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Estado de Minas ANIVERSÁRIO

Lançado em 1979, Fiat 147 completa 40 anos

Com o apelido "cachacinha" devido ao odor característico de álcool exalado pelo escapamento, o carro simbolizou um marco importante para a engenharia automotiva brasileira


postado em 05/07/2019 16:51 / atualizado em 05/07/2019 17:04

Fiat colocou na pista de testes da fábrica de Betim um carro do primeiro lote dos 147 a álcool lançados há 40 anos(foto: Leo Lara/divulgação)
Fiat colocou na pista de testes da fábrica de Betim um carro do primeiro lote dos 147 a álcool lançados há 40 anos (foto: Leo Lara/divulgação)
Quem diria! Lá se vão 40 anos desde que foi lançado o primeiro carro com motor movido a etanol. Foi em 5 de julho de 1979 que a Fiat ousou ser a primeira a colocar no mercado o 147 propulsionado pelo biocombustível derivado da cana-de-açúcar. De lá para cá muita água passou debaixo da ponte, o etanol teve altos e baixos na preferência do consumidor e a tecnologia evoluiu, solucionando inúmeros problemas técnicos e até econômicos em torno do criativo e polêmico combustível.

São três os momentos do etanol como combustível automotivo nesses 40 anos, relata João Irineu, diretor de assuntos regulatórios e compliance da FCA. O primeiro é marcado pela busca de um combustível alternativo à gasolina, impulsionada também pela crise do petróleo, que marcou o final da década de 1970 e início dos anos 1980 do século passado.

(foto: Leo Lara/Divulgação)
(foto: Leo Lara/Divulgação)
O segundo momento passa pelo trabalho de correções técnicas e adaptações dos componentes para o novo combustível e pelo esforço para se obter um equilíbrio de preço e oferta. O consumo mais elevado exigia preço inferior ao da gasolina e a oferta nas bombas não poderia faltar. Quem não se lembra da falta generalizada do álcool combustível (que hoje chamamos de etanol) ocorrida nos primeiros anos da década de 1980 e das enormes filas nos postos de combustível de consumidores irados e arrependidos por haverem acreditado e apostado nos "carros a álcool". Diante da alta de preço do açúcar no mercado internacional, os usineiros reduziram a produção do etanol e elevaram a de açúcar, ocasionando queda drástica na oferta do biocombustível e consequente elevação de preço. O seja, o Proálcool ficou inviável e caiu em descrédito. Ninguém mais queria um carro a álcool.

O governador de Minas Gerais, Francelino Pereria (à esq.), e o presidente da Fiat, Miguel Augusto Gonçalves de Souza: lançamento da novidade foi cheio de pompa e circunstância(foto: Fiat/Acervo)
O governador de Minas Gerais, Francelino Pereria (à esq.), e o presidente da Fiat, Miguel Augusto Gonçalves de Souza: lançamento da novidade foi cheio de pompa e circunstância (foto: Fiat/Acervo)
Hoje, estamos no terceiro momento, que surgiu a partir da evolução dos motores com a tecnologia flex, que permite o uso combinado em qualquer quantidade de etanol ou gasolina, eliminando pela raiz o risco da baixa oferta do combustível.

Para marcar as quatro décadas de existência, a Fiat colocou na pista de testes da fábrica de Betim nada menos que uma unidade do primeiro lote dos 147 a álcool daquele mês de julho, exatamente como há 40 anos. O exemplar raro - que na época foi vendido para o Ministério da Fazenda, de Brasília - faz parte do acervo de clássicos da Fiat e está praticamente original, sem restauração. "É emocionante ver esse carro de perto não só pela importância de ser realmente o primeiro Fiat 147 a etanol, mas também por estar funcionando perfeitamente com todos os elementos de época originais, como partida a frio e afogador, além de preservar a tampa vermelha do motor e a pintura original", afirma Robson Cotta, gerente de Engenharia Experimental da Fiat Chrysler Automóveis (FCA). Na Fiat desde o início da década de 1980, Cotta tem muitos motivos para se lembrar do "Cachacinha". "O primeiro veículo zero km que eu comprei foi um Fiat 147 a etanol."

A história do Fiat 147 a etanol começou em 1976, quando as pesquisas e desenvolvimento do motor movido com o derivado da cana-de-açúcar começaram. "Vivíamos a era do Proálcool, um programa nacional para combater a crise do petróleo", lembra Robson Cotta. Ainda em 1976, em sua primeira participação no Salão do Automóvel de São Paulo, a Fiat expôs um protótipo do 147 a etanol.

O sistema tinha vantagens, mas também problemas: falta de álcool combustível nos primeiros anos da década de 1980 gerou corrida aos postos(foto: Fiat/Acervo)
O sistema tinha vantagens, mas também problemas: falta de álcool combustível nos primeiros anos da década de 1980 gerou corrida aos postos (foto: Fiat/Acervo)
Em 1978, a empresa desenvolveu o motor 1.3 de 62 cv de potência e 11,5 kgfm de torque que acabou mostrando-se mais adequado para o uso do etanol que o propulsor a gasolina de 1.050 cm3, até então utilizado no 147. No início daquele ano, três Fiat 147 a etanol foram entregues ao DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem) para serem experimentados no policiamento da Ponte Rio-Niterói. Em setembro de 1978, um Fiat 147 realizou o que viria a ser o teste definitivo para criação do primeiro motor brasileiro 100% a etanol: uma viagem de 12 dias e 6.800 km de extensão pelo país, percorrendo cerca de 500 km por dia, 3 mil km por vias de terra e variações climáticas de mais de 30 graus.

Entre os diferenciais, a taxa de compressão do motor 1.3 foi elevada, de 7,5:1 da versão a gasolina para 11,2:1, e a carburação passou a trabalhar com mistura ar-combustível mais rica (com maior percentual de combustível). Essa era a razão de seu maior consumo - 30% mais alto. "O propulsor ficou com potência pouco maior que a do similar a gasolina, devido à necessidade de conter o consumo: 62 cv brutos contra 61. Por outro lado, a taxa de compressão mais alta favorecia o torque e, portanto, as retomadas e acelerações em baixa ou média rotação", dataca Cotta. "Mas o número que realmente importava era o custo por quilômetro rodado, menos da metade da versão a gasolina, com os preços dos combustíveis na época." De 1979 a 1987, período em que foi comercializado no Brasil, foram vendidas 120.516 unidades do Fiat 147 movido a etanol.

Supervisor de Engenharia de Produto da FCA, Ronaldo Ávila, que na década de 1980 trabalhava no laboratório químico da montadora, acompanhou os aperfeiçoamentos do 147 a etanol. "Minha equipe analisava as peças dos motores. No início havia oxidação dos componentes. Para que viesse a funcionar com o etanol, o sistema de alimentação como um todo [tanque de combustível, bomba, tubulações, carburador, etc.] precisou ser mais resistente para suportar um combustível extremamente corrosivo", conta. A solução encontrada para proteger as peças do motor foi o uso de níquel químico, que cria uma camada de proteção nos componentes, inibindo as ações do etanol. Outra providência foi a instalação do conjunto de escapamento aluminizado.

Robson Cotta, gerente de Engenharia Experimental da FCA, com o projeto do automóvel:
Robson Cotta, gerente de Engenharia Experimental da FCA, com o projeto do automóvel: "O primeiro veículo zero km que eu comprei foi um 147 a álcool" (foto: Leo Lara/Divulgação)
Por ser o pioneiro entre os carros a etanol, o Fiat 147 foi também o primeiro a encarar algumas características do combustível, como o baixo poder calorífico em relação à gasolina. Na prática, isso significava a maior dificuldade para dar a partida no motor em dias frios. "Para resolver esse problema, a engenharia instalou o reservatório de partida a frio. Um botão no painel do carro aciona uma bombinha igual à do lavador do para-brisa e ela injeta no coletor de admissão uma quantidade de gasolina suficiente para dar a partida, principalmente em baixas temperaturas", detalha Cotta.

"Na época do 147, o sistema de injeção de combustível era o carburador, que de início não tinha um tratamento tão eficaz para conter a corrosão do etanol. Passamos a adotar materiais que protegessem o componente, mas ao mesmo tempo trabalhamos para atingir um outro nível tecnológico, que passaria pelo carburador duplo até chegar à injeção eletrônica", lembra Ronaldo Ávila. Foi justamente a tecnologia do carburador duplo que, no início dos anos 1990 trouxe mais um feito histórico para a marca: o carro 1.0 mais rápido e veloz do mundo, o Uno Mille Brio. A evolução do sistema de injeção melhorou a mistura de ar e combustível nos motores. Com isso, houve ganhos significativos de desempenho e, ao mesmo tempo, redução de consumo. Hoje, o tanquinho de partida a frio está no museu graças ao sistema de pré-aquecimento dos bicos injetores.

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