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Estado de Minas CULTURA

Artista plástico mineiro leva poesia para espaços públicos

Em um encontro improvável entre a estrutura clássica da letra, a arte de rua e o picho, Felipe Fernandes espalha sua marca nas ruas


postado em 27/07/2022 21:08 / atualizado em 28/07/2022 19:27

Para Felipe Fernandes, mais conhecido como Pura Poesia, a caligrafia é o estudo do gesto, uma coreografia da mão:
Para Felipe Fernandes, mais conhecido como Pura Poesia, a caligrafia é o estudo do gesto, uma coreografia da mão: "Fui estudar a construção do significado através da junção de cada letrinha até a formação das palavras para encontrar minha identidade artística" (foto: Pádua de Carvalho/Encontro)
"Na arte, eu sou autodidata", diz Felipe Fernandes, de 48 anos, artista plástico e publicitário por formação. Nas ruas e no mundo artístico é conhecido por um codinome bem peculiar: Pura Poesia. Para ele, a caligrafia é quase um sacerdócio, praticada diariamente para não perder sua originalidade. É por meio dela que o artista deixa sua assinatura e sua marca nas ruas das cidades. "Tenho um sistema de escrita em que desenvolvo apenas o título. Tipo um arquivo zip em que você clica duas vezes e a história que você imaginar surge lá de dentro." O contato com a arte começou cedo e desde criança o menino já se interessava por pintura, teatro, desenho, entre outras formas de expressão. Mas, foi somente aos 42 anos de idade, ao participar de um workshop de caligrafia, que Felipe se encontrou realmente. Desde então, suas mensagens levam poesia e arte de forma sutil e democrática por toda a parte onde os seus pés e mãos alcançam.

Em seu ateliê no Mercado Novo, localizado no coração da capital mineira, Felipe tenta aproximar a arte das pessoas e para isso se utiliza de várias formas de comunicação. "A arte não pode ser exclusiva. Precisa ser feita para todos", afirma. Como matéria prima, utiliza materiais já existentes e muitas vezes descartados, enxergando em tudo o seu valor. De tal forma que o material reciclado ganha nova função, revelando a sua própria história.  "Através desses artefatos conto a história do mundo. Imagine quantas famílias estiveram por trás da produção de um aço descartado? Existem muitas coisas a serem exploradas e valorizadas".

Ele trouxe essa percepção de sua infância. Nascido em BH e filho de pai industrial, Felipe cresceu em meio à produção gráfica, chegando a trabalhar na impressão, período em que o interesse pela linguagem visual foi despertado. Acompanhado pelo genitor, aos 15 anos de idade realizou um de seus grandes sonhos, do qual não se afastou mais. "Fizemos uma visita guiada ao Museu do Prado, em Madrid, na Espanha, onde me deslumbrei com os grandes clássicos. A partir daí, o turismo artístico se tornou uma das minhas grandes paixões."

Em suas obras, o artista busca despertar a imaginação de quem vê, criando portais para um universo mais leve, com pílulas de oxigênio entre tanta poluição:
Em suas obras, o artista busca despertar a imaginação de quem vê, criando portais para um universo mais leve, com pílulas de oxigênio entre tanta poluição: "Um escudo anti trevas" (foto: Pádua de Carvalho/Encontro)
Na publicidade, foi diretor de arte com especialidade em letra. Na área acadêmica, fez duas pós-graduações na faculdade de letras da Universidade de Lisboa, estudando a construção do significado através da junção de cada letrinha até a formação das palavras. "A caligrafia é o estudo do gesto, uma coreografia da mão. Primeiro fui aprender o alfabeto gótico, de tal forma que a minha letra é um encontro muito improvável da estrutura clássica da letra, com a arte de rua e o picho", afirma. Felipe acredita que é possível "pichar ao contrário", de forma limpa e de modo a levar a poesia pelo mundo afora, transmitindo boas vibrações.

O jovem que não se encaixava nas regras acadêmicas - levando anos para concluir o curso superior - reconhece que a dedicação aos estudos foi muito importante em sua vida. O que o levou a coordenar o Prêmio Jovens Cientistas, um dos principais prêmios no campo das ciências no Brasil, e também o programa Florestabilidade, voltado para a educação florestal e atividades produtivas sustentáveis na Amazônia.

Sabendo que o texto pode agregar, mas também ser uma ferramenta de exclusão - seja por alguns não saberem ler ou, até mesmo, por não conseguirem interpretar o sentido das palavras -, o artista abre exceção do uso da letra para seguir um caminho divergente, criando novas formas de expressão. Assim surgiram desenhos de arco-íris coloridos de esperança e a imensidão dos universos representados em  padrões gráficos, transformando símbolos em movimento. "Sempre fui apaixonado por arte de rua, por isso fui escrever poesia nos espaços públicos", diz. Esse talento o levou a participar do maior festival de arte pública da Europa, em 2019. Em BH, tem dois painéis no Jardim Alvorada. Picho, "tem por toda a cidade", como costuma dizer. Para Felipe, não existe diferença entre o grafite e a pichação. "Tudo é arte pública." Em suas obras, busca despertar a imaginação de quem vê, criando portais para um universo mais leve, com pílulas de oxigênio entre tanta poluição. Como o próprio artista diz, "um escudo anti trevas".

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