Em julho de 1979, o Estádio Governador Magalhães Pinto, nosso Mineirão, presenciou algo tão ou mais impactante que um clássico entre Atlético e Cruzeiro. Dessa vez, o marco histórico ocorreu no estacionamento do Gigante da Pampulha, onde foi apresentado o primeiro carro movido a álcool do mundo. O modelo escolhido para receber a inovação foi o Fiat 147, primeiro automóvel produzido pela marca no Brasil, inspirado no 127 italiano. Carinhosamente apelidado de "cachacinha", o veículo arrojado para a época foi um divisor de águas no mercado automobilístico nacional e na vida de muitos brasileiros. Um deles foi o empresário Marco Aurélio Gonçalves Nazaré, fundador da MM Aluguel de Carros, cuja sede fica na cidade de Itaúna, a aproximadamente 80 quilômetros da capital mineira. Em 1982, aos 24 anos de idade, Marco Aurélio ouviu de sua então namorada, Meliza (que viria a se tornar sua mulher), que ela tinha o desejo de trabalhar no comércio. Ao se deparar com o anúncio da venda de uma loja, a Maria Maria Presentes, ele se lembrou das palavras da amada e correu para saber o valor da empreitada. "O proprietário tinha interesse de vender e eu, de comprar", conta. "Faltava o principal: dinheiro." Aí que o Fiat 147 fez diferença na vida de Marco Aurélio e Meliza. "Eu havia estacionado o carro na porta da loja e ofereci como parte do pagamento." O dono topou, mas como o automóvel valia metade do valor pedido, faltava a outra metade, que foi dividida em várias vezes. "Ele me apresentou o balanço escrito numa folha de papel almaço e perguntou se eu queria conferir o estoque, para ver se estava tudo certo", diz. "Falei que não seria necessário, porque era amigo do meu pai e certamente de confiança."
O tino apurado para os negócios, a seriedade e o jeito decidido foram fundamentais para a trajetória de Marco Aurélio. E acompanham o empresário até os dias de hoje. Após a compra da loja de roupas, ele contatou a namorada e contou que ela deveria assumir naquele mesmo dia. "Avisei o tio dela, com quem ela morava, que tinha comprado e ele perguntou se eu era doido. Mas eu precisava de capital de giro e ele acabou entrando como sócio. As parcelas, pagamos todas." Em 1983, os jovens se casaram. "O Marco sempre foi hiperativo e dinâmico mas, acima de tudo, muito correto", diz Meliza. Enquanto a mulher cuidava da loja, Marco Aurélio, que é formado em engenharia mecânica, econômica, de segurança e administração com foco em gestão financeira, seguia com sua carreira na indústria metalúrgica. "Estudei muito por necessidade. Sempre quis empreender." Iniciou como estagiário em 1979, aos 21 anos de idade, e aos poucos foi galgando degraus, assumindo como gerente responsável por manutenção, qualidade e produção, até chegar a gerente geral da antiga Fundição Aldebara. "Emprego mesmo eu tive apenas um em toda a minha vida. Aos 24 anos, tinha 380 pessoas sob minha responsabilidade", afirma. Em outubro de 1986, pediu demissão. Apesar de determinado em seguir novos rumos profissionais, aceitou a proposta de continuar na empresa como consultor. Antes disso, em 1983, recebeu o recado de um vizinho da loja Maria Maria. O português, dono do comércio, queria se desfazer do negócio e logo pensou no empresário. "A loja dele era de louças e eu não tinha interesse no ramo. No final, ele ficou com as louças e eu, com a loja." Ligeiro, avisou seu sócio da nova aquisição e disse que iam se mudar para o novo espaço, cinco vezes maior que o anterior. "Coisas assim, se você der tempo, perde o negócio", diz. No final de 1986, abriu sua segunda loja em parceria com um de seus irmãos, desta vez no ramo de calçados femininos. Em 1987, saiu definitivamente da indústria, deixando de dar consultoria em empresas da região. Pouco tempo depois, entre 1988 e 1989, abriu outras duas lojas nos ramos de confecção, cama, mesa, banho e infantojuvenil. E foi em 1990, que Marco Aurélio expandiu suas atividades para o setor que é um dos carros-chefes do grupo MM: revenda de automóveis. "Quando meu pai começou o negócio de carros em Itaúna, tinha apenas quatro veículos", afirma Rodrigo Reda Gonçalves, de 38 anos, filho de Marco Aurélio e diretor de negócios da MM. "Na nossa primeira loja fazíamos todo tipo de negócio. Trocamos carros em imóveis e até em vaca", lembra Marco Aurélio.
Cinco anos depois, Marco Aurélio comprou uma franquia do grupo Localiza, de locação de veículos, e chegou a ter cinco agências distribuídas na região central do estado, nas cidades de Itaúna, Pará de Minas, Nova Serrana, Bom Despacho e Divinópolis. Em agosto de 2019, o contrato foi encerrado. Após dois anos tendo de cumprir uma cláusula de não concorrência, a MM passou a atender empresas em todo o território nacional. Como franqueada, a MM tinha dois limitadores para crescer: a atuação em uma determinada região e o atendimento voltado para o varejo. "Optamos por sair justamente por não conseguirmos ficar com o crescimento limitado. Fora isso, o nosso negócio sempre atuou no mercado corporativo, atendendo a grandes empresas", diz Rodrigo. Com mais autonomia, a MM viu o tamanho de sua frota aumentar cinco vezes. A empresa trabalha com locações diárias, por assinatura (com período mínimo de 12 meses) e a terceirização de frotas, em que, além do aluguel, a proprietária dos veículos agrega serviços de acordo com a necessidade do cliente, como manutenção preventiva e corretiva, assistência 24 horas e gestão de multas.
Rodrigo teve papel fundamental na expansão da MM. Após terminar a faculdade de administração no Ibmec, em Belo Horizonte, ele trabalhou por dois anos como trainee na ArcelorMittal, até retornar para Itaúna em 2008 e assumir os negócios ao lado de Marco Aurélio. "Nessa época, meu pai tocava tudo sozinho, comercial, atendimento, operações", conta. "Quando voltei para cá, fui para o operacional, lavei carro, passei por todos os setores e estamos até hoje juntos." Para Rodrigo, agregar a experiência do pai no mercado com os conhecimentos que ele adquiriu fora, colocando em prática a adoção de novos métodos, impulsionou o crescimento. "Eu cheguei com uma nova visão. Trouxe um novo sistema de gestão e marketing e novas parcerias, sempre com foco no mercado corporativo." Desde a separação da franqueadora, a MM alcançou um crescimento médio de 25% ao ano, buscando sempre uma expansão orgânica. O crescimento nos próximos anos, diz Rodrigo, deve ocorrer por meio de aquisições de outras empresas do ramo. "Somos compradores", afirma Marco Aurélio, que também garante: "Nunca tive a pretensão de concorrer com a franqueadora. O nosso objetivo é ocupar os espaços deixados no mercado pelas empresas maiores. O nosso negócio não é preço e, sim, construção de relacionamento a longo prazo." Na semana em que a reportagem de Encontro o entrevistou, ele se preparava para passar alguns dias fora da sede, em viagem, junto de seu gerente de vendas, para visitar a clientela. "O meu foco é a paixão pelo cliente. Acredito que a gente arrasta pelo exemplo." Os números comprovam a eficácia de seu sistema de gestão. Enquanto as grandes empresas do ramo têm média de 50% a 60% de renovação de contrato, a MM mantém a taxa de fidelização em 95% e um ticket médio maior do que o de outras locadoras que atuam no mercado brasileiro.
Para tornar a marca ainda mais conhecida, Rodrigo trouxe a ideia de unir a paixão por carros com a paixão por futebol, levando a MM a patrocinar grandes clubes. O primeiro foi o Atlético Mineiro, agremiação de coração de Rodrigo. A empresa assina as costas da camisa de treino do Galo e faz a gestão de toda a frota do clube. Em seguida vieram Cruzeiro, América, Athletic e Botafogo, do Rio de Janeiro. A MM patrocina também a casa do Galo, a Arena MRV, e cederá todos os veículos usados na operação do estádio, além de quadriciclos para ronda de seguranças, carrinhos de golfe para transporte interno e carro-maca. Entre as contrapartidas, irá instalar uma loja-conceito na arena do bairro Califórnia. A empresa também patrocina alguns jogadores, a exemplo dos craques Hulk, Hyoran e Guilherme Arana.
No final de março, a MM inaugurou sua nova sede, com projeto da arquiteta Fernanda Villefort. Segundo Marco Aurélio, a abertura materializa essa mudança de fase da empresa. O espaço anterior, de 600 metros quadrados, foi substituído por um prédio de 4,5 mil metros quadrados, no bairro Fazenda da Chácara, onde o cheiro de construção nova e a arquitetura moderna refletem o empreendedorismo dos donos. "Agora estamos todos reunidos - são 120 funcionários -, em maior sinergia, com ambiente adequado e construído para isso", diz o empresário. Além dos carros, um acervo raro faz acelerar o coração de qualquer torcedor atleticano. Rodrigo transferiu para a sede sua coleção com mais de 1,2 mil camisas e fez um museu aberto ao público. A imensa maioria é do Galo, com destaque para uma usada por Dadá Maravilha nos jogos entre 1969 e 1970, além de camisas históricas de Reinaldo, Éder Aleixo, Taffarel, João Leite…, e do elenco completo da conquista da Libertadores e de todas as partidas do Atlético no Brasileirão e na Copa do Brasil de 2021.
O grupo MM conta ainda com uma loja de seminovos e duas lojas Maria Maria, de confecção e acessórios femininos e masculinos, geridas pela administradora Fernanda Reda Gonçalves, de 36 anos, que também é diretora e responsável pelas partes administrativa, financeira, contábil e de departamento de pessoal da empresa. "Costumo dizer que na nossa família a venda está no DNA. Cada um tem expertise em uma área e a nossa força é um complementar o outro". A filha mais nova de Marco Aurélio e Meliza também se formou no Ibmec, em Belo Horizonte. Antes de assumir a gestão da MM ao lado do pai e do irmão, trabalhou por cinco anos na multinacional Deloitte, uma das maiores empresas de auditoria e consultoria do mundo, com escritórios em mais de 150 países.
Com o aumento nos preços dos veículos e a taxa de juros em patamar altíssimo (o que dificulta o financiamento), o mercado de locação de veículos está em um momento de retomada. De acordo com dados da Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (Abla), em 2022 as locadoras investiram mais de 55 bilhões de reais em carros novos, o que corresponde a 30% de todos os gastos em automóveis e utilitários leves zero quilômetros no país. No ano passado, o setor adquiriu 590 mil veículos, um salto de 33,6% em relação às compras feitas em 2021. Com esses números em mente, Marco Aurélio caminha por entre os carros antigos em exposição na frente da nova sede da MM e pensa nas próximas ações da empresa. Estão alinhados ali um Ford Fairlane 1960, um Chevrolet Corvette 1985 e dois jipes Willys, um modelo Overland, de 1942, e outro de 1949. E fica ali também, em posto de honra, um Fiat 147, igualzinho àquele que marcou o início empreendedor de Marco Aurélio, há mais de 40 anos.