
A mãe, a pedagoga Carla Paiva Assis Bonfim, faz parte de um contingente cada vez maior de mulheres, das mais variadas formações, que viram no parto natural a melhor opção para o nascimento de seus filhos. Elas estão na contramão das estatísticas que apontam o excessivo número de cesarianas realizadas no Brasil. Dados do relatório de 2011 do Unicef mostram que, em 2013, o percentual de cesarianas ultrapassou os 40%. É muito além dos 15% considerados adequados pela Organização Mundial de Saúde.
No início da gestação, no que dependesse do pai, o engenheiro Marcelo Assis Bonfim, o nascimento de Helena engrossaria as estatísticas. "Eu achava parto natural uma violência. Além disso, queria um parto com hora marcada, sem surpresa, pegar o neném já bonitinho, arrumadinho. Acabei fazendo tudo diferente, até cortei o cordão umbilical e foi muito mais emocionante do que eu pensava", diz.
O receio citado pelo pai é justificado. No parto natural, a mãe sente as contrações sem receber anestesia. Também não há cortes, nem indução de dilatação. O organismo e o próprio bebê ditam a hora do nascimento. Isso pode ser rápido ou durar horas (há relatos de mães que ficaram por quatro horas em trabalho de parto, outras por até 12 horas). A mãe recebe o bebê em posição vertical, quase sentada, o que, segundo os médicos, facilita a descida da criança. Durante o trabalho de parto e no momento do nascimento em si, exercícios respiratórios e massagens auxiliam a mãe a manter a tranquilidade e sublimar a dor, na expectativa do grande momento.
Tudo fica por conta da natureza e quem conduz o processo é a própria mãe. Isso vai muito além de simplesmente escolher o local e que tipo de acompanhamento quer durante o parto. É a mulher que, sentindo as reações do próprio corpo, toma as rédeas do processo, combina o ritmo de respiração e contração, faz força em harmonia com as contrações e, principalmente, comunica-se emocionalmente com o bebê, deixando claro que está pronta para recebê-lo.
"No parto natural, a mulher é a protagonista", explica o obstetra Hemmerson Magioni, diretor técnico do Instituto Nascer, clínica de atendimento à gestante, em Belo Horizonte, que tem como foco o estímulo ao parto humanizado. A equipe da clínica realiza pelo menos 15 partos por mês e o índice de normais e naturais chega a 80%. Dr. Hemmerson é um grande defensor do parto natural, que é quase uma volta ao passado, com a diferença de que a mulher, hoje, tem opções e recebe toda a assistência de uma equipe multidisciplinar de médicos.

Mas não é apenas o controle da situação que leva a mãe a suportar a dor. O bem-estar da criança é outra grande, se não a maior, motivação. "É a criança escolhe o dia para nascer", diz a pediatra Maria Fernanda Giovanardi. "É fundamental respeitar o tempo do bebê, já que é nas últimas semanas de gestação que seu sistema respiratório se desenvolve por completo." Por isso, as chances de problemas respiratórios nos recém-nascidos são minimizadas, explica Maria Fernanda. Também porque a passagem pelo canal vaginal deixa o tórax da criança comprimido, o que faz com que o líquido de dentro do pulmão seja expelido com facilidade.
"Além disso, o corpo da criança é massageado ao passar pela pelve materna, fazendo com que ele fique relaxado e se acostume ao toque", diz. A liberação de hormônios como a oxitocina e a prolactina durante o trabalho de parto também favorece a descida do leite e, por consequência, a amamentação.
Por tudo isso, é fundamental a preparação emocional e física do casal. O engenheiro Marcelo Assis, pai da pequena Helena, por exemplo, que era contrário ao parto natural, a cada consulta pré-natal em que acompanhava sua mulher, Carla, ia recebendo informações sobre o processo natural de nascimento de um bebê. Ela, por sua vez, aprendia, na própria clínica, como fazer exercícios, tanto físicos quanto respiratórios, para preparar seu corpo para o grande dia.
A enfermeira Kércia Zimmerer Vieira Queiroz, antes de ter o primeiro filho, Rafael, hoje com 2 anos e 4 meses, tinha convicção de que o parto natural era a melhor escolha. Na última hora, não suportou a dor. "Acabei pedindo analgesia", conta. Faltaram preparação e tranquilidade, acredita Kércia. Muito diferente do nascimento do segundo filho, Miguel, que está com 5 meses e veio ao mundo conforme manda o figurino do parto natural. "Fico emocionada de lembrar", diz. "Tive sensações maravilhosas. Foi uma realização como mãe, como mulher."
Faz parte da preparação das gestantes a busca pelo conhecimento. Todas elas foram atrás de informações, pesquisaram, trocaram ideias com outras mulheres, antes de tomarem sua decisão. Para a psicóloga Daniela Bittar Silveira, que viveu na Austrália por dez anos, o parto natural era corriqueiro. "De volta, quando engravidei, era o que eu queria. Mas meu médico de então considerou que, pela idade – na época 35 anos –, não seria bom", conta. Inconformada, ela procurou outro médico. Conseguiu!

Alice, de 1 ano e 2 meses, também chegou ao mundo assim. A história aqui não foi diferente. A mãe, a engenheira de automação Geórgia Lacorte Alves Pessali, preocupou-se com o tipo de parto muito antes de engravidar. "Estudei muito e fiz a opção pelo parto natural. Mas eu percebia que minha médica não se mostrava muito interessada em estimular essa escolha. Procurei outro caminho", diz.
A obstetra Quésia Villamil, diretora do Instituto Nascer e integrante do corpo clínico do Mater Dei e do Vila da Serra, médica que acolheu Geórgia, conta que, apesar de a paciente se mostrar resistente à dor, a pedido da própria gestante, deixou um anestesista de sobreaviso. Não foi preciso. Com o apoio do marido, o engenheiro Dôglas Carasin Pessali, tudo correu como o esperado. "Se o Dôglas não estivesse comigo, acho que não conseguiria. Até quando ‘a gente’ começou a ter contração, ele contava os segundos", brinca.
A arquiteta Cristina Vaz Motta Miranda está tranquila para a chegada de Beatriz, marcada para maio. O primeiro filho, Bruno, de 2 anos e 7 meses, nasceu de parto normal. Na época, logo que começou a sentir as contrações, mesmo sem sentir dor, ela foi anestesiada. Desta vez, quer fazer diferente. Depois de se informar, conversar com outras mães em grupos da internet e ler muito, Cristina não tem dúvidas de que é melhor para mãe e bebê. "Estou confiante que vai ser natural e vou ter a sensação de ter contribuído ativamente para o nascimento de minha filha, além de tê-la logo juntinho de mim", diz Cristina.
Diferentemente do dito popular "Casa de ferreiro, espeto de pau", a obstetra Quésia Villamil não só estimula suas pacientes a optar pelo natural, como ela própria teve dessa forma seu segundo filho, Estevão, hoje com 2 meses. No nascimento de Paulo, hoje com 2 anos, ela pediu para ser anestesiada e o parto foi normal. "É preciso três coisas para a mulher dar conta do parto natural: o preparo físico, que dá maior resistência à dor; o preparo emocional, para saber como vai lidar com a dor; e o relacionamento com a doula", diz.
Doula, palavra de origem grega, significa "mulher que serve". No contexto do parto natural, as doulas trazem conforto para as mães. Elas não têm formação médica, mas integram a equipe que assiste o parto natural. E acabam fazendo mais que acompanhar. Elas escutam, orientam, sugerem leituras, dão colo para as mães. No momento do parto, esforçam-se para ajudar a tornar a dor mais suportável.

Foi por se encantar com a importância do trabalho das doulas que a jornalista Kalu Brum acabou se tornando uma delas, depois de passar pela experiência de ter o filho mediante parto natural. Paulistana, ela vem de uma família tradicionalmente praticante de cesarianas e por isso não encontrou apoio familiar. Em busca de realizar seu sonho, já próximo da data de ter o filho, mudou-se para Belo Horizonte, onde já morava seu hoje marido, Maurício Brum, depois de ter se informado de que aqui era local ideal para o procedimento. Encaminhada ao Hospital Sofia Feldman, lá comentou com a enfermeira que a recebeu que estava encantada com as instalações das salas preparadas especialmente para esse tipo de parto, pois lhe lembravam sua casa. "Foi então que Sybille, enfermeira obstétrica, me disse que era possível ter o bebê em casa", conta. E assim foi. Miguel, hoje com 7 anos, nasceu na casa em meio à mata de São Sebastião das Águas Claras (Macacos), Nova Lima, onde vivem até hoje.
A experiência foi tão marcante que, um ano depois, Kalu criou o blog Mamíferas, em que começou a escrever sobre as experiências de parto e maternidade. Em 2012, fez curso para se tornar doula e, de lá para cá, já participou de 95 partos, dos quais 70% foram totalmente naturais. Ela se orgulha.
Com tantas experiências positivas nesse tipo de procedimento, hoje cresce o número de mulheres que fazem a opção por esse método, considerado, de fato, humanizado. Grande parte prefere o nascimento na água. Em BH, hospitais como Santa Fé e Mater Dei também têm suítes especiais, com banheiras, onde a gestante pode ter seu bebê ou apenas momentos de relaxamento e alívio da dor, antes do parto.

Durante o trabalho de parto, a gestante entra numa banheira, com água morna, já quando as contrações estão mais frequentes e com dilatação do colo do útero acima de 5 cm. Segundo o obstetra Hemmerson Magioni, o relaxamento muscular profundo e o alívio das dores são as maiores vantagens. "Ocorre uma sensação de bem-estar, relaxamento mental e diminuição da ansiedade, com participação ativa da gestante no processo do nascimento", diz.
Porém, nem todas as mulheres podem fazer essa escolha. Hemmerson Magioni explica que casos de gravidez de alto risco, parto prematuro (inferior a 37 semanas de gestação), gestante com cesárea prévia, sinais de comprometimento do bebê no ventre são algumas contraindicações para o procedimento.
A Maternidade Santa Fé foi a primeira a atender a rede particular e convênios em Belo Horizonte nesse tipo de parto. A procura vem crescendo, porém o diretor do hospital, Clóvis Antônio Bacha, especialista em partos de alto risco, é outro que alerta que nem todas as mulheres podem ser encaminhadas para o parto natural. "Existem preceitos médicos e condições de normalidade que devem ser observadas para que o parto dito natural seja seguro", explica.
Segundo a obstetra Cláudia Navarro, terceira vice-presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, a autonomia da paciente para decidir o tipo de parto que quer ter deve ser levada em conta, desde que a escolha não comprometa a segurança da mãe ou do bebê. "O médico é a pessoa preparada para fazer essa avaliação", diz Cláudia.
De acordo com a obstetra, o CRM desaconselha o parto domiciliar, pois nessa situação não é possível socorrer eventuais intercorrências. O conselho defende uma equipe multidisciplinar, reunindo obstetra, pediatra e anestesista, e reconhece que o parto normal, quando não há contraindicação, é o melhor para mãe e filho. "Na opção normal, quando a mulher entra em trabalho de parto, significa que o bebê está maduro, está pronto para nascer. Além disso, o próprio trabalho de parto faz bem para a criança", explica.
O Hospital Vila da Serra e o Hospital da Unimed aderiram mais recentemente à instalação de suítes para parto natural, chamadas de PPP, para oferecer mais essa opção às gestantes. A preocupação de todos os hospitais é aliar, na medida exata, o acolhimento do "sentir-se em casa" à garantia dos recursos hospitalares mais seguros. Uma tranquilidade para que mamães e papais se preocupem apenas em viver intensamente esse momento sublime e incomparável.