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Os coordenadores do projeto, professores Rudolf Huebner (à esq.) e Claysson Vimieiro, com protótipo da órtese que inspirou a mão biônica: equipamento está patenteado e o LabBio procura parceiro para dar início à produção - Foto: Pádua de Carvalho/Encontro O desafio é simples. Pegue uma das suas mãos, amarre nas costas e tente levar a vida por uma hora. Nos primeiros minutos, é possível continuar com algumas das tarefas mais fáceis, como usar o celular, abrir a porta de casa ou brincar com o pet. Com o passar do tempo, porém, a dificuldade aumenta. Descascar uma fruta, amarrar os sapatos, dobrar uma roupa, digitar no computador, abrir uma garrafa de água, colocar a pasta de dente na escova. Uma infinidade de tarefas feitas de maneira banal por quem tem os membros funcionando pode se tornar um desafio terrível para quem teve uma mão amputada ou perdeu os movimentos de uma parte do corpo.
Para tornar essa tarefa menos árdua, um grupo de pesquisadores da UFMG desenvolve projetos de próteses e órteses destinadas a pessoas que sofrem com essa e outras condições. Em abril, o Laboratório de Bioengenharia da universidade foi premiado com 1,3 milhão de reais, concedidos por meio de um edital do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação. O objetivo do projeto apresentado é criar uma prótese tão sofisticada quanto as fabricadas pelas indústrias europeias, que são referência no mercado, e com um custo final de aproximadamente um quinto do preço. "Essa mão biônica é o resultado de anos de pesquisas em próteses e órteses feitas por nós desde 2005", diz o coordenador do LabBio, professor Claysson Vimieiro. Ele e o professor Rudolf Huebner, responsáveis pela supervisão do projeto, são integrantes do laboratório desde a sua fundação, em 1999, pelo professor Marcos Pinotti. "Os projetos do LabBio têm a característica de serem multidisciplinares, unindo engenharia e medicina", conta Claysson, ex-aluno do professor Pinotti, que morreu em 2016.
Grande parte da mágica por trás da mão biônica está na maneira como ela poderá ser controlada pelo usuário. Para isso, será necessário um tempo voltado para o aprendizado. "Não é algo para comprar em uma prateleira e sair usando no momento seguinte", afirma Claysson. "É preciso passar por um programa de treinamento." Esse processo terá de ser feito com a ajuda de um ortopedista ou fisioterapeuta, responsável por fazer a calibragem inicial do aparelho e apresentar os primeiros movimentos. Por meio de um aplicativo no celular, o profissional da saúde poderá demonstrar os primeiros passos. Outra forma disponível para controle do equipamento será por comando de voz, composto pelo reconhecimento de palavras chaves pronunciadas pelo usuário, indicando tarefas como beber água, fazer uma pinça, girar o punho e vários outros. Por fim, sinais musculares, detectados por sensores colocados em pontos chaves dos músculos do braço e ombro, também serão usados para detectar os movimentos que o usuário está tentando fazer. "Estes sinais são os mais complexos de serem traduzidos pela máquina. Para isso, o profissional e o usuário terão de fazer um rigoroso processo de calibragem", diz o professor. Uma outra maneira estudada pelo grupo de integrar corpo e prótese seria por meio de impulsos elétricos enviados pelo cérebro ao resto do corpo. Com a tecnologia disponível hoje, porém, seria necessário que a pessoa usasse um capacete, com vários sensores, durante todo o tempo de uso da prótese.
Enquanto as pesquisas da mão biônica continuam, um dos integrantes do grupo vive com ansiedade os últimos dias para dar início aos testes de um outro equipamento. Batizada de Esperança LabBio, a prótese de punho desenvolvida pelo doutorando Rodrigo Romero, em parceria com o seu orientando Klifton Amorim, aguarda apenas a aprovação do Conselho de Ética da UFMG para ser testada em 30 voluntários. "Esse foi o meu projeto de mestrado, que apresentei em fevereiro do ano passado. Mas a pandemia acabou atrapalhando essa fase final", conta o inventor. O equipamento foi desenvolvido para pessoas que não possuem os dedos ou partes do punho. "As próteses convencionais possuem dificuldade em se adaptar a alguns casos, o que leva a pessoa a desistir de usar", diz.
Após dois anos de pesquisa, o inventor conseguiu criar equipamentos completamente personalizáveis e capazes de atender diferentes casos. Dentro do laboratório do LabBio, uma impressora 3D faz, camada por camada, o modelo de cada prótese. O movimento é realizado por meio da força exercida pelo punho, acionando uma série de cabos que abrem ou fecham a prótese. "Tivemos o cuidado de fazer as falanges separadas da mesma maneira que na nossa mão. Não parece muito, mas isso faz uma diferença enorme no uso da prótese." O equipamento também é revestido com uma borracha, para simular melhor a superfície da mão. Já a força precisa ser calibrada pela equipe, para que a pegada não seja nem muito frouxa nem muito forte. Segundo Rodrigo Romero, o custo final da Esperança LabBio, que poderá ser impresso e revestido de acordo com a preferência da pessoa, será de aproximadamente 250 reais. Além disso, o equipamento é feito com peças nacionais e fáceis de serem substituídas em caso de algum defeito. Para não deixar o usuário na mão, novamente com o perdão do trocadilho.
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