Revista Encontro

EDUCAÇÃO

As lições das escolas que já estão recebendo alunos de 0 a 5 anos em BH

Distanciamento nas salas, área de isolamento e mudanças no parquinho são algumas das adaptações feitas com sucesso por instituições de ensino da cidade

Rafaela Matias
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- Foto: Coleguium/Divulgação
Desde 1979, quando foi inaugurada, a escola infantil Chez L'Enfant, no bairro Santo Agostinho, nunca tinha passado tanto tempo fechada. A instituição de ensino, assim como todas as outras na capital mineira, precisou interromper as atividades em março do ano passado e recorrer ao ensino remoto em função da pandemia da Covid-19. As aulas presenciais só puderam voltar agora, no dia 26 de abril, quando a prefeitura de Belo Horizonte autorizou a retomada para os alunos do ensino infantil, com até 5 anos e 8 meses.

Para se preparar para o retorno das 115 crianças matriculadas - apenas 6 permanecem em casa, por opção dos pais -, a Chez L'Enfant passou por adaptações do espaço físico e treinamento dos funcionários, para garantir a segurança de todos. Entre as regras para o retorno, publicadas pela prefeitura no Diário Oficial do Município, estão o uso de máscara em tempo integral, dentro e fora das salas de aula, e que alunos e funcionários deverão levar seus próprios copos ou garrafas de água de uso individual. O tempo máximo de permanência do aluno na escola deverá ser de quatro horas e parquinhos são permitidos para crianças a partir de 3 anos.

Maria Lúcia Rodrigues da Silva, diretora da Chez L'Enfant, contratou uma empresa que fez o programa de retomada segura: "Eles treinaram o pessoal de limpeza, mostrando como realizar a higiene do piso, das carteiras e das paredes, treinou os funcionários e professores para os pontos de atenção, e nos ajudou a fazer as adaptações do espaço" - Foto: Paulo Márcio/EncontroPara atender aos requisitos e não correr o risco de errar, a psicóloga Maria Lúcia Rodrigues da Silva, diretora da Chez L'Enfant, explica que a escola optou por contratar uma empresa que fez todo o programa de retomada segura. "Eles treinaram o pessoal de limpeza, mostrando como realizar a higiene do piso, das carteiras e das paredes, treinou os funcionários e professores para os pontos de atenção, e nos ajudou a fazer as adaptações do espaço", conta. O parquinho de areia passou a ter grama sintética para facilitar a higienização. "Se fosse areia, o intervalo entre uma turma e outra teria que ser de 3 horas.
Com a grama, o funcionário passa, higieniza tudo, e 15 minutos depois pode entrar outra turma", diz Maria Lúcia. Para facilitar o controle do que já foi limpo e do que ainda precisa passar por manutenção foram instaladas placas com duas faces. Na frente está escrito "limpo", em verde, e no verso "limpar", em vermelho. Se alguém chegar com algum sintoma de gripe, como nariz escorrendo, por exemplo, a mesma empresa contratada presta serviço de telemedicina e o médico diz quanto tempo o aluno precisa ficar em casa. Em caso de febre, foi criada uma área de isolamento, um espaço individual e higienizado, onde a criança pode esperar os pais buscá-la.

Outra medida foi o envio de um "check-list" à família, que recomenda:  aferir a temperatura antes de ir (se tiver febre, não mandar); ir de banho tomado e cabelo preso; lavar o uniforme diariamente; e não passar em nenhum comércio antes da aula. Na entrada da escola, um funcionário mede a temperatura e higieniza o calçado e a mochila para a criança entrar. Dentro das salas, o distanciamento é marcado no chão: 2 metros entre uma criança e outra. São no máximo 12 por sala e só entra quem está naquela bolha. "Se alguém estuda de manhã, não pode ir um dia na turma da tarde, por exemplo", explica a diretora Maria Lúcia.

Medidas semelhantes foram adotadas nas unidades do colégio Santo Agostinho dos bairros Santo Agostinho e Gutierrez, além de Nova Lima, onde as aulas voltaram em 10 de maio. Uma semana antes da retomada foram realizadas reuniões com pais para esclarecer como tudo iria acontecer. Nas lives com as crianças, as professoras abordaram o assunto em várias situações e de diferentes maneiras. "Preparamos três vídeos de animação, com voz de criança, em que os envolvemos diretamente como protagonista dessa história, assumindo o papel de super-heróis", conta Aleluia Heringer, diretora de relações institucionais do colégio. A instituição também buscou uma consultoria para criar o próprio Protocolo de Saúde e Segurança, que foi finalizado e apresentado às famílias, por meio de lives, em dezembro do ano passado.
"Tivemos a estrutura completamente adequada com as sinalizações necessárias e distanciamento físico previsto no plano de retomada. As áreas de uso coletivo foram identificadas com o número de pessoas que comportam e outras, sem ventilação adequada, foram interditadas. Barreiras sanitárias foram instaladas e os ambientes e superfícies são higienizados de 2 em 2 horas pelas equipes de limpeza", diz Aleluia.

Aleluia Heringer, diretora de relações institucionais do colégio Santo Agostinho: "Estamos vendo na prática a eficácia dos protocolos adotados em nossas unidades e fazendo pequenas adaptações ou ajustes onde está sendo necessário. A partir dessa experiência, será possível visualizar e executar estratégias para ter uma escola com mais alunos frequentando ao mesmo tempo" - Foto: SIC/ArquivoOs pais também foram orientados a enviar para os alunos kits individuais, com lenços descartáveis para serem utilizados em casos de tosses ou espirros.   Mesmo assim, aulas on-line serão mantidas para as famílias que não se sentirem confortáveis para o retorno presencial. De acordo com Aleluia Heringer, as medidas servirão de base para que, em breve, mais alunos possam voltar. "Estamos vendo na prática a eficácia dos protocolos adotados em nossas unidades e fazendo pequenas adaptações ou ajustes onde está sendo necessário", afirma. "A partir dessa experiência, será possível visualizar e executar estratégias para ter uma escola com mais alunos frequentando ao mesmo tempo."

A rede de ensino Coleguium, que possui 20 unidades em Minas Gerais, também criou um protocolo próprio, feito a partir das diretrizes fornecidas por órgãos federais e internacionais, como o Ministério da Saúde, Anvisa e CDC (Centers for Disease Control and Prevention), e por meio de intercâmbio de informações com escolas de outros países. "Estabelecemos a retomada gradual, segmentada por fases. Os recreios das turmas são em horários e locais diferentes e não há disponibilização de brinquedos nos intervalos",  diz Daniele Passagli, diretora-geral da rede. "Em outras fases, em que será permitido o uso das áreas comuns, todos os espaços serão limitados, seguindo as regras de distanciamento social e higienização constante."

As escolas também adotaram horários diferenciados para a realização das atividades, procedimentos de limpeza e desinfecção constantes, uso e disponibilização de álcool em gel, uso de máscara dentro e fora de sala de aula e a ventilação natural das salas. "Também há aferição de temperatura e uma central de monitoramento.
Em caso de febre ou outros sintomas, o aluno será encaminhado para a sala de espera, avisando a coordenação para que o responsável seja notificado", afirma Daniele.

Maria Claret Elias, diretora pedagógica da Bilboquê: "As crianças sofreram e ainda sofrem com o distanciamento, a falta de contato com avós, com os amigos. Isso tudo tem sido abordado com atenção para minimizar os impactos emocionais que a pandemia trouxe a todos nós" - Foto: Uarlen Valério/EncontroDo ponto de vista pedagógico, uma avaliação permitiu dar continuidade ao que foi ensinado no ano passado. Para as turmas do 1º e 2º anos do Ensino Fundamental, que ainda não retornaram presencialmente, foi mantido o processo de desenvolvimento da leitura e escrita no ambiente on-line. "Essa é uma fase muito importante, em que ocorre a alfabetização e o letramento. Iniciamos com a aplicação de um diagnóstico e, a partir do levantamento e análise dos dados, foi realizada a segmentação dos alunos pelos níveis de alfabetização", conta a diretora.  Daniele comemora o retorno gradual, mas diz que a saudade do contato vai permanecer por um bom tempo "Tanto os professores quanto os alunos tiveram de lidar com um ‘monstro' invisível: a saudade. Um abraço afetuoso de nossos alunos em um momento em que o medo tomou conta do mundo fez e ainda fará muita falta."

A escola Bilboquê, presente nos bairros Gutierrez e Buritis, precisou se reinventar antes mesmo da retomada das aulas presenciais. Ao longo do ano passado, viu o quadro de alunos cair em mais de 50%. "Depois de 15 dias fechados, os pais foram percebendo que seria impossível retornar as atividades escolares e, então, fomos recebendo aos poucos a suspensão das matrículas", lamenta a diretora pedagógica, Maria Claret Elias. "As escolas de educação infantil foram as que mais sofreram nesta pandemia."

Após meses buscando alternativas para manter as atividades, a diretoria decidiu transformar a escola em um espaço de brincar, em setembro do ano passado. "Começamos a desenvolver atividades com o apoio de uma empresa que deu toda a orientação para a utilização dos protocolos de segurança sanitária, para que nenhuma criança ou profissional viesse a adquirir dentro da instituição a doença", explica. Os protocolos foram mantidos e atualizados agora, para o retorno das aulas presenciais. "Estamos criando uma estrutura interna, da mesma forma que foi feita no espaço de brincar. Criamos barreiras sanitárias e plastificamos vários ambientes para facilitar a higienização", diz. A Bilboquê também criou bolhas de, no máximo, 12 alunos. Cada bolha tem uma cor e essa cor define os horários de entrada e saída, para que as famílias evitem o contato umas com as outras, além dos horários para usar os ambientes de brincadeira. Na troca entre uma aula e outra, os professores têm 10 minutos para fazer a própria higienização.  "Os profissionais lavam as mãos, passam álcool, limpam os sapatos em um tapete sanitizante e trocam de roupa e jaleco", diz Maria Claret.

Daniele Passagli, diretora-geral da rede Coleguium: "Os recreios das turmas são em horários e locais diferentes e não há disponibilização de brinquedos nos intervalos. Em outras fases, em que será permitido o uso das áreas comuns, todos os espaços serão limitados, seguindo as regras de distanciamento social e higienização constante" - Foto: DivulgaçãoNa chegada, as crianças também passam pelo processo de higienização dos sapatos. Dentro das salas, a recomendação é usar apenas meias antiderrapantes. "Solicitamos que só na segunda-feira a criança traga os pertences, como as roupas e máscaras que serão usadas durante a semana. Na sexta, devolvemos a mochila para a família e durante a semana mandamos apenas as roupas que estão sujas, dentro de um saco esterilizado", explica Maria Claret. A preocupação não passa apenas pela saúde física. A escola também desenvolveu, com o setor de psicologia, um projeto socioemocional, para conversar com os profissionais e dar suporte para as famílias e crianças sobre o sentimento da "perda" da escola no ano que passou. "Essas crianças sofreram e ainda sofrem com o distanciamento, a falta de contato com avós, com os amigos. Isso tudo tem sido abordado com atenção para minimizar os impactos emocionais que a pandemia trouxe a todos nós."

Embora ainda não tenha recuperado todos os alunos perdidos durante a pandemia, a Bilboquê já recebe novatos e algumas famílias em busca de retorno. E a volta às aulas é feita em um ambiente acolhedor. "Preparamos todas as turmas, enfeitamos a entrada. Percebemos o quanto a escola fez falta para as crianças e para os pais. Aos poucos, temos retornado com alegria e disposição", conta Maria Claret. "A escola hoje está viva. O que torna esse espaço educacional perfeito é a presença da criança." Esse foi o sentimento de todos os educadores, que precisaram lidar, nos últimos meses, com a saudade da alegria presencial.

10 boas ideias de medidas adotadas pelas escolas para reduzir o risco de contágio nas instalações - além dos obrigatórios uso de máscara, álcool em gel e aferição de temperatura:

  • Trocar a areia do parquinho por grama sintética

  • Trocar cordas de apoio nos brinquedos por rampas de madeira envernizada

  • Fazer marcações no chão para indicar o distanciamento

  • Higienizar mochilas e calçados na entrada

  • Interditar os espaços com pouca ventilação

  • Escalonar os horários de entrada e saída

  • Plastificar ambientes para facilitar a limpeza

  • Criar bolhas de até 12 alunos e restringir o contato com outras crianças

  • Orientar os professores a se higienizarem e trocarem de roupa entre as aulas

  • Criar um ambiente de isolamento para crianças com sintomas gripais aguardarem os pais buscá-las
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