Revista Encontro

MERCADO IMOBILIÁRIO

Os desejos do belo-horizontino que está à procura de um novo imóvel

Construtoras e imobiliárias precisam estar atentas ao jeito exigente e detalhista dos compradores da capital mineira

Marina Dias
- Foto: Shutterstock
"Não há lugar como o nosso lar" é a frase que Dorothy, do filme O Mágico de Oz, de 1939, precisava dizer, enquanto batia os calcanhares calçados em sapatos vermelho-rubi, para sair do mundo fantástico de Oz e voltar ao Kansas. Também nós belo-horizontinos levamos essa máxima muito a sério, e a busca por um imóvel na capital mineira não é jornada simples. Quando consultados, especialistas no mercado de BH descrevem o cliente como exigente, detalhista e muito preocupado com encontrar o lar dos sonhos, e não só um lar melhor.

Segundo pesquisa da Loft, plataforma digital de compra e venda de imóveis que aterrissou em BH este semestre, 43% dos entrevistados viam como principal dúvida na jornada de compra "não saber se encontrariam um imóvel como gostariam" - em comparação, na mesma pesquisa realizada em São Paulo e no Rio de Janeiro esse índice foi de 34% e 35%, respectivamente. E o que é o lar dos sonhos no caso do belo-horizontino? Não há uma resposta única, já que as demandas variam e dependem de diversos fatores, como tamanho da família, do bolso e estilo de vida. Alguns quesitos, contudo, parecem bastante comuns, sendo um deles o espaço. A pesquisa identificou que apenas 21% dos entrevistados estavam à procura de um imóvel com até 90 metros quadrados (contra 66% dos paulistanos e 64% dos cariocas). Isso, considerando que, segundo o censo 2010, 72% dos belo-horizontinos residem em imóveis de até 2 dormitórios - bem menos do que em São Paulo e no Rio, onde a proporção é de 82% e 85% respectivamente.

Alexandre Lodi, CEO da Construtora Caparaó: "Os belo-horizontinos têm ido atrás de apartamentos mais confortáveis, com espaços que proporcionem mais qualidade de vida, por isso, a principal busca por imóveis no último ano foi, em geral, para upgrade" - Foto: Alexandre Rezende/EncontroA explicação, segundo Tárcio Barbosa, diretor de vendas e marketing da Construtora Canopus, está nas características diferentes dessas três capitais. "Há mais semelhanças do que diferenças nas demandas das pessoas nos três locais, mas as diferenças se dão por peculiaridades das cidades", diz.
Em São Paulo, a mobilidade é fator determinante na escolha por um imóvel, devido ao problema do trânsito e das maiores distâncias. Por isso, o comprador está disposto a sacrificar o tamanho do lar por um ponto próximo do trabalho, por exemplo - normalmente em área mais nobre e mais cara. Além disso, há quem tenha na cidade apenas um ponto de apoio, um lugar para ficar quando vai à metrópole, enquanto vive em outro local, e aí não é necessário um espaço tão amplo. Já no Rio, quem deseja morar perto da praia normalmente precisa aceitar um imóvel menor. Em BH, sem praia e com trânsito bem menos pior que o paulistano, encontrar um espaço mais amplo e não tão longe dos locais que se pretende frequentar parece ser mais possível.

A pandemia teve papel importante nesse ponto do tamanho, também. Segundo José Augusto Castanheira, diretor comercial da Altti, havia em BH, como em outros locais, há alguns anos, uma tendência de busca por espaços menores. "Com a pandemia, essa procura se alterou, e a questão do espaço passou a ser preponderante", afirma. Ele conta que em um empreendimento que a construtora havia acabado de lançar quando começou a pandemia, a primeira unidade vendida foi a cobertura, o que não costuma ser o caso, já que são opções mais caras. "A justificativa do cliente, que já morava em um bom apartamento na mesma região, foi que precisava de um espaço para tomar sol." Também o CEO da Construtora da Caparaó, Alexandre Lodi, vê mudança de hábitos, motivações e buscas com a pandemia. "Os belo-horizontinos têm ido atrás de apartamentos mais confortáveis, com espaços que proporcionem mais qualidade de vida, por isso, a principal busca por imóveis no último ano foi, em geral, para upgrade", afirma. O que ainda não se sabe é se a tendência deve permanecer no pós-pandemia.

Tárcio Barbosa, diretor de vendas e marketing da Construtora Canopus: "Em BH se gosta de prédio revestido. O paulistano não está preocupado com isso e, no Rio, pesa mais a questão da vista e da claridade" - Foto: Pádua de CarvalhoNão apenas o tamanho da casa ou apartamento tem sido mais levado em conta pelos belo-horizontinos no "novo normal", mas também as opções de usos e de lazer dos condomínios. "Antes da chegada da Covid-19, já percebíamos o maior desejo das pessoas por áreas de lazer mais completas, que atendessem toda a família, e essa demanda se intensificou no período pandêmico", explica Viviane Sieiro, diretora comercial da MRV. O salão de festas continua item básico, mas agora pode até ser adaptado como coworking durante o dia, o que permite maior utilização de um espaço que normalmente fica vago grande parte do tempo.
Essa possibilidade de conversão dá aos moradores a chance de trabalhar em casa sem ser necessariamente dentro de casa. "O regime de trabalho híbrido veio para ficar, então coworkings não serão interessantes apenas na pandemia", diz Tárcio Barbosa, da Canopus.

Viviane Sieiro, diretora comercial da MRV: "Antes da chegada da Covid-19, já percebíamos o maior desejo das pessoas por áreas de lazer mais completas, que atendessem toda a família, e essa demanda se intensificou no período pandêmico" - Foto: Rodrigo Gomes/DivulgaçãoO espaço gourmet tem sido um dos queridinhos por aqui. Meio-termo entre o salão de festas e sala de estar, comporta uma reunião mais íntima sem o incômodo do lar todo bagunçado no dia seguinte. Nos últimos três ou quatro anos, têm feito sucesso, ainda, os "pet places", espaços para passear com os bichos de estimação dentro do condomínio. Outro diferencial é o espaço beleza, ambiente em que moradores podem receber prestadores de serviço na área de beleza e bem estar, o que, se não era tão comum no pré-pandemia, passou a ser uma modalidade mais requisitada desde o ano passado. Outro ponto importante mais valorizado com a pandemia, de acordo com Alexandre Lodi, da Caparaó, são espaços como varandas e áreas de lazer abertas, que têm estado no topo da lista de prioridades segundo o comportamento de compra no último ano. "Muita gente descobriu que gosta de ficar em casa e por isso estamos investindo em projetos com ambientes que atendam essa variedade de ambientes", afirma.

José Augusto Castanheira, diretor comercial da Altti: "A qualidade dos acabamentos internos é muito olhada. O belo-horizontino é exigente, sabe reconhecer qualidade e faz comparação entre imóveis nesse quesito" - Foto: Paulo Márcio/EncontroAs vagas de garagem são um capítulo à parte na questão cultural entre cidades. Em BH é difícil imaginar compradores que não fazem questão de ao menos saber quais são e onde ficam as vagas relativas à unidade pela qual se interessam. Lucas Couto, diretor comercial e de marketing do Grupo Patrimar, diz que a informação pode até influenciar o cliente a escolher uma unidade em detrimento de outra no mesmo prédio. Já no Rio, isso nem seria uma opção, dado que não é comum que já se saiba qual a vaga vinculada ao apartamento na hora da compra - e em muitos casos nem há vagas fixas, apenas há garantido o número de vagas de cada unidade.
Couto percebeu essa diferença no empreendimento que lançaram em setembro último na Barra da Tijuca, no Rio. "Aqui mineiro valoriza demais a vaga, se é perto do elevador, se tem boa área de manobra, e lá no Rio nenhum cliente perguntou qual era a vaga." Em São Paulo, segundo José Francisco Cançado, sócio-diretor da Conartes Engenharia, existem tamanhos diferentes de vagas, o que não é comum na capital mineira, pelo menos por enquanto. "Lá são mais detalhistas nesse sentido, pois há três tamanhos de vaga - pequena, média e grande - definidas em projeto", explica. "Se tiver lugar para motocicleta, isso fica demarcado também."

José Francisco Cançado, sócio-diretor da Conartes Engenharia: "Tenho notado que as pessoas têm mudado de moradia com mais frequência, a cada dez anos, mais ou menos. Não estão mais enraizadas no imóvel em que nasceram, isso diminuiu muito." - Foto: Arquivo Conartes/DivulgaçãoO alto nível de exigência do belo-horizontino se mostra à toda quando o assunto são acabamentos e revestimentos. Prédios revestidos são um valor para os moradores de BH - o que não necessariamente se repete em outras bandas. "Em BH se gosta de prédio revestido", explica Tárcio Barbosa, da Canopus. "O paulistano não está preocupado com isso e, no Rio, pesa mais a questão da vista e da claridade", completa. Dentro dos apartamentos, também, a qualidade dos acabamentos é valorizada e os imóveis são entregues já completos nesse sentido. Imóveis entregues "no osso" não é uma prática permitida pela legislação da cidade e já é parte da cultura local receber a casa pronta. "A qualidade dos acabamentos internos é muito olhada", confirma José Augusto Castanheira, da Altti. "O belo-horizontino é exigente, sabe reconhecer qualidade e faz comparação entre imóveis nesse quesito."

Com as facilidades da internet e redes sociais, as pessoas têm ficado bastante ligadas nas novidades do mercado, de acordo com os especialistas. O processo de buscar e conhecer imóveis ficou mais fácil e é possível visitar quantos lugares se quiser sem nem sair de casa. Por isso, "dar uma olhadinha" de vez em quando e, quem sabe, encontrar um espaço interessante, tem sido mais comum. De acordo com a pesquisa da Loft - que entrevistou 208 pessoas das classes A, B e C de Belo Horizonte e região metropolitana que compraram e/ou venderam um imóvel residencial nos últimos 3 anos ou pretendem comprar e/ou vender nos próximos 18 meses -, o tempo gasto pelo belo-horizontino entre a decisão de ativamente buscar um novo lar e a compra é de 7,7 meses, média bem parecida com as do Rio e de São Paulo. "O mineiro é exigente e isso se reflete quando vai escolher um lugar para morar. Detalhista, ele pesquisa e compara muito antes de tomar uma decisão por um imóvel", diz Viviane, da MRV.

Lucas Couto, diretor comercial e de marketing do Grupo Patrimar, que acaba de lançar um empreendimento na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro: "Aqui mineiro valoriza demais a vaga de garagem, se é perto do elevador, se tem boa área de manobra, e lá no Rio nenhum cliente perguntou qual era a vaga" - Foto: Alexandre Rezende/EncontroSegundo José Francisco Cançado, da Conartes, as pessoas têm se animado a se mudar mais nos últimos tempos. "Tenho notado que as pessoas têm mudado de moradia com mais frequência, a cada dez anos, mais ou menos", diz. "Não estão mais enraizadas no imóvel em que nasceram, isso diminuiu muito." Nessa busca, a localização segue como um dos pontos principais, senão o principal - o que não tem nada de peculiar do belo-horizontino. No entanto, como a questão da mobilidade não pesa tanto quanto em São Paulo, e a preocupação com segurança, apesar de muito presente, não é tão prioritária quanto no Rio, a escolha da localização do imóvel tem outras variáveis envolvidas quando se fala de BH. Por aqui, pesam também proximidade com bom comércio, tranquilidade da região e, segundo Viviane Sieiro, da MRV, a proximidade com a família: "o mineiro tem uma relação muito grande com suas origens, ele valoriza a família e suas raízes junto ao local onde nasceu/cresceu", diz. "Ao escolher um imóvel, leva muito em consideração a proximidade com os parentes e a região em que passou sua infância e adolescência."

Veja algumas conclusões da pesquisa:

Motivações para compra

  • Sair do aluguel - 20%

  • Mudar para espaço maior - 17%

  • Morar junto com parceiro - 15%

  • Sair da casa dos pais - 10%

  • Localização melhor / perto do trabalho - 7%

Imóvel comprado ou desejado

  • Apartamento - 55%

  • Casa em bairro aberto - 42%

  • Casa em condomínio - 27%

  • Terreno/lote - 21%

Características mais desejadas na região do imóvel

  • Mercado/padaria/comércio nos arredores - 56%

  • Bairro tranquilo - 54%

  • Segurança - 50%

  • (Em último, perto de trem e metrô - 12%)

Outros aspectos da busca

  • Tempo médio de busca - 7,7 meses

  • Número médio de imóveis visitados - 6,6

  • 21% dos belo-horizontinos buscam imóvel com até 90m2 (contra 66% dos paulistanos e 64% dos cariocas)

  • Principal motivo de venda é troca por um imóvel maior (30%), seguido de maior qualidade de vida para a família (26%) e melhor localização (23%)
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