Em uma pequena gráfica ainda ativa nos fundos de uma residência de BH, máquinas com décadas de história relembram, semiadormecidas, uma época de ouro em que trabalhavam noite e dia para dar conta das encomendas. O personagem no cenário, agora silencioso, é um tipógrafo apaixonado pelo ofício de toda a sua vida; hoje quase extinto por um mercado dinâmico e impaciente demais para valorizar a arte minuciosa dos tipos móveis que deram origem a todo e qualquer impresso.
"O grande avanço da prensa de Gutenberg hoje é algo ultrapassado. Mas é só o que sei fazer e é o que vou continuar fazendo pelo resto da minha vida. Não existe um plano B para mim, que me sinto o 'último dos moicanos'", conta o belo-horizontino Ademir Matias de Almeida, que está oficialmente nessa profissão desde 1979 – antes, apenas ajudava o pai.
Para quem não sabe, ou é jovem demais, a tipografia era usada para se montar textos para serem impressos. Era a forma de "diagramar" as páginas antes da existência do computador e dos softwares de design.
Senhor das letras
Dezenas de gavetas guardam as pequenas fontes de ferro que serão montadas, uma a uma, no clichê para que, como um grande carimbo, o tipógrafo Ademir Matias de Almeida faça manualmente as impressões dos pedidos que chegam cada vez mais espaçadamente. O trabalhoso processo acaba tendo altos custos e demorados prazos de entrega, se comparado ao mercado gráfico atual; o que o torna cada vez menos atraente ao cliente, senão pelo imensurável valor artístico que traz consigo.
De uma família de pais e avós de mesmo ofício, Ademir é hoje um dos últimos tipógrafos de Belo Horizonte. Talvez um dos dois últimos, ele acredita. "Mas a coisa mudou muito rapidamente e o que não mudava há 50 ou até há 500 anos virou de pernas para o ar em cinco. Eu não percebi, tão confiante que estava", lembra o profissional de 67 anos, que desde os 10 trabalha nas máquinas que eram do pai.
Houve épocas áureas e muitos funcionários. Um deles trabalhou para a família por 30 anos e só saiu aposentado. Outros dois aprenderam o ofício, abriram sua própria gráfica e, quando os ventos viraram, migraram como todos para o processo gráfico moderno. Há cinco anos, Ademir é o único funcionário de seu próprio negócio e chega a passar até um mês sem serviço. "Tem sido muito difícil viver da profissão. Mas não apenas é tarde demais pra mudar, como eu não gostaria nunca de largar essa que é minha grande paixão. Sigo com ela até o fim", conta Ademir.
Para garantir que a tipografia sobreviva às novas mídias, periodicamente, o tipógrafo recebe pequenas turmas de alunos de design para um workshop, onde ensina um pouco do que sabe e incentiva os jovens a viverem um dia no ofício, semeando sua arte aos que cresceram em um mundo muito diferente do seu. O tipógrafo segue em sua oficina sem computadores, emails ou qualquer outra modernidade eletrônica.
(com Iepha/MG)
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