Dono da rede de restaurantes Coco Bambu, que acaba de inaugurar sua 94ª loja, Afrânio, de 68 anos, deve faturar cerca de 2,5 bilhões de reais em 2025. Tem 200 sócios e mais de 10 mil funcionários. “Hoje, o Jaime me chama carinhosamente de ‘meu amigo milionário’”, conta. De norte a sul do país, suas lojas ficam permanentemente lotadas, muitas vezes com fila na porta.
. Tudo começou em 1989, em uma pequena pastelaria, a Dom Pastel, na região central de Fortaleza. Logo depois de sair do BMC, que seria vendido para o Bradesco, Afrânio montou um lava-rápido com serviços diversos para automóveis e uma construtora. Apesar da formação em engenharia civil, ele não estava satisfeito. Seu futuro estava em um ramo completamente diferente e a influência de sua mulher, Daniela, foi primordial.
. A abertura da Dom Pastel foi quase que por acaso. A avó materna de Afrânio era dona de um casarão de dois andares a alguns quarteirões da Praia de Iracema, área nobre de Fortaleza. Quando o inquilino entregou o imóvel, ela se viu sem fonte de renda e recorreu ao neto. “Apesar de ela ter uns 15 netos, eu era o único empreendedor. Aí ela me pediu para fazer alguma coisa ali, já que não podia ficar sem o aluguel”, lembra. À princípio, Afrânio rejeitou a proposta. Mas em seguida veio a ideia: fazer ali um pequeno open mall, com oito lojas na parte de baixo e mais seis no andar de cima. A loja de esquina, ele reservou para a pastelaria. Pagava o aluguel do casarão para a avó e ainda embolsava um lucro todo mês. Daniela tocava a cozinha da Dom Pastel e Afrânio era o responsável pela retaguarda, desde a obra para receber o empreendimento à compra dos saquinhos com a logomarca da empresa. O sucesso foi imediato. “Começamos com quatro funcionários e um mês depois já tínhamos 17”, afirma Daniela. “Como a loja tinha 25 metros quadrados, se colocássemos todos dentro, não cabia.” Com o tempo, a operação foi crescendo. Sempre que um locatário entregava alguma loja, Afrânio e Daniela, em vez de alugá-la novamente, incorporavam o espaço ao Dom Pastel. Hoje, não só todo o casarão é ocupado pelas marcas do casal (Dom Pastel, Coco Bambu e o bufê infantil Plus) como diversos terrenos no fundo, ao lado e até do outro lado da rua.
. O bufê infantil foi a primeira empreitada depois do Dom Pastel. A ideia do Coco Bambu, carro-chefe da rede, surgiu em uma viagem de Daniela e Afrânio com alguns amigos de navio pelo Caribe. O grupo parou em uma ilha, entrou numa barraca de praia, daquelas com teto de palha, pediu saladas e pizzas. Daniela maravilhou-se. “A comida era muito boa. Se a decoração não era lá muito requintada, o que eles serviam era, sim”, lembra ela. De pronto, Afrânio, que tinha um terreno no bairro Meireles, próximo à Avenida Beira-Mar, respondeu: “Vamos levar essa ideia para Fortaleza, então. Vamos fazer uma barraca de praia no meio da cidade”. Na época, a casa vendia pizzas e tapioca. O nome surgiu exatamente por causa da decoração, com muito bambu, e dos elementos praianos, como bebidas servidas em tigelas de coco.
. Os frutos do mar, hoje marca registrada do grupo, entraram no cardápio alguns anos depois, em 2008, quando Afrânio recebeu uma ligação de uma família cearense lhe oferecendo um terreno na beira da praia. “Eles me falaram assim: ‘a gente tem essa área e você não quer fazer alguma coisa lá? Tudo que você faz dá certo”. Daniela, assim que soube da oferta lembrou-se de um restaurante que eles frequentavam no início da vida a dois, que servia peixes e frutos do mar “deliciosos”. Tinha, inclusive, um aquário de lagostas na entrada do salão. “Apesar de não pedirmos muita lagosta, não, pois eram um tanto caras para um casal recém-casado”, brinca. Era o Trapiche, que havia deixado saudade entre os gourmets cearenses. Afrânio logo emendou: “Temos de abrir um Trapiche, porque está faltando algo assim na cidade”. Nascia, então, o Coco Bambu Frutos do Mar.
. No início de 2025, o Coco Bambu conquistou na Justiça o direito de usar o slogan “O Melhor Restaurante do Brasil”. A frase, utilizada em algumas peças publicitárias da rede, havia sido contestada pelo Outback, rede internacional com origem na Flórida. Satisfeito, Afrânio garante não ter a menor dúvida de que o slogan está correto. “O Coco Bambu é grande, bem decorado, tem boas instalações, a comida é farta e o preço é justo. Acho uma operação fantástica. É praticamente a única operação do Brasil que ficou deste tamanho”, diz. “Um restaurante que fatura mais de 2 bilhões por ano só pode ser muito bom. É claro que no Brasil temos restaurantes excelentes, mas no conjunto da obra, tenho convicção de que a frase é verdadeira.” Entre os pratos que mais fazem sucesso com a clientela estão o Camarão Internacional, que traz o crustáceo sobre arroz cremoso com ervilha e presunto, envolvido com molho branco; o Camarão Coco Bambu, que vêm recheados com catupiry e empanados; e a Lagosta Imperial, servida inteira, grelhada, envolvida com molho thermidor.
. Desde 2020, a rede conta com mais uma operação, o Vasto, restaurante especializado em carnes nobres. Atualmente com oito unidades no país, a casa tem desde vieiras sobre arancinis a risoto de pato e cortes de raças britânicas. Inquieto, Afrânio prepara novidades. “Eu não posso divulgar ainda, mas já temos uma marca, um conceito. O projeto vai nascer com uma unidade no coração do Itaim, em São Paulo, e outra em Fortaleza. Os dois locais são espetaculares”, afirma. O único insucesso da carreira de empreendedor de Afrânio Bezerra pode ser creditado à tentativa de internacionalizar o Coco Bambu. Em 2019, depois de um ano de operação, a rede fechou a unidade de Miami, que faturava abaixo do esperado. “Pode-se achar vários culpados, falar que o ponto não era bom, que o restaurante era muito grande, que não soubemos precificar… Mas acho que a parte da cultura é muito forte. E, culturalmente, o americano não come a comida do Coco Bambu”, diz.
. Pode-se dizer que os negócios estão no sangue da família fundadora do Coco Bambu. Neto de Gentil Barreira, político cearense bastante conhecido, que foi deputado federal por 20 anos, Afrânio é filho de um comerciante e de uma dona de casa. Diz ter herdado do pai o dom de fazer negócios. Já Daniela é neta de uma dona de joalheria, dona Amélia Gentil. “Uma mulher muito à frente de seu tempo, que ficou viúva jovem e criou os seis filhos sozinha”, afirma ela.
. Afrânio se emociona ao falar de Jaime Pinheiro, o banqueiro que, segundo ele, “foi uma grande escola”. Os dois trabalharam juntos por cinco anos. “Ele foi um exemplo. Era louco pelo trabalho. Trabalhávamos no mesmo prédio e eu nunca consegui chegar antes dele. Às vezes, dizia para mim mesmo: ‘hoje vou chegar 7 da manhã para ver se começo a pegar no batente antes’. Mas não adiantava. Quando eu entrava, ele já estava lá.” Também diz que raramente conseguia sair depois do patrão. “Foi um aprendizado muito grande ver uma pessoa tão trabalhadora, tão dedicada à família e tão dedicada à empresa. Graças a Deus ainda o mantenho como um dos meus melhores amigos”, diz, com lágrimas nos olhos. É inspirado em Jaime, também, que Afrânio garante que não irá se aposentar nunca. “Ele tinha me dito que iria trabalhar até os 50. Aí, no aniversário, disse que estava adiando a promessa para os 60. Quando a idade chegou, adiou mais uma vez…. Até que no aniversário de 70 anos, ele confessou: ‘Decidi que não vou me aposentar nunca’”, conta. Afrânio está “na mesma pegada”, como costuma falar. “Ele é a única pessoa que eu conheço que sente saudade do escritório quando viaja”, entrega Daniela.
E a sentença? “Eu acho que nunca sentenciei ninguém”, diz Afrânio. “Até para não correr o risco de cometer o mesmo erro do Jaime.”
Ele, contudo, tem uma convicção, que compartilha com seus sócios. Para um empreendimento ser bem sucedido, existe uma fórmula simples, mas nem sempre fácil de ser executada. É preciso muito trabalho e uma família unida em torno dos propósitos do negócio. “Quando se junta a força da família com a força do trabalho, não há limites para o que possamos fazer”, afirma. Com essa fórmula, Afrânio Barreira, ou, simplesmente, Dom Afrânio, está construindo uma legião de fãs-consumidores e um legado único de sucesso empresarial na gastronomia brasileira.