Quem nunca ouviu falar em fada-madrinha? Esse personagem mítico, comum nos "contos de fadas", aparece como uma figura mágica, dotada de poderes especiais usados em benefício de seus protegidos. O que, a princípio, parece pura fantasia, felizmente é uma realidade, validando o conceito do filósofo Aristóteles de que "a arte imita a vida", mesmo que para isso use e abuse da licença poética. Na vida real, no entanto, as fadas madrinhas não tem gênero nem super poderes e emergem de todas as classes sociais. Afinal, não é necessário ter muito para se fazer o bem. Para as madrinhas e padrinhos de animais vítimas do abandono e de maus-tratos, existem várias maneiras de ajudar, mesmo quando não se pode ou não se quer adotar um bichinho de estimação. A ajuda pode ser afetiva - com visitas periódicas a abrigos; financeira - por meio de pequenos valores mensais; com a prestação de algum serviço, como reparos e limpeza dos espaços; e até mesmo por meio da doação de produtos como medicamentos, ração e cobertores.
Foi essa iniciativa que tirou a cadelinha Mel, sem raça definida (SRD), das ruas. A boa ação só foi possível após ela ser resgatada pelo Projeto AuQueMia de Proteção Animal, em Nova Lima, e apadrinhada por cinco vizinhos amantes da causa animal. Eles se sensibilizaram ao saber que ela havia sido abandonada grávida, um dos momentos em que mais precisava de ajuda. Já com quatro cadelinhas resgatadas, e sem poder adotar mais uma, a psicóloga Zélia Pires da Silveira descobriu no apadrinhamento uma nova maneira de ajudar. "Para cuidar de tantos animais são necessários vários tipos de investimentos, como infraestrutura, alimentação, medicamentos e assistência veterinária. O apadrinhamento compartilhado é uma forma de ajudar quem está na linha de frente, abraçando essa causa tão sofrida", diz. A engenheira eletricista Andrea Romani Sofal também não resistiu ao charme de Melzinha. "O meu amor pelos animais vem da infância. Depois de adulta, tive a oportunidade de fazer quatro adoções", diz ela. "Hoje vejo no apadrinhamento uma forma de seguir ajudando."
Não fosse o trabalho de tantos voluntários que em seu anonimato fazem a diferença e ajudam a salvar inúmeras vidas, a situação desses animais seria ainda mais alarmante. Segundo levantamento do Instituto Pet Brasil (IPB), de 2018 para 2020, o número de animais em condição de vulnerabilidade (ACV) no país subiu de 3,9 milhões para 8,8 milhões. Um crescimento de 126%. A pesquisa considera como ACVs aqueles que vivem sob tutela das famílias classificadas abaixo da linha de pobreza, ou que vivem nas ruas, mas recebem cuidados de pessoas ao redor. Do total da população ACV, cães representam 69,4% (6,1 milhões), enquanto os gatos correspondem a 30,6% (2,7 milhões). O levantamento apontou ainda a existência de 400 ONGs atuando na proteção animal - em 2018 o número era de 370. Das entidades funcionando hoje, 45%, ou 180, estão na região Sudeste, seguida pelas regiões Sul (18%), Nordeste (18%), Norte (12%) e, por fim, Centro-Oeste (7%). Essas instituições tutelam mais de 184 mil animais. O estudo não contempla protetores independentes, que mesmo não sendo formalizados, resgatam inúmeros animais, assumindo todos os custos.
Muitos dos que acolhem esses animais, dando-lhes uma nova chance para viver, garantem que os bichos também os "salvam''. A aposentada Maria Cláudia Bertoldo de Araújo encontrou no cachorro Benjamim, SRD, o conforto necessário para superar a perda de sua mãe. "Sem ele seria mais difícil seguir com a vida". Após sua adoção, conheceu a ONG Cão Viver e passou a apadrinhar vários animais. "Faz bem para eles e para a gente. Você pode visitar, passear, levar petiscos e ver todo o seu desenvolvimento. Quando são adotados é uma alegria imensa", diz. O exemplo foi seguido pela médica Lélia Maria de Almeida Carvalho. Apaixonada por gatos - possui cinco em casa - passou a auxiliar a ONG Gato Uai, fundada por uma colega de profissão. "É preciso conscientizar sobre o respeito e cuidado que os animais merecem enquanto seres vivos e sencientes que são."
Por meio do apadrinhamento, projetos de proteção animal recebem suporte para seguir dando abrigo, mitigando a fome e tratando doenças de milhares de vidas. Muitas delas encaminhadas a lares amorosos através da adoção responsável. Em se tratando de animais silvestres, a maioria é proveniente do contrabando, e após serem resgatados e cuidados, aqueles que não possuem sequelas são reintroduzidos na natureza. O trabalho é realizado por clínicas autorizadas pelos órgãos de proteção ambiental e da fauna, com o apoio de voluntários. "Em casa tenho cães, gatos, passarinhos e peixe. E também ajudo a cuidar de cinco gambás deficientes resgatados pela ONG Asas e Amigos", diz a empresária Joyce de Paula, dona da ChefUonka's, confeitaria pet. Para essas "fadas madrinhas", não se trata de não ajudar "humanos" mas, sim, de não ignorar a importância e sofrimento de outras espécies.
Dicas para apadrinhar um animal
- Ao optar por apadrinhar um animal resgatado, busque indicações da ONG ou protetor independente que o abriga
- Visite o espaço onde os animais vivem e verifique se os recursos recebidos são, de fato, destinados ao seu bem-estar
- Faça visitas periódicas e observe a higiene do local e dos animais, se possuem espaço e alimentação adequada, e se eles se sentem seguros e felizes no ambiente
- A ajuda pode ser afetiva - com visitas periódicas a abrigos; financeira - por meio de doação mensal; com a prestação de algum serviço, como reparos e limpeza dos espaços; e até mesmo por meio da doação de produtos como medicamentos, ração e cobertores