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Estado de Minas RELIGIãO

"Em nome do pai e do filho"

Pode parecer estranho, mas os responsáveis pela paróquia Santa Edith Stein, celebrando missas e orientando os fiéis, são pai e filho e estão juntos há anos por determinação da Igreja


postado em 06/03/2014 14:49 / atualizado em 06/03/2014 15:17

O fato é inusitado na capital mineira e, se relatado para qualquer cristão que não seja paroquiano da Santa Edith Stein, no Sagrada Família, provoca surpresa e curiosidade. Os padres Hélio da Silveira e Paulo José Lopes da Silveira, responsáveis pela paróquia há mais de 12 anos, são, respectivamente, pai e filho. Os dois foram ordenados juntos, em maio de 2000, e desde então não mais se separaram por determinação do cardeal arcebispo emérito de Belo Horizonte, Dom Serafim Fernandes de Araújo. “Enquanto eu viver, vocês permanecerão juntos”, disse o chefe da Igreja em Minas naquela ocasião.

A liturga e ministra da eucaristia da paróquia, Maria da Consolação Vidigal, lembra-se da cerimônia de ordenação. “Não me esqueço das palavras do bispo. Ele disse que eles eram o pai e o filho e a comunidade era o Espírito Santo. E assim tem sido. A relação de ambos conosco é muito aberta. Fomos abençoados.”

Já a coordenadora do Conselho Pastoral Paroquial e também ministra da eucaristia, Elis Carayon Patruceli Ferreira Lage, não tem recordações da época. Ainda era criança quando a cerimônia ocorreu. Mas cresceu frequentando a paróquia e admira as ações dos padres. “Padre Paulo é muito jovem e inteligente. Surpreende por transmitir de forma muito clara a palavra de Deus. Já o padre Hélio é admirável pela devoção e pelo zelo.”

Elis conta que o parentesco deles já era conhecido da comunidade. Antes de serem ordenados, eram diáconos no bairro. O que poucos sabem é da história deles até a ordenação. Além de Paulo, Hélio tem outros cinco filhos – três homens e duas mulheres. Sempre foi um desapegado das coisas e muito religioso.

Quando o Concílio Vaticano II abriu as portas da Igreja para os ministros leigos, ele assumiu como ministro da eucaristia na primeira turma do Brasil. Isso ainda na década de 1960, em Serra do Salitre, uma cidade de pouco mais de 10 mil habitantes, no Alto Paranaíba. “Sempre fui muito fiel à vida da Igreja. Fiquei viúvo em 1993 e alimentei o sonho de entrar para um mosteiro de clausura”, contou o vigário.

A ideia não agradava. Especialmente a Mônica, uma das filhas de padre Hélio. “Mas tem de ser um mosteiro de clausura, pai? O senhor tem certeza que não vamos poder vê-lo nunca mais?”, indagou, na ocasião.

Diante da argumentação da filha e por intervenção de Maia, um padre lazarista (Congregação dos Vincentinos), Hélio abriu mão do mosteiro de clausura e se convenceu a entrar para o seminário no ano seguinte. Pela idade já avançada, Dom Serafim o dispensou de cursar filosofia. “Para mim, especificamente, não foi nenhuma surpresa a decisão dele, porque eu já sabia do seu desejo, já conhecia os diálogos dele com o padre Maia. Mas para o restante da família, foi uma surpresa, sim”, contou padre Paulo. “Ele sempre foi uma pessoa muito desprendida das coisas, acho que estava muito forte no coração dele”, acrescentou.

(foto: Caio Gomez/CB/D.A Press)
(foto: Caio Gomez/CB/D.A Press)
O caminho trilhado por padre Paulo até a ordenação é tão curioso quanto o de padre Hélio.  Apesar de ter sido criado sob os ensinamentos da Igreja em Serra do Salitre, o jovem Paulo se definia como “um ateu marxista chato”. Teve seus “rolos” na faculdade de história e jamais passava por sua cabeça virar um sacerdote. “Vim para BH em 1987 para estudar história antes de cursar filosofia e me declarava ateu marxista, mas acabei me convertendo dentro da própria faculdade. Tinha um professor da disciplina cultura religiosa que se chamava  José Fernandes. Foi por causa dele, dos ideais dele. E eu nem sabia que ele era padre. Só mais tarde, no fim do curso, eu fui descobrir”, contou.

Decidido a entrar para a Igreja, Paulo foi contar ao pai. “Para o padre Hélio foi uma redenção, porque eu era um ateu que queria convertê-lo ao contrário. Lembro-me de que estávamos tomando café em nosso apartamento, no Nova Suíssa, quando contei. Ele respondeu de forma acalentadora: ‘Filho, o que você decidir para a sua vida, eu apoio.’ E assim foi. Foi ele quem me levou para o seminário. E posso dizer com a mais pura sinceridade: sempre fui um filho muito rebelde e a Igreja nos aproximou, nos fez cúmplices”, afirma.

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