Revista Encontro

ENTREVISTA

Headhunter dá dicas de gerenciamento de carreira e fala sobre mercado de trabalho

David Braga, presidente da Prime Talents, já avaliou mais de 6 mil executivos de alta gestão

Geórgea Choucair
O headhunter e presidente da Prime Talents, David Braga - Foto: Violeta Andrada/Encontro
Presidente da Prime Talent, empresa de busca e seleção de executivos de média e alta gestão, David Braga chegou para a entrevista na redação da Encontro vestido de maneira impecável, da cabeça aos pés. "Você tem de se vestir para o que quer, não para onde você está", afirma. A imagem, diz, fala muito do profissional, gera credibilidade. Com a atuação no Brasil e América Latina, a Prime atende empresas de portes e perfis diversos, como empresas familiares e multinacionais gigantes. Ao longo de sua carreira, David já avaliou mais de 6 mil executivos de alta gestão. Nesta entrevista, ele fala do momento de buscar novas oportunidades, os benefícios mais requisitados pelos profissionais, a importância de mesclar geração Y e pessoas mais maduras, fluência em outro idioma, produtividade, cuidados com a imagem e a valorização da atuação multitarefa. "A chamada gestão por helicóptero funcionou, mas não funciona mais", afirma. "Hoje, a atuação de um presidente de uma empresa precisa ir do terno à botina em dois segundos."

  • Quem é: David Braga, 40 anos

  • Origem: Belo Horizonte (MG)

  • Formação: Graduado em Relações Públicas na Uni-BH, pós- graduado em marketing estratégico pela Fundação Getulio Vargas (FGV) em São Paulo e formação em Conselheiro de Administração pela Fundação Dom Cabral  (FDC)

  • Carreira: presidente e headhunter da Prime Talent (empresa de busca e seleção de executivos de média e alta gestão, com escritórios em São Paulo e Belo Horizonte)

ENCONTRO - Quais são os sinais de que o profissional precisa buscar novas oportunidades?

DAVID BRAGA - Ele precisa planejar e ser o gestor da sua carreira.
Se o profissional não gerenciar sua própria carreira, a empresa vai gerenciar por ele. E às vezes não vai ser de seu agrado. Eu já conheci executivos que ficaram 15 anos na mesma empresa e conseguiram transitar em áreas distintas. Você precisa saber o que quer e ter resiliência. A solução não é só sair do trabalho. De repente, vale a pena criar uma nova oportunidade onde já se está, onde conhece as  pessoas. Às vezes, o problema está no profissional  e ele vai levá-lo para outra empresa. A autonomia se conquista e vem recheada de responsabilidade. Algumas gerações querem acelerar o processo. Querem o mel, mas esquecem das abelhas. Quanto mais o profissional sobe na hierarquia, mais preços tem a pagar.

Quais benefícios o profissional procura ao buscar nova oportunidade, além da remuneração?

Autonomia, visibilidade de crescimento, chance de expatriação, flexibilidade de horários e clima da organização têm tido cada vez mais importância. O nosso papel é encontrar a pessoa certa para o lugar certo. Fazer o link entre o que a empresa e o profissional querem.

O que faz uma empresa ser ou não atrativa aos olhos dos profissionais?

Uma empresa que investe em pessoas, tecnologia e está sempre remodelando, mesclando os profissionais, os setores, envolvida com causas, questões sócio-ambientais e terceiro setor costuma despertar mais o interesse.
Os primeiros embaixadores da marca são os funcionários e eles precisam ser cuidados. O funcionário insatisfeito na organização é uma pólvora.

Hoje, a atuação de um presidente de uma empresa precisa ir do terno à botina em dois segundos" - Foto: Violeta Andrada/EncontroComo administrar a geração Y (nascidos entre meados dos anos 1980 e 1990) e os profissionais mais maduros no mesmo ambiente?

É preciso mesclar as gerações e entender cada uma dessas estruturas. As empresas precisam ter RHs mais potencializados. As empresas mais estratégicas conseguem fazer isso. No passado houve o boom da geração Y e muitos profissionais foram colocados em cargos de diretoria. Nos últimos quatro anos, no entanto, todas as grandes trocas que fizemos foi por falta de maturidade do profissional. Hoje, a atuação de um presidente de uma empresa precisa ir do terno à botina em dois segundos. A chamada gestão por helicóptero funcionou, mas não funciona mais. Os profissionais precisam ser multitarefas. Estratégicos, táticos e entender do operacional, para identificar os erros.
Diretores e presidentes, por exemplo, precisam transitar mais na fábrica.

O profissional multitarefas costuma ser mais requisitado nas empresas?

O profissional que é mais versátil, sem sombra de dúvidas, tende a se destacar mais. Mesmo o especialista precisa ser versátil, tecnológico, ter muitas competências.

A nova geração está menos preparada emocionalmente?

Sim, sem sombra de dúvidas. Maturidade emocional você traz da vida, da experiência. É natural que seja mais difícil a pessoa mais nova ter maturidade emocional e resiliência. A geração mais vivida costuma ter mais resiliência, já passou por outras crises. O grande ponto hoje que a gente observa é o profissional não ter o autoconhecimento. Quando a pessoa não se conhece, não sabe quais competências precisa trabalhar para galgar outras posições ou entregar novos resultados. Com isso, começa a terceirizar o problema, reclamar que não é promovido, que a empresa não investe nele... As pessoas muitas vezes não se conhecem. Isso ela pode buscar com a ajuda de terapia, de um coaching.

Até que ponto o coaching é modismo da vez ou de fato uma necessidade dos novos tempos?

Hoje esse é um aspecto complexo. Há diversos processos de coaching. Mas a base é você alcançar seus objetivos e metas. Eu não sou coach, mas busquei essa formação. O coaching pode virar um processo de bate-papo. Se alguém te perguntar se o seu processo de coaching está legal e você responder que sim, no mínimo não está. No processo você precisa mudar, e mudar incomoda. É importante buscar referências para cobrar do profissional.

A geração Y tem a tendência de mudar mais de emprego. Muito se fala que as empresas têm dificuldades de retenção desses profissionais, que mudam de emprego com muita frequência. Ao mesmo tempo, a geração anterior era conhecida por ficar décadas nas empresas. O que é melhor?

É bom ter várias experiências, mas com bom senso. Você pode ter muitas experiências na mesma empresa migrando de áreas. É preciso entender essas características da nova geração e das anteriores.  É necessário um ciclo de no mínimo dois anos e meio a três anos numa posição.

A comunicação é mais fragilizada na nova geração?

A comunicação é sempre um ponto em discussão, pois depende de como eu falo e de como o outro interpreta. No caso de empresas que foram compradas ou estão em processo de fusão, por exemplo, quase todas cometem o mesmo erro. Elas costumam não comunicar para as pessoas as estratégias. Os talentos não são informados do processo. E quem serão os primeiros a sair? Os talentos, pois eles sabem das competências que têm, e os concorrentes também. A comunicação sempre foi e sempre será um ponto de discussão, pois precisa ser assertiva.

Como desenvolver um plano de carreira para várias gerações nas empresas?

A questão da sucessão é um tabu e um dos gargalos nas empresas. O ideal é que a empresa preocupe mais com a sucessão e busque no mercado novos profissionais de tempos em tempos para oxigenar.

Muitas vezes não é mais fácil buscar o profissional dentro de casa do que fora?

Os dois caminhos precisam ser feitos. Você precisa ter um plano estruturado de carreira, programa de sucessão, métricas, prazos.  Mas trazer o profissional de mercado, tem o ganho de agregar novos conhecimentos. É importante caminhar dos dois lados. De tempos em tempos é importante trazer profissional de mercado, porque acelera o aprendizado. E valorizar também os internos. É importante buscar um equilíbrio.

Os primeiros embaixadores da marca são os funcionários e eles precisam ser cuidados. O funcionário insatisfeito na organização é uma pólvora" - Foto: Violeta Andrada/EncontroComo ser mais produtivo?

A primeira coisa é saber o que você precisa entregar. Se sabe o que  precisa entregar, começa a se organizar e planejar. O Brasil é um país de muita iniciativa e pouca "acabativa", diferentemente da cultura oriental. Os orientais gastam 80% do tempo planejando e 20% executando. Nem sempre isso é possível, às vezes você precisa fazer uma coisa no paralelo. Mas o mínimo de planejamento é necessário ter. Se não você não sabe o que precisa entregar, em que prazo e com que recursos, aí tudo fica mais difícil.

Qual é a importância do segundo idioma nos processos seletivos?

Esse é o principal caos dos processos seletivos. Pesquisa do British Council (instituto cultural do Reino Unido cuja missão é difundir o conhecimento da língua inglesa) aponta que apenas 5% dos brasileiros falam inglês e 3% com fluência. Idioma, ou você fala, ou não fala. Não existe eu me viro. O idioma global é o inglês e isso é o principal ponto de exclusão nos processos seletivos.

Há diferenças de demandas dos profissionais de Minas do restante do país?

Eu não diria da região, mas da cultura da empresa. Ainda há um tabu de que Minas é pouco competitiva diante dos outros mercados. Mas não é. Muitos profissionais são atraídos para Belo Horizonte por qualidade de vida, segurança, trânsito. O fato de poder fazer atividade física ao ar livre, buscar o filho no colégio, não tem preço...

Recrutar um profissional para a área pública exige as mesmas habilidades que recrutar para o setor privado?

Acredito que não. São modelos de gestão distintos. Mas é muito válido trazer boas práticas de um setor para o outro. O terceiro setor tem feito muito isso. Mas é preciso unificar as duas culturas, fazer a mescla.

A aparência e a forma de vestir são importantes no processo de seleção?

Você tem que falar e ser. A imagem diz muito sobre o profissional, gera credibilidade. Queremos nos relacionar com pessoas bem-sucedidas, alegres, bem-vestidas, que entregam os resultados. Mas a pessoa precisa ser percebida e estar adequada ao contexto do ambiente. Você tem que vestir para o que você quer, não para onde você está.  
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