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Estado de Minas COMPORTAMENTO | EDUCAçãO

Disciplina com amor

Pais e especialistas discutem alternativas para educar e impor limites na medida para as crianças


postado em 06/08/2014 14:41 / atualizado em 08/08/2014 12:49

O casal Marco Paulo Denucci e Renata Viana faz questão de premiar as boas ações das filhas Mariana e Maria Cecília:
O casal Marco Paulo Denucci e Renata Viana faz questão de premiar as boas ações das filhas Mariana e Maria Cecília: "Acredito no reforço positivo", diz Renata (foto: Samuel Gê/Encontro)
Muitas questões angustiam os pais na tarefa diária de educar: o que devo fazer para o meu filho gostar mais de frutas? E se ele se envolver em brigas na escola? Como faço para ele não voltar a subir na cadeira ou colocar o dedo na tomada? Não são raros os momentos em que os pequenos fazem birra, são desobedientes e desafiam as ordens dadas. Paciência posta à prova, os pais precisam estar seguros para disciplinar, reforçando sua autoridade, mas sem fazê-lo de forma abusiva. Com o intuito de evitar castigos físicos e humilhações, a Lei da Palmada (como ficou conhecida) levantou, mesmo antes de entrar em vigor, em junho, nova discussão a respeito dos métodos educativos. Que bater não é o melhor caminho, não há dúvidas. Mas como impor limites e orientar o comportamento das crianças da forma correta?

Mariana Gois e Tiago de Freitas, pais de Caio e Maria, acham que a melhor estratégia é deixar que as crianças fiquem sozinhas por um tempo, para refletir sobre atitudes ruins: opção pelo cantinho do pensamento (foto: Gláucia Rodrigues/Encontro)
Mariana Gois e Tiago de Freitas, pais de Caio e Maria, acham que a melhor estratégia é deixar que as crianças fiquem sozinhas por um tempo, para refletir sobre atitudes ruins: opção pelo cantinho do pensamento (foto: Gláucia Rodrigues/Encontro)
Mariana Gois e Tiago de Freitas são pais de Maria, de 3 anos, e Caio, de 1. Eles são contrários a qualquer tipo de violência e acreditam que o recurso da agressão revela, na verdade, um despreparo dos pais. "Acho que a palmada surge em momentos de impaciência e cansaço, quando se quer resolver o problema rápido", diz a mãe, que é fisioterapeuta. A via do diálogo pode até ser mais trabalhosa, mas deve prevalecer desde cedo, defende Mariana. Recentemente, com a mais velha, os pais passaram a adotar o chamado "cantinho do pensamento", um local da casa onde a criança deve permanecer isolada por certo tempo, para refletir sobre o que fez. "Mas sempre converso com ela. Se ela não sabe por que está errada, perde o sentido", explica a mãe. O pai, engenheiro civil e empresário, também acrescenta que o recurso não é usado com caráter punitivo. "Tentamos não dar a cara de castigo. O ‘cantinho do pensamento’ constrange de uma forma positiva, pois ensina a criança a pensar e dá oportunidade para ela mudar e melhorar", diz.

Segundo Tiago, o casal também concorda em evitar ameaças e recompensas para educar os pequenos. "Damos doces à Maria, claro, com restrições. E tentamos não usar isso para barganhar algo", fala. Para o pai, o risco de se oferecer guloseimas em troca de alguma atitude é ajudar a criança a desenvolver maus hábitos alimentares, ao invés de já incentivá-los desde cedo a tomar gosto por frutas, legumes e verduras.

A pediatra Renata Viana, mãe de Maria Cecília, que completa 6 anos em setembro, e Mariana, de 1 ano e meio, também defende que a barganha não é a melhor medida, mas acredita que premiar boas ações ajuda a educar. "Não é bom se a criança age esperando algo em troca. Mas acredito no reforço positivo", diz Renata. Como explica,  esse reforço pode ser uma ação simples, como elogiar. O pai, o defensor público Marco Paulo Denucci, conta que também usa o "cantinho do pensamento" com a filha mais velha e que a estratégia tem sido cada vez menos necessária. "Acho que o ‘cantinho do pensamento’ dói até mais do que a palmada. A Ciça fica triste quando percebe que nos decepcionou. Da primeira vez, não levou muito a sério, mas depois passou a entender", diz.

O casal conta que um dos maiores problemas enfrentados em casa foi saber controlar o ciúmes de Ciça com a chegada de Mariana. "É uma diferença de quatro anos. Ciça passou muito tempo sendo filha única", diz a mãe.  "O primeiro filho perde a atenção exclusiva e o bebê requer mais atenção, por uma questão de segurança", explica. A solução, então, foi envolver a mais velha na tarefa de zelar pela menor. "Acho importante a criança se sentir participativa. Às vezes, quando estou dando banho na Mariana, finjo que esqueço a toalha e peço para Ciça ir buscar para mim", exemplifica Renata. Segundo ela, é preciso também reservar um tempo para cada filho. "Esses momentos particulares não precisam ser longos, mas de qualidade. Quando posso ficar com a Ciça, o momento é só dela", diz.

Separada do marido, a professora Agda Alves preocupa-se em manter a coerência na criação do filho, Henrique:
Separada do marido, a professora Agda Alves preocupa-se em manter a coerência na criação do filho, Henrique: "Seguimos a mesma linha, temos as mesmas ideias. Se o pai falou, não volto atrás" (foto: Gláucia Rodrigues/Encontro)
Para a psicóloga clínica Débora Galvani Klefens, as repreensões dadas pelos pais devem ser proporcionais à idade e à atitude da criança. Débora explica que crianças de até 3 anos não conseguem relativizar o tempo, portanto, devem ser repreendidas na hora. O interessante é abaixar-se na altura dos pequenos e usar postura e voz firmes para adverti-los.

Acima dos 3 anos, já há certa racionalização do pensamento e é fundamental o diálogo. No caso do "cantinho do pensamento", esse é um recurso que funciona caso a criança se sinta mal por aquilo que ela fez, pois o arrependimento a fará refletir. Mas a estratégia não pode ser banalizada, devendo ser usada apenas em situações relevantes. "A retirada de alguma situação ou objeto de que a criança goste pode ser usada, desde que não interfira em sua rotina escolar, o que envolve também outras atividades educacionais extraclasse, e em sua alimentação", afirma Débora. Sobretudo, é importante que os pais consigam sustentar as punições dadas, ou terão sua autoridade questionada. "Se você diz que seu filho ficará uma semana sem ver TV, ele não pode estar ao seu lado no dia seguinte vendo à novela", exemplifica.

Não perder a coerência foi uma das principais preocupações para Agda Alves e Weliton de Souza. Separados há três anos, eles são pais de Henrique, que completa 10 em outubro. "Seguimos a mesma linha, temos as mesmas ideias. Se o pai falou, não volto atrás. Tem de existir esse acordo, para que um não descredibilize o outro", diz Agda, que é professora de ciências do ensino fundamental. O menino mora com a mãe e passa os fins de semana com o pai, bancário. Segundo Agda, Henrique sempre foi tranquilo e obediente, mas, quando há excessos, a solução é  cortar algum jogo de que ele gosta ou não deixar que vá dormir na casa dos primos, por exemplo. "Faço isso para que ele entenda que suas atitudes têm consequências", diz a mãe.

Para a pediatra e psiquiatra da infância e adolescência Marília de Freitas Maakaroun, embora a palmada já tenha sido usada por pais e professores, não se justifica na atualidade, quando passamos a conhecer cada vez mais os melhores recursos educativos. "A criança que sofre maus-tratos aprende a violentar. Sabemos que o amor, através do cuidado, respeito e responsabilidade, constitui a melhor ferramenta na construção de relações humanas saudáveis", diz.

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