Elionice Silva
A leitura abre fronteiras para o pensamento, criando mais condições para as crianças explorarem a realidade e as próprias fantasias. A força desse hábito é visível em crianças campeãs de leitura no projeto Ler é Viver, mantido pelo Instituto Gil Nogueira. Juliana Ribeiro Fonseca, de 13 anos, acaba de escrever um roteiro para um curta- -metragem. Passou a ser leitora ávida a partir de 2010, quando ainda estava no 4º ano do ensino fundamental. "Antes, eu tinha preguiça de ler. Depois passei a ler pelo prêmio e comecei a ler de verdade, sem me preocupar com o prêmio", conta. O futuro para a menina se reconfigurou no contato com o mundo das letras: quer estudar música, cinema e literatura. Tiago Luiz Martins Oliveira, de 10 anos, ainda se lembra da mochila com o nome do Instituto Gil Nogueira gravado, quando se consagrou campeão de leitura. "Pouca gente tem uma, igual”, brinca. Ele conta que lê muito. Mas história em quadrinhos não é mais divertido? “Desenho repete muito, cada história que leio é diferente e ainda posso imaginar outras coisas", diz.
Satisfeita com os resultados, a empresária Patrícia Nogueira, presidente do Instituto Gil Nogueira, acompanha de perto as crianças que apoia com o projeto Ler é Viver. Psicóloga de formação, ela optou por se dedicar à administração do instituto e sabe que sua visão empreendedora é fundamental para a vitalidade do projeto. Patrícia mobiliza empresários e pessoas físicas que apoiam o projeto financeiramente e que, neste ano, custará R$ 900 mil para ser mantido. "Sempre trabalhamos com os recursos em caixa assegurados para o ano seguinte", conta.
Em 2013, o Ler é Viver incentiva o hábito da leitura em salas de aulas de 16 escolas da capital mineira, num total de 5.300 de estudantes do 1º ao 5º ano do ensino fundamental. A cada semestre, 50 livros são entregues aos alunos de cada escola, que os leem monitorados pelas professoras. Por ter metas e critérios pedagógicos definidos e respeitados, o projeto é parceiro da Secretaria de Estado de Educação e começa a sair das fronteiras de BH com a entrada, neste ano, em cinco escolas de Montes Claros por meio de patrocínio da Petrobras. A gerente de marketing do ViaShopping Barreiro, Ana Flávia Salles, um dos parceiros do Ler é Viver, que adotou duas escolas no bairro da região Oeste da capital, diz que é preciso investir em projetos que valorizem a comunidade.
É exemplo disso a atuação da empresa de logística VLI, que patrocina a mostra Encontro Marcado com Fernando Sabino, em cartaz no Boulevard Shopping. Do cardápio de atividades constam cinema, literatura, grafite e história da ferrovia, além de instruções sobre segurança ligada às linhas férreas. A mostra itinerante já passou por 40 cidades em Minas e foi visitada por cerca de 400 mil crianças e jovens. "Como toda ação social, o projeto foi ganhando maior aderência à medida que os resultados foram aparecendo e mais escolas puderam conhecer e participar", explica Silvana Alcântara, gerente de relações institucionais e com comunidades da VLI.
Há 10 anos, a Usiminas oferece cursos de formação em arte-educação para professores, artistas e estudantes em 26 municípios do chamado Colar Metropolitano do Vale do Aço. Mas que ninguém considere simples a tarefa de facilitar o acesso aos bens culturais: "Nosso maior desafio continua sendo tirar os jovens e suas famílias de dentro de casa para esse mundo da cultura. Depois de conhecê-lo, eles não querem mais largar", afirma Mariana Martins, diretora da área de desenvolvimento social da Usiminas, responsável pelo Instituto Cultural.
A secretária de Estado de Educação, Ana Lúcia Gazolla, considera positivo o movimento pela educação e pela cultura. "O que essas entidades fazem é fundamental, porque estão formando público e criando condições para o bom consumo cultural", aponta. Segundo ela, é o Estado o responsável pelo letramento – a aquisição da capacidade de leitura objetivamente mensurada. Ou seja, a criança precisa entender o que leu, responder sobre o que leu, fazer interpretação da mensagem e identificar o tipo de texto lido. "O letramento é o treinamento que desenvolve essas capacidades e que deve ser realizado entre os 6 e os 8 anos de idade. É o que estamos fazendo, por meio de política pública, com o Programa de Intervenção Pedagógica nas mais de 20 mil escolas públicas de Minas Gerais", explica.
A onda que leva empresas a investirem na aquisição do hábito de leitura também faz adeptos entre pessoas físicas, como a professora Morgana Brandão, da rede municipal de ensino de Belo Horizonte. Professora de canto-coral desde 2007, ela ficou fascinada com o interesse das crianças em aprender suas composições, que falam do cotidiano escolar. As letras musicadas passaram a ser trabalhadas em sessões de leitura, contribuindo para a evolução dos alunos. "Percebi que eles se envolviam e os que tinham dificuldade em ler ficaram mais seguros por causa da música", conta.
Diante da constatação, Morgana não teve mais dúvida: lançou mão de recursos próprios, cerca de R$ 15 mil, para publicar o livro Ler e Cantar. A obra teve apoio da Fundação Municipal de Cultura de BH na divulgação e vem com partituras e CDs de áudio.