Junto a isso, diz Camila, a escassez de médicos intensivistas para compor as equipes de UTIs em plena expansão nas inúmeras redes hospitalares torna o cenário ainda mais nebuloso. "Mesmo tendo tido o privilégio de poder trocar experiências com especialistas europeus que já vivenciavam a pandemia antes de nós, somente passando por ela é que tivemos a dimensão da sua gravidade." Com o decorrer dos dias, conta ela, o sentimento de equipe foi se consolidando e renovando as forças daqueles que travam uma batalha sem precedentes contra o tempo em prol da vida. Mesmo que para isso a cada minuto suas próprias vidas sejam colocadas à prova. "A Covid-19 me trouxe um senso maior de empatia e de humanidade. Passei a controlar mais minha ansiedade e a viver um dia de cada vez. Percebi que não podemos controlar absolutamente nada."
A rotina da médica e de vários de seus colegas, inclui assistir pacientes sendo isolados em unidades fechadas e ouvir o choro desesperado dos familiares ao imaginar que talvez nunca mais consigam vê-los. Aos familiares daqueles que não sobrevivem, a doença rouba também o direito à despedida. "É impossível não se comover e não perceber o cansaço dos profissionais da saúde envolvidos." Para eles, é sofrido colocar, diariamente, vários pacientes de bruços, realizar procedimentos invasivos e cálculos matemáticos para escolher a melhor forma de manejar o respirador e, mesmo assim, perceber que no final, a batalha foi perdida. Não bastasse isso, saber que em poucos minutos aquele mesmo leito será ocupado por outra pessoa, na mesma condição, e começar tudo de novo. "Convidaria, se fosse possível, cada mineiro a acompanhar nossa rotina. Talvez assim, se conscientizassem sobre a importância de cada um fazer a sua parte e adotar os cuidados preventivos."
A médica vê a chegada das vacinas com bom olhos, como forma de controlar a expansão da doença. Mas acredita que elas não serão capazes de extinguir o vírus. "Por isso a mudança de hábitos é tão importante. É preciso entender que nossos atos impactam diretamente sobre a vida de outras pessoas". Ela mesma segue fazendo sacrifícios. No ano passado, viu a mãe apenas três vezes e, mesmo assim, à distância. Convive com a dor de desconhecidos e com a própria dor de ter de se manter isolada daqueles que ama. Para revigorar as forças e distrair a mente, pratica corrida. Além de não abrir mão do consolo espiritual que sua convicção religiosa (ela é espírita) lhe traz.
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