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Estado de Minas HISTÓRIA

Projeto ajuda a recuperar a memória de BH em fotos antigas

Criado em 2003, o Cestas da Memória já identificou mais de 18 mil imagens do Arquivo Público de Belo Horizonte


postado em 23/10/2019 13:43 / atualizado em 23/10/2019 14:50

O projeto ajuda a recuperar a memória por trás da paisagem e da história da capital. Acima, uma foto da Praça Sete, no hipercentro de BH, na década de 1940, quando a avenida Afonso Pena ainda era repleta de árvores da espécie ficus(foto: APCBH/ASCOM)
O projeto ajuda a recuperar a memória por trás da paisagem e da história da capital. Acima, uma foto da Praça Sete, no hipercentro de BH, na década de 1940, quando a avenida Afonso Pena ainda era repleta de árvores da espécie ficus (foto: APCBH/ASCOM)
De 15 em 15 dias, um grupo se reúne para recuperar a história por trás de milhares de fotos do século passado, armazenadas no acervo do Arquivo Público de Belo Horizonte sem qualquer tipo de identificação. Composto principalmente por pessoas acima de 60 anos, o grupo de voluntários se debruçam sobre de imagens impressas e digitalizadas, cheias de rostos e paisagens quase esquecidas. Dentro de uma pequena sala do Arquivo Público, na rua Itambé, no bairro Floresta, estes guardiões da memória da cidade lutam contra o esquecimento destas histórias, usando as próprias lembranças como ferramenta.

O projeto Cestas da Memória foi criado em 2003, para recuperar a memória por trás do acervo de fotos produzido pela Prefeitura entre os anos 1950 e 1970. Hoje já é possível ver as pessoas trabalhando na identificação de imagens produzidas no final da década de 80. O grupo de "guardiões da memória" é composto principalmente por idosos, tendo mais de 70 pessoas cadastradas no programa - o mais velho tem 94 anos. "Nós transformamos essa memória oral, que seria perdida com o tempo, em algo palpável, disponível para as futuras gerações", diz Maria Beatriz Hauck, de 63 anos. A servidora pública aposentada é voluntária há cerca de 10 anos.

Detalhe a detalhe, rosto a rosto, a lembrança ao redor de cada imagem vai sendo recuperada, como um quebra-cabeça, por estes guardiões da memória. Todas as descobertas feitas são anotadas em fichas, que passam por um segundo processo de apuração da informação antes de serem catalogadas no acervo.  A diretora de Patrimônio Cultural e Arquivo Público, Françoise Souza, comenta que acha "muito terapêutico todo esse desafio por trás de cada achado. Entendo porque eles voltam sempre". Depois de cada sessão, todos os participantes se juntam ao redor das cestas recheadas de quitutes e conversam sobre cada descoberta, relembrando os detalhes da cidade. O projeto é aberto ao público, sendo que durante o cadastro o voluntário precisa informar em quais pontos ele pode ajudar a reconhecer as imagens: pessoas, paisagens, plantas, eventos. As inscrições são realizadas pelo telefone (31) 3277-4665, de segunda a sexta, das 9h às 17h.

Conheça alguns dos voluntários:

Eduardo Fabri, 66 anos
Especialidade: Construções e fotos aéreas

(foto: Marina Dias/Encontro)
(foto: Marina Dias/Encontro)
Debruçado em uma foto aérea da capital, o funcionário público aposentado Eduardo Fabri procurava atentamente uma referência para poder identificar o local. "Essa aqui é um caso clássico de ‘parece, mas não é’. Isso aqui lembra muito a Rodoviária, pelas avenidas e pelo prédio, mas o formato dessa praça entrega que não é", diz o engenheiro. A experiência por trás do olhar afiado foi construída após anos de trabalho na Secretaria de Obras da Prefeitura, onde acompanhou a transformação das vias e quarteirões do centro da capital mineira durante as décadas de 70 e 80.

E mesmo com tanta história, Eduardo é um dos novatos do grupo. "Essa é a terceira reunião que participo. Fui indicado pela minha mulher, que trabalha aqui, para ajudar e colaborar a levantar essa memória de coisas que presenciei". Para ele, o processo por trás de reconhecer e relembrar uma foto é sempre gratificante.

Marcos de Lima Horta, 64 anos
Especialidade: Locais

(foto: Marina Dias/Encontro)
(foto: Marina Dias/Encontro)
"Você precisa estar atento para os mínimos detalhes". É assim que Marcos de Lima Horta observa as imagens no notebook, dando zoom em cada placa, cerca e prédio. Participante do grupo há mais de 10 anos, o olhar apurado do geriatra já conseguiu decifrar vários mistérios escondidos no acervo do Arquivo Público. "Tinha essa foto de um convento, onde hoje é o Ibmec, que consegui decifrar por causa de um desenho no concreto. Se você passar lá com atenção, vai ver que ele ainda está lá", conta o médico com orgulho.

Entusiasta da história de Belo Horizonte, Marcos também participa de grupos de Facebook que compartilham fotos de monumentos e construções antigas da cidade. Para ele, participar do "cestas da memória" é uma honra. "Sinto uma satisfação enorme quando me chamam para participar. É um prazer enorme para mim."

Theódulo Amaury, 74 anos
Especialidade: Pessoas

(foto: Marina Dias/Encontro)
(foto: Marina Dias/Encontro)
Os anos e anos trabalhando com editorias relacionadas a política, polícia e economia fizeram com que a memória do jornalista Theódulo reconhecesse os diversos rostos presentes nas fotos. "É a Miriam Staino Ferrara, mulher do prefeito Sérgio Ferrara", diz, depois de fixar os olhos no rosto no centro da foto. Os voluntários estavam há um tempo tentando lembrar o nome completo daquela mulher, que aparecia em tantas imagens. A descoberta do nome completo dela fez com que todos fossem à mesa de Theódulo, aliviados por terem um mistério a menos no Arquivo Público.

Há cinco anos no projeto, o jornalista aposentado considera que todo mundo sai ganhando com a iniciativa. "Venho aqui, colaboro com esses milhares de fotos sem identificação e ainda mantenho a minha cabeça ativa", conta. Mas mesmo com tanto exercício, existem memórias que voltam de lugares onde você menos espera. "Teve uma pessoa que eu reconhecia em várias fotos, mas só fui lembrar o nome por causa uma rua no Belvedere: Celso Porfírio Machado, que foi vice-governador."

Maria Beatriz Hauck, 63 anos
Especialidade: Pessoas e eventos

(foto: Marina Dias/Encontro)
(foto: Marina Dias/Encontro)
Outra voluntária antiga do Cestas da Memória, Maria Beatriz já está há 10 anos reconhecendo eventos e pessoas nas fotos do Arquivo Público. Principalmente quando o assunto é esportes. "Trabalhei durante muito tempo na Secretaria de Esportes, ajudando a promover eventos e participando de diversas solenidades esportivas", diz.

A servidora aposentada também tem uma história curiosa por trás do seu trabalho: ela já se viu em uma das fotos. "Era um encontro de skatistas que aconteceu lá na Praça do Papa, em 1978 ou 1979. Esse foi um dos primeiros eventos que trabalhei na Prefeitura, tanto que eu apareci em uma", conta. Para ela, o projeto é tão legal de participar que quase não dá para vê-lo como um trabalho. "É uma delícia esse trabalho. Nós transformamos essa memória oral em algo palpável."

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