Revista Encontro

Vision Iconic

Mercedes desenvolve pintura solar capaz de gerar energia no veículo

Tecnologia aplicada à carroceria permite gerar eletricidade mesmo com o veículo parado e pode ampliar a autonomia anual em até 20 mil quilômetros

Fábio Doyle
O retrofuturista Vision Iconic: filme fotovoltaico se adapta a diversos materiais e pode aumentar de forma significativa a autonomia de rodagem - Foto: Mercedes-Benz/Divulgação
O mais recente carro conceito Mercedes-Benz, o retro futurista Vision Iconic, tem impressionantes tecnologias como o Nível 4 de direção autônoma e esterçamento “by wire“ – por fios. Um de seus mais atraentes avanços, no entanto, é invisível. A marca alemã desenvolveu um módulo solar com espessura de apenas 5 micrômetros (0,005 mm) que pode ser aplicado diretamente aos painéis da carroceria (teto, capô, portas etc.), permitindo que o Vision Iconic gere energia para sua bateria a partir de toda a superfície do carro.
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Esse revestimento solar é colocado entre a superfície dos painéis da carroceria e a camada de tinta preta brilhante – tipo sanduiche. A pintura baseada em nanopartículas permite que a energia do sol atravesse a camada de tinta, alimentando assim a superfície fotovoltaica, sob a pintura, informa a Mercedes. Diferentemente dos painéis solares tradicionais, o revestimento não contém elementos de terras-raras ou silicone e foi projetado para uma fácil reciclagem, permitindo que 94% da energia do sol passe através da pintura.
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O filme fotovoltaico se adapta a diversos materiais e pode aumentar de forma significativa a autonomia de rodagem (dependendo da geografia e das condições de luminosidade solar), além de gerar eletricidade até mesmo com o veículo parado ou desligado. De acordo com a Mercedes, uma área de cerca de 11 metros quadrados - equivalente à superfície de um SUV médio - pode produzir energia solar suficiente para rodar até 12 mil quilômetros por ano em circunstâncias ideais da luminosidade solar em Stuttgart, Alemanha (sede da Mercedes-Benz). Esse número cresce para 20 mil quilômetros em regiões mais ensolaradas como Los Angeles, diz a Mercedes. Imagine, então, qual seria o resultado no ensolarado Brasil!

Essa tecnologia promete ser um passo importante no esforço da Mercedes para melhorar a eficiência energética e sustentabilidade de sua próxima geração de veículos elétricos. Jochen Schmid, gerente sênior da Mercedes-Benz para direção elétrica, disse na apresentação do conceito em Xangai, na China, que a ideia de células solares em veículos não é novidade, mas que a Mercedes está expandindo limites ao desenvolver uma solução que pode ser aplicada na complexa geometria do exterior de um veículo. “Ela é elástica e dobrável de acordo com o que precisamos para complexos caminhos tridimensionais,” disse. “Esse foi o nosso maior desafio.” A sua equipe está trabalhando agora em métodos potenciais de aplicação que sejam rápidos de eficientes em termos de custo.
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“Ainda precisamos fazer muita pesquisa porque nós não queremos chegar a uma solução que aumente em mais 10 mil euros o preço do veículo, a fim de evitar que o custo total de compra para o consumidor deixe de ser atrativo,” disse Schmid. O executivo apontou que veículos movidos a energia solar poderão em breve ser oferecidos em outras cores, além do preto - a pintura superior pode filtrar a luz para produzir cores como azul, vermelho ou verde - sem bloquear a maior parte da luz solar necessária para gerar energia. A cor, no entanto, representa um custo. Quanto mais escura for, maior é a eficiência solar. “Se formos do preto para o azul, veremos uma queda de 5 por cento no desempenho,” explicou Schmid. “A cor branca é a mais afetada.”
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Oportunidade de crescimento com tetos solares

Outros fabricantes e fornecedores estão começando a adicionar elementos de energia solar aos veículos para melhorar o desempenho. Uma análise da consultoria SBD Automotive indica a expectativa de crescimento anual de 18% para o mercado de carros com tetos equipados com coletores solares no curto prazo. O Toyota Prius plug-in híbrido, por exemplo, é oferecido na Europa com o teto com coletores solares, como item opcional. Mas esse item aumenta em apenas 5 quilômetros de autonomia da bateria por dia. 
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A fornecedora Webasto trabalha no desenvolvimento de sistemas de tetos solares avançados para veículos, integrando células fotovoltaicas de alta eficiência à estrutura do teto do veículo. Esses sistemas são projetados para dar suporte às funções elétricas do carro e, em alguns casos, contribuem também com o carregamento da bateria. Uma outra inovação da Webasto é o conceito EcoPeak, que combina materiais de peso leve com padrões fotovoltaicos otimizados no teto e vidro traseiro, gerando cerca de 350 quilowatt-hora por ano, o que equivale a uma autonomia adicional de 2,5 mil quilômetros, informou Jan Henning Mehlfeldt, responsável por negócios globais da empresa alemã.
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Quanto mais escuro, mais eficiente: se a pintura for do preto para o azul, por exemplo, há uma queda de 5% no desempenho - Foto: Mercedes-Benz/DivulgaçãoA adoção da energia solar para veículos é ainda limitada, mas os esforços para aumentar a eficiência de células solares e para soluções de mobilidade verdes estão abrindo novas oportunidades. Mehfeldt lembrou que a Europa continua sendo a principal região para a integração solar em veículos, impulsionada principalmente pelas metas de sustentabilidade e estruturas regulatórias.
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“No entanto, o interesse cresce na China e nos Estados Unidos, especialmente na medida que consumidores e fabricantes buscam formas alternativas de aumentar a autonomia do veículo elétrico e reduzir a dependência de grade,” disse. Ou seja, das fontes não renováveis de energia, realidade marcante principalmente na Europa e China onde o carvão e termoelétricas ainda tem papel fundamental.
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Ele ressalta que o custo é ainda um fator significativo - a tecnologia solar não é barata, e os consumidores esperam benefício tangíveis. Outro obstáculo potencial para uma adoção mais abrangente é que muitos VEs (veículos elétricos) ficam estacionados em garagens cobertas ou áreas sombreadas, o que limita a exposição solar. Isso sem esquecer que a capacidade de absorção de energia solar em veículos menores é limitada por suas dimensões reduzidas. “Finalmente, a integração de módulos solares sem comprometer a estética, peso e aerodinâmica do veículo requer uma engenharia sofisticada”, disse Mehfeldt. Para destravar uma adoção mais ampla, a tecnologia solar precisa se tornar mais eficiente, acessível e adaptável. “Aumentar a eficiência das células em até 27% é possível”, acredita o especialista.


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