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Estado de Minas MEMÓRIA

Documento mostra que Volkswagen colaborou com a Ditadura Militar no Brasil

Um chefe de departamento da montadora alemã seria o 'braço forte' do governo ditatorial


postado em 14/12/2017 09:02 / atualizado em 14/12/2017 09:30

Durante a Ditadura Militar no Brasil, que durou de 1964 a 1984, a montadora alemã Volkswagen teria apoiado o regime e fornecido informações de seus funcionários
Durante a Ditadura Militar no Brasil, que durou de 1964 a 1984, a montadora alemã Volkswagen teria apoiado o regime e fornecido informações de seus funcionários "rebeldes" (foto: Anonymousbrasil.com/Reprodução)
Segundo informações obtidas pela Agência Brasil, a montadora alemã Volkswagen (VW) teria colaborado com a Ditadura Militar (de 1964 a 1980) no Brasil. Em relatório produzido a pedido da própria VW, a montadora alega que essa participação nas atividades obscuras do período ditatorial brasileiro teria ocorrido por meio de um chefe de departamento, "com o conhecimento tácito da diretoria". O documento chegou a ser entregue a sindicalistas que foram vítimas de perseguições políticas nessa época. "A VW do Brasil foi irrestritamente leal ao governo militar e compartilhou os seus objetivos econômicos e de política externa", diz o texto produzido pelo historiador Christopher Kooper, da Universidade de Bielefeld, na Alemanha, que sugere outras formas de colaboração da empresa com o regime militar em nosso país.

O estudo contratado pela matriz da Volkswagen, na Alemanha, foi produzido após instauração de inquérito civil pelo Ministério Público Federal (MPF) para apurar a responsabilidade da montadora em "graves violações de direitos humanos". A investigação foi iniciada após representação assinada pelas centrais sindicais brasileiras, sindicatos e ex-trabalhadores da empresa, em setembro de 2015. O pedido foi feito a partir das conclusões da Comissão Nacional da Verdade, que apontam a colaboração da empresa com a repressão, além de discriminar trabalhadores com atuação sindical.

Entre as condutas da empresa investigadas estão, por exemplo, permitir a prisão de funcionários no interior de suas unidades; de perseguir trabalhadores por atuação política e sindical, criando "listas negras" para impedir contratação desses profissionais; produzir informações para encaminhamento aos órgãos de repressão; colaborar financeiramente com o regime; e permitir práticas de tortura na sede da montadora.

Atuação de diretor

O relatório da VW aponta que a colaboração com o regime militar se deu, sobretudo, pela atuação do chefe do departamento de Segurança Industrial, Ademar Rudge, que "agia por iniciativa própria, mas com o conhecimento tácito da diretoria". Segundo o documento, essa colaboração ocorreu de 1969 a 1979. Na opinião de Christopher Kooper, o chefe de departamento "sentia-se particularmente comprometido com os órgãos de segurança", por ter sido oficial das Forças Armadas.

"Uma vez que não havia obrigação legal de informar sobre manifestações de opinião da oposição, o chefe da segurança industrial, no monitoramento e na denúncia das atividades da oposição do pessoal, agia em responsabilidade própria e com uma lealdade natural ao governo militar", diz o texto do relatório. Rudge, ainda durante suas atividades na Volkswagen, que se encerraram em 1991 com sua aposentadoria, foi promovido, como reservista, a coronel do Exército Brasileiro.
(foto: Agência Brasil/Reprodução)
(foto: Agência Brasil/Reprodução)

O historiador alemão aponta ainda que "não é possível determinar, com exatidão, o grau de participação da segurança institucional na descoberta e na prisão de um grupo de comunista ilegal". No entanto, reconhece que uma atitude "menos cooperativa" poderia ter "ao menos adiado e possivelmente evitado as prisões".

Crítica ao documento

O relatório produzido por Kooper foi entregue com antecedência atendendo a pedido dos sindicalistas que foram vítimas da colaboração da montadora com o regime militar. Lúcio Bellentani, que foi preso e torturado dentro da montadora, relatou à Agência Brasil que fez essa exigência para que pudesse definir se compareceria ao evento. "Eu sempre dizia: nós não vamos a esse ato, porque nós não sabemos o que está no relatório", comenta o sindicalista. Segundo ele, a empresa enviou o relatório extraoficialmente no dia 1º de dezembro para o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo.

Um grupo de aproximadamente 20 ex-funcionários perseguidos durante o regime militar recusou o convite de participação no evento de apresentação do documento, ao considerar o relatório insuficiente por não apresentar provas documentais. "Eu acredito, pelo renome do historiador, que, se ele tivesse todas as informações, não teria feito esse tipo de relatório. Não acredito que a Volkswagen abriu todos os arquivos para ele", avalia Bellentani.

O sindicalista esclarece ainda que tinha a expectativa de que o documento avançasse no estabelecimento de provas, a partir de documentos da própria montadora. "Você não tem sequer a citação de um documento da Volkswagen, o que encontra é o meu depoimento na íntegra, que dei na Comissão da Verdade", critica. Lúcio Bellentani reclama também de uma postura propositiva no sentido de uma reparação por parte da montadora. "Uma atitude digna seria: 'O nosso relatório está pronto, então vamos começar a conversar e negociar quais as soluções?' E oficializa isso, chama MPF, trabalhadores, centrais e façam propostas", diz.

(com Agência Brasil)

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