
Mesmo morando em casas separadas, Clara e Lucas construíram um modelo de convivência que prioriza o bem-estar dos animais e o respeito mútuo. Ele se mudou para uma casa próxima à dela, e os dois passaram a ter a guarda compartilhada dos animais. Assim, Babu e Leroy passam 15 dias na casa de cada um dos tutores. Quando um precisa viajar, a responsabilidade pelo cuidado fica com o outro. Caso ambos estejam ausentes, os pets ficam hospedados em uma creche especializada. Além do tempo, as despesas também são divididas igualmente: ração, veterinário, banho e cuidados diversos.

Segundo ele, o Projeto de Lei 4/2025, previsto na reforma do Código Civil, inclui modificações em relação à natureza jurídica dos animais, sendo três temas centrais: o “Reconhecimento do vínculo afetivo”, por meio de um artigo que passaria a reconhecer o afeto entre humanos e animais como parte dos direitos da personalidade humana; a constituição da “Família multiespécie", que passaria a prever a guarda compartilhada, o direito de visitas e a divisão de despesas com os animais após a separação conjugal; e o reconhecimento dos “Animais como seres vivos sencientes”, sujeitos a um regime jurídico próprio, a ser regulamentado por lei federal. A proposta de reforma abrange todos os animais e não apenas cães e gatos. “É um avanço importante porque rompe com a ideia de que os animais são meramente bens móveis”, explica Vicente.
Desafios e contradições
Apesar do progresso, especialistas apontam dois pontos problemáticos no texto. O primeiro é a localização considerada inadequada no código, tendo em vista que exatamente o artigo que trata os animais como seres vivos sencientes está inserido no Livro dos Bens, o que ainda sugere que os bichos são propriedade. E o segundo ponto é o regime jurídico subsidiário, ou seja, até que um Estatuto dos Animais seja aprovado, os animais seguirão sujeitos à legislação dos bens. Para Vicente, isso enfraquece a proposta. “Por isso, propus que os animais fossem enquadrados como entes despersonificados, como o nascituro, sujeito de direitos, ainda que sem personalidade jurídica”, argumenta.

Mesmo diante do conservadorismo no Congresso, os especialistas apontam avanços recentes, como a aprovação da Lei Sansão, a proibição de testes com cosméticos em animais e o Sistema do Cadastro Nacional de Animais Domésticos. Para a professora de balé Laysa Leão, a tentativa de ver sua cadelinha reconhecida como sujeito de direito pela Justiça terminou em frustração. O caso ocorreu em Belo Horizonte e exemplifica os obstáculos que ainda existem no Judiciário. A lhasa apso Mel, de 10 anos, teve uma fratura grave na articulação coxofemoral quando era filhote. Em 2019, foi levada a um pet shop para banho e acabou cruzando com outro cão, sem autorização da tutora. Além de cinco filhotes, o resultado foi uma gestação de alto risco, que agravou sua condição física e lhe deixou com sequelas permanentes.


O que a mudança no Código Civil propõe para os pets
- Reconhecimento do vínculo afetivo – Art. 19: Afeto entre humanos e animais como parte dos direitos da personalidade.%u2028%u2028%u2028
- Família multiespécie – Art. 1.566, §3º: Guarda compartilhada, direito de visitas e divisão de despesas após separações.%u2028%u2028%u2028
- Animais como seres sencientes – Novo Art. 91-A: Reconhecimento de que animais não são bens, mas seres com sentimentos.%u2028
Pontos problemáticos identificados - Localização inadequada no Código: O art. 91-A segue inserido no Livro dos Bens, o que contradiz o objetivo.%u2028%u2028%u2028
- Regime jurídico subsidiário: Enquanto não houver o Estatuto dos Animais, eles seguirão sendo tratados como bens.%u2028