Enquanto Júnior se colocava a par da situação, a cadelinha Ursa, da raça chow chow, reunia as poucas forças que lhe restavam para tentar se esconder em meio ao mato. Sua saga por aqueles lados havia começado no dia anterior, quando ela e sua parceira "surgiram" do nada no local. A notícia logo se espalhou pelos grupos da região. "Soube que outras pessoas já haviam tentado resgatá-las, mas estavam muito assustadas e não deixavam ninguém se aproximar." Mensagens de que acabariam sendo atropeladas começaram a circular e os esforços foram redobrados. Após dois dias de tentativas, Ursa foi resgatada. "Ficamos mais de três horas nos aproximando e conquistando sua confiança. Nada paga a emoção que senti ao vê-la salva", diz Júnior. A companheira de Ursa não teve a mesma sorte. Morreu atropelada na BR.
Em Belo Horizonte, dados da Secretaria Municipal de Meio Ambiente da PBH estimam que existam cerca de 40 mil cachorros nas ruas da cidade. A população de gatos não é mensurada, mas ativistas preocupam-se com a procriação descontrolada. "Além da questão social e cultural, o aumento do abandono pode estar relacionado também ao vírus da desinformação. Muitas pessoas acham que os animais transmitem o coronavírus, o que não é verdade", esclarece o veterinário Leonardo Maciel, gerente de Defesa dos Animais da SMMA. A solução encontrada foi atuar em várias frentes. Nos Centros de Controle de Zoonoses (CCZ) da capital, castrações gratuitas são realizadas continuamente. O projeto Maloca acolhe os cães de moradores de rua que se recusam a ir para os abrigos para não se separarem de seus companheiros de quatro patas. E a inauguração do primeiro Hospital Público Veterinário de BH é um marco importante de melhoria da saúde pública e bem-estar dos pets.
Os irmãos Aurora e Romeu nem de longe lembram os filhotes desnutridos, com vastas falhas nos pelos provocadas por fungos e barrigas enormes repletas de vermes. Dos sete filhotes tidos por uma cadela sem raça definida dentro de uma escola municipal, sobraram apenas dois. Os demais não resistiram à fome e à doença. "Quando os resgatamos, um terceiro filhote agonizava em meio ao pátio do local. Nunca vi cena tão triste", diz a micro empreendedora Cassilene Ribeiro Oliveira. Hoje ela e a família se divertem com os pets que ganharam um apelido para lá de carinhoso. "É o casal furacão. Por onde passam, não deixam nada inteiro", brinca Cassilene. A filha, Larissa Kaylane Reis de Almeida, virou a mãe adotiva dos pequenos que já esbanjam simpatia em página pessoal no Instagram.
A opção pela adoção ajuda a reduzir o número de animais abandonados, além de não contribuir com o comércio clandestino de venda de filhotes de raça, no qual, muitas vezes, cadelas são mantidas como matrizes, em estado permanente de maus-tratos. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que 30 milhões de animais vivem nas ruas do Brasil, sendo 10 milhões deles gatos e 20 milhões de cachorros. Em grandes cidades, como Belo Horizonte, a estimativa é que para cada cinco humanos, um cachorro está abandonado. A professora universitária Giulia Villela Giovani já teve de tudo em casa. Gato, cachorro, coelho, peixe, galinha. Atualmente convive com cinco pets, entre eles os bichanos Fidel, Tigrinho e Chantilly, todos adotados e sem raça definida. "O bem que eles me fazem é tão grande quanto a minha dedicação por eles", diz ela.
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