos focar, neste momento, na questão do dever, uma questão de cidadania" - Foto: Cláudio Cunha/EncontroOutra prática condenada pelos especialistas é a seleção pessoal, por parte dos
pais, de quais
vacinas tomar ou dar aos
filhos, sem recomendação médica, entre as indicadas no calendário nacional. "A indicação das
vacinas envolve muitos fatores, que às vezes as pessoas não consideram", afirma o presidente da Sociedade Mineira de Infectologia, Estevão Urbano. "O potencial baixo de letalidade de uma
doença não pode ser considerado um motivo para não se
vacinar contra ela. No caso da hepatite B, por exemplo, as pessoas sabem que, apesar do índice baixo de letalidade, ela pode evoluir para cirrose em 15% das vezes?", diz ele, lembrando que é preciso haver, ainda, uma consciência coletiva por parte da população. "Há grupos de risco que em alguns casos não podem se
vacinar, como
crianças muito pequenas, idosos ou pessoas com condições específicas. Elas se protegem à medida que a população indicada se imuniza e impede o patógeno de circular", afirma.
Quanto às
vacinas disponíveis na rede privada e que não estão presentes no calendário nacional, Urbano orienta que as famílias conversem com seus pediatras para avaliarem a necessidade e, caso afirmativo, prescreverem. Nos postos de saúde, as
vacinas do calendário são fornecidas o ano todo, independentemente de haver campanhas focadas em determinadas
doenças.
"A
vacina é um direito e um dever. Mas acho que deveríamos focar, neste momento, na questão do dever, uma questão de cidadania", diz Urbano.
*Publicado originalmente em 23/10/2018.