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Estado de Minas

Dentro do Corpo


postado em 21/09/2011 14:28

Ensaio do espetáculo Sem Mim, no palco do Palácio das Artes(foto: Fernando Lutterbach)
Ensaio do espetáculo Sem Mim, no palco do Palácio das Artes (foto: Fernando Lutterbach)

É dia de estreia em Belo Horizonte, início da tarde de uma quarta-feira de agosto, e o Grande Teatro do Palácio das Artes será palco de um reencontro entusiasmado à noite. De volta da capital paulista, onde fizeram o lançamento oficial do mais novo espetáculo da companhia na semana anterior, os 21 bailarinos do Grupo Corpo tiveram somente um dia de descanso antes de recomeçar a árdua tarefa de preparação de Sem Mim para novo público, e desta vez, em casa. Não parecem cansados, e sim vibrantes, a ponto de festejar com palmas o aniversariante do dia, o bailarino veterano Helbert Pimenta, o Nem, que fez 38 anos no primeiro dia de palco em Minas Gerais. “A ansiedade é em dobro”, brinca Helbert. Estas seriam só as primeiras palmas da temporada.

 

Mais nova integrante do Corpo, Malu Figueiroa:

nervosismo no teste e curta temporada na Colômbia

 

 

Abraços entre amigos e até beijos apaixonados marcam o início do aquecimento e alongamento, que acontecem sempre antes da marcação da luz para a técnica e para o coreógrafo Rodrigo Pederneiras, que acompanha tudo da plateia, microfone em punho. “Cada palco tem seus ajustes”, explica. O cenógrafo Paulo Pederneiras dá instruções ao grupo e zanza pela movimentada coxia, onde a equipe de 16 pessoas corre contra o tempo – desde o dia anterior – para descarregar e montar as cinco toneladas de equipamentos, guardadas em 40 enormes baús com materiais de som, luz, cenários e figurinos.

 

Os irmãos Pederneiras, Rodrigo (sentado) e Paulo, nas coxias do Grande Teatro: eles acompanham o passo a passo de tudo há 36 anos
 

 

Gabriel Pederneiras, filho de Rodrigo, trabalha há dez anos no grupo. “Somos os primeiros a chegar e os últimos a ir embora”, diz ele, que há três anos se tornou o coordenador técnico do Corpo. Gabriel não se lembra da última vez que tirou férias, já que além de gerenciar e coordenar a logística e carga de todos os espetáculos, coloca em prática as ideias do cenógrafo. Ao mesmo tempo em que montava o palco de BH, ele já fazia mapa de luz e especificações técnicas para a turnê internacional do próximo ano.

 

A bailarina Sílvia Gaspar faz exercícios de alongamento no palco: há

10 anos no grupo e cuidado com o corpo que ultrapassa os ensaios

 

 

Duas horas depois de repassar todo o espetáculo e ouvir as observações do coreógrafo, que por diversas vezes trocou de lugar na plateia para checar as posições dos bailarinos em cena, é hora de um breve intervalo. Cada grupo de três ou quatro tem seu próprio camarim e a turma se espalha para um café ou um suco. Cada um tem sua rotina; uns passam o tempo conversando e algumas meninas aproveitam até para retocar o esmalte. Edson Hayzer, 34 anos, gosta de ficar sempre ligado no trabalho corporal. “O café é breve e aproveito para relaxar fazendo flexões e abdominais”, conta. Ouvir música, ler livro, enfim, desligar a cabeça, não tem vez. “Isso desconcentra. Gosto de estar aqui e curtir integralmente esse preparo”, diz o bailarino.

 

 
 
 

 

Então, um novo aquecimento começa com um ritual pouco conhecido do público, a escovação do corpo para ativar melhor e mais rápido a circulação. Cada musculatura tem uma direção própria de ser escovada: artimanha para dar conta de movimentos e posições impensáveis para quem só observava de longe. Para eles parece fácil, natural, mas os bailarinos são operários da dança, que, na busca da perfeição, às vezes têm de pedir uma mãozinha do outro. Podem ser atendidos por massagistas e equipe de fisioterapeutas disponíveis durante as turnês.

 

Gabriel Pederneiras, filho de Rodrigo, coordenador técnico da

companhia há três anos e comandante de uma equipe de 16

pessoas: “Somos os primeiros a chegar e os últimos a ir embora”

 

 

A bailarina Sílvia Gaspar, há 10 anos no grupo, conta que dessa vez ninguém se machucou, mas o cuidado é imenso e ultrapassa os ensaios. “Cada bailarino faz um trabalho paralelo; eu não fico sem o pilates. Alguns optam por musculação ou ioga”, diz. O sono das manhãs também é sagrado para repor as energias, já que durante as turnês todos vão dormir muito tarde por causa das apresentações. Mas a conversa com Sílvia não pode se delongar: é hora da aula técnica de balé clássico, que tem duração de uma hora, e ela se põe a correr. “Aí o trabalho é para valer mesmo”, diz Rodrigo Pederneiras.

 

Técnico monta a iluminação do espetáculo: muito trabalho entre uma turnê e outra e toneladas de equipamentos, com apenas um dia para descarregar e outro para montar
 

 

Em todos os dias de qualquer turnê é feita a correção do espetáculo anterior. Os bailarinos ouvem a gravação feita pela assistente de coreografia, Ana Paula Cançado, que fica numa cabine de som anotando e repassando as correções durante uma hora e meia. O que não saiu como se pretendia é refeito, até que eles partem para a aula técnica. No final da aula, o relógio marcava 19h30 e já era hora de vestir o figurino e fazer a maquiagem do espetáculo. Se o tempo por acaso sobrar, o espetáculo começaria às 20h30. Cada bailarino tem seu ritual de preparo particular antes de entrar em cena, o que geralmente implica novos aquecimentos, até à hora do abrir das cortinas vermelhas.

 

O bailarino Edson Hayzer, na pausa do ensaio: “O café é breve e aproveito para relaxar fazendo flexões e abdominais”
 

 

Rotina que encantou a bailarina Malu Figueiroa, 27 anos, a mais nova integrante do Corpo. A ansiedade da estreia foi amenizada com um teste do espetáculo, apresentação fechada que o grupo fez em abril, e uma curta temporada na Colômbia. “Apesar de ter dançado poucos trechos, foi bom para desfazer meu nervosismo. Eu não poderia estar mais feliz hoje”, afirma Malu.
Os muitos aplausos finais vieram e as cortinas se fecharam. O trabalho da técnica continuou por mais duas horas: era preciso preparar o palco para o dia seguinte. Alguns bailarinos vão para casa, tentar se distrair até que a “adrenalina” do corpo baixe. Alguns querem mais, gostam de sair com amigos para comemorar a nova temporada. Adivinhem para quê? Dançar, claro, até à hora do próximo ensaio.

 

 

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