
Naquele mês de novembro de 1967, os jornais da época destacavam o fato de que, em uma mesma semana, a filha do autor mineiro, Wilma Guimarães Rosa, lançaria seu primeiro livro, Acontecências, no dia 13, e três dias depois, seu pai tomaria posse na ABL.
"Eram duas maravilhosas acontecências em nossas vidas, eu lançando meu primeiro livro e meu pai tendo o coroamento da carreira literária dele. Infelizmente, para nossa tristeza, no domingo, Dia da Bandeira [19 de novembro] que ele tanto reverenciava, Deus o chamou. Foi uma semana que começou linda, mágica, entusiasmante, e terminou de um modo trágico para todos nós, família, amigos, leitores, admiradores. Porém, resta o consolo da frase que meu pai proferiu, junto com o discurso de posse na Academia Brasileira de Letras: as pessoas não morrem, ficam encantadas", relembra Wilma, em depoimento publicado na página do Facebook da editora Nova Fronteira, que há três décadas é responsável pela publicação das obras de Guimarães Rosa.
Homenagens foram prestadas ao autor em vários pontos do país no domingo (19). Em Belo Horizonte, a praça Guimarães Rosa, no bairro Cidade Nova, foi reinaugurada, passando a contar com uma estátua em homenagem ao célebre mineiro. Também neste domingo, em São Paulo, a Livraria da Vila, no bairro dos Jardins, recebeu atores, entre eles Lima Duarte, para leituras de trechos do romance Grande Sertão: Veredas.
História
Nascido em Cordisburgo (MG), em 27 de junho de 1908, João Guimarães Rosa se mudou aos 10 anos para Belo Horizonte, onde se formou em Medicina em 1930 e começou a trabalhar como capitão médico da Força Pública do Estado de Minas Gerais. Um ano antes da formatura, porém, ele já havia tido sua estreia literária, com a publicação na revista O Cruzeiro do conto O mistério de Highmore Hall.
Em 1936, a coletânea de versos Magma, obra inédita, recebe o Prêmio Academia Brasileira de Letras, com elogios do poeta Guilherme de Almeida (1890-1969). Nessa época, Guimarães Rosa já havia iniciado a carreira de diplomata, na qual ingressara por concurso em 1934.
Ao longo das duas décadas seguintes, foi sucessivamente cônsul em Hamburgo, na Alemanha; secretário de embaixada em Bogotá, na Colômbia; chefe de gabinete do ministro João Neves da Fontoura (a quem viria a suceder, na ABL), e representante brasileiro em conferências de Paz e da Unesco, em Paris. Em 1951, voltou ao Brasil e foi nomeado novamente chefe de gabinete do chanceler João Neves da Fontoura, e depois chefe da Divisão de Orçamento (1953) e do Serviço de Demarcação de Fronteiras do Itamaraty.
Paralela à carreira de diplomata, a de escritor já lhe havia garantido lugar de destaque na literatura brasileira desde 1946, com a publicação do livro de contos Sagarana. As inovações na linguagem, a estrutura narrativa e a riqueza nos simbolismos são características que marcam o novo significado da temática regionalista na literatura brasileira, trazido pelos contos de Guimarães Rosa.
Em 1952, o escritor fez uma longa excursão pelo cerrado, que o colocou em contato com os cenários, os personagens e as histórias que ele iria recriar em sua obra-prima, o romance Grande Sertão: Veredas, lançado em 1956, juntamente com o ciclo novelesco Corpo de Baile. Indiscutivelmente um dos mais importantes textos da literatura brasileira e mundial, o livro foi o único brasileiro, entre obras de escritores de 54 países, a ser incluído em um ranking publicado em 2002 na Noruega dos 100 melhores romances do mundo.
Na tarefa de experimentar e recriar a linguagem literária, Guimarães Rosa inventou vocábulos, utilizou arcaísmos e palavras populares e recorreu a inovações semânticas e sintáticas. Primeiras Estórias (1962), Campo Geral (1964) e Tutaméia 0 Terceiras Estórias (1967) foram outras obras desse escritor universal, traduzido e publicado em diversas línguas, adaptado para o cinema e a televisão e detentor de vários prêmios literários.
(com Agência Brasil)