Publicidade

Estado de Minas SAÚDE | EMAGRECIMENTO

Tire suas dúvidas sobre a cirurgia bariátrica

Muitos fatores devem ser levados em conta antes de se decidir pela operação. Encontro entrevistou oito especialistas para responder às principais questões sobre o assunto


postado em 27/03/2017 14:23 / atualizado em 27/03/2017 14:51

Mesmo sendo considerada último recurso por muitos pacientes, a cirurgia bariátrica tem crescido ano a ano no país. Em 2012, foram feitos 72 mil procedimentos no Brasil, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica. Em 2016, esse número pulou para mais de 100 mil. A entidade atribui o aumento a múltiplos fatores, como o crescimento da obesidade entre os brasileiros - a taxa de adultos com sobrepeso já passa de 50% - e a ampliação de doenças associadas à obesidade que podem levar à indicação da cirurgia.

O avanço das técnicas relacionadas têm atraído os pacientes. As principais modalidades realizadas atualmente são feitas por videolaparoscopia, o que traz menores riscos cirúrgicos e recuperação mais rápida. Entretanto, é unânime entre especialistas que a cirurgia é apenas o primeiro passo. O acompanhamento posterior, multidisciplinar, é parte essencial do tratamento. Reeducação alimentar, nova visão de seu corpo e de como lidar com ansiedade, incorporação de exercícios físicos à rotina, revisão de hábitos. Essas e outras questões individuais são trabalhadas pós-cirurgia e os resultados não acontecem sem esse esforço e engajamento do paciente. Para quem está em dúvida quanto à indicação, modalidades, recuperação e chance de sucesso das cirurgias, Encontro entrevistou especialistas no assunto em BH e responde às principais questões trazidas a seus consultórios.

(foto: Paulo Márcio/Encontro)
(foto: Paulo Márcio/Encontro)
A farmacêutica Dámiana Máximo Brandão (foto), de 32 anos, não pensava em fazer cirurgia bariátrica até sentir uma dor no quadril após um dia de atividade física, que havia iniciado na tentativa de emagrecer. O ortopedista lhe deu a notícia: uma malformação genética, somada ao excesso de peso, era a causa da dor. Caso ela não emagrecesse (chegou a pesar mais de 110 kg, distribuídos em 1,74 m), teria de fazer prótese de quadril por volta dos 40 anos. Considerando o cenário, mudou de ideia. Em 2014, submeteu-se ao bypass e perdeu quase 50 kg. O segredo do sucesso em manter-se no peso adequado? "Revi minha relação com a comida. Não me privo de nada, mas como com moderação. Aprendi a lidar com o pouco", afirma. Hoje grávida de quatro meses, está com excelente saúde, quase não engordou na gestação e pode se exercitar sem dor - um alívio, já que acabou tomando gosto pelas atividades físicas.

(foto: Samuel Gê/Encontro)
(foto: Samuel Gê/Encontro)
Não é exagero quando se fala que o acompanhamento multidisciplinar e o engajamento do paciente no pós-cirurgia são essenciais para a perda de peso. O empresário Roberto Reis (foto), que fez a cirurgia bariátrica há dez anos, passou de 170 kg para 80 kg logo depois do procedimento, mas, em cinco anos, voltou para 120 kg. "A limitação física do tamanho do estômago ajuda, mas não é o suficiente. Se você não tiver disciplina, não mudar a mentalidade, pode burlar essa limitação de diversas formas", afirma. Só depois de procurar acompanhamento de um nutrólogo e estar disposto a mudar a forma de enxergar a comida, conseguiu se estabilizar nos 90 kg. Atualmente, está em processo de publicação de um livro sobre o assunto. "Nele, falo que o emagrecimento se dá a partir da mudança de mentalidade. Sem isso, nenhum método é eficaz e, com isso, diversos podem ser", diz.

(foto: Alexandre Rezende/Encontro)
(foto: Alexandre Rezende/Encontro)
A assistente administrativa Joélia Amaral da Silva (foto), de 37 anos, tentou diversas técnicas de emagrecimento durante cerca de 15 anos, entre remédios, dietas milagrosas, reeducação alimentar. Se perdia peso, logo ele voltava e até aumentava. Quando procurou o cirurgião, pesava 98 kg, medindo apenas 1,54 m, e tinha colesterol alto, gordura no fígado, pressão alta, além de um quadro de pré-diabetes. Atualmente, seis meses depois do procedimento, está pesando 64 kg e não precisa mais tomar remédio para pressão. "Tinha medo de ter problemas futuros por causa da cirurgia, mas na verdade o que ocorreu foi o contrário. Por enquanto, só benefícios", afirma.

1 | Como se dá a indicação da cirurgia?
A cirurgia ideal para cada paciente é escolhida baseada na perda de peso necessária para atingir o objetivo e na experiência do cirurgião em cada técnica.
Mauro Lúcio Jácome, especialista em cirurgia, gastroenterologia e endoscopia digestiva bariátrica

2 | Como saber se a técnica proposta pelo cirurgião é regulamentada?
O paciente deve consultar o Conselho Federal de Medicina (CFM). É importante ressaltar que as cirurgias regulamentadas já são estabelecidas como as mais seguras para o paciente e são consagradas pelos baixos índices de complicações e pelas boas práticas médicas. Cirurgias experimentais devem ser utilizadas apenas em protocolos de estudos devidamente reconhecidos pelo Conselho.
Mauro Lúcio Jácome

3 | Pode-se dizer que, atualmente, as principais cirurgias feitas no país são a Sleeve e a bypass?
Sim, sendo que a grande maioria é realizada por videolaparoscopia. Ambas são indicadas para pacientes com IMC maior que 40 kg/m2 ou pacientes com IMC maior que 35 kg/m2, desde que tenham duas ou mais comorbidades relacionadas à obesidade. O bypass intestinal tem sido realizado preferencialmente em pacientes diabéticos ou com síndromes metabólicas. Já a Sleeve, em pacientes com IMC mais próximo do limite inferior (entre 35 e 42 kg/m2).
Bruno Sander, cirurgião endoscopista

4 | Quais são os procedimentos prévios e laudos necessários para se submeter à cirurgia?
Durante a avaliação pré-operatória é realizada uma série de exames complementares como ultrassom abdominal e endoscopia digestiva, além de um grande número de exames laboratoriais e consultas com especialistas de diversas áreas: pneumologia, cardiologia, psiquiatra, psicologia e nutrição. Nessa fase, também é obrigatório o preenchimento do termo de Consentimento Informado, no qual o paciente reconhece estar devidamente informado sobre os benefícios e riscos da cirurgia.
Roberto Carlos de Oliveira e Silva, cirurgião geral e diretor técnico do Hospital Felício Rocho, membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica

5 | Quais são os riscos?
Tanto o bypass quanto a Sleeve são procedimentos cirúrgicos, feitos com anestesia geral e internação hospitalar, e o paciente precisa saber que não existe cirurgia sem riscos. Para se submeter à operação, a pessoa passa por uma bateria de exames pré-operatórios. Se todos forem favoráveis, ela tem riscos normais de uma operação, como sangramentos, infecções, trombose venosa profunda e embolia pulmonar, além de risco de reoperação. A taxa de mortalidade nessas cirurgias varia em torno de 0,5%.
Marcelo Girundi, cirurgião bariátrico membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica

6 | Como é a recuperação após a cirurgia bariátrica?
Nas cirurgias realizadas por videolaparoscopia, a recuperação tende a ser mais rápida e, na maioria das vezes, o paciente recebe alta hospitalar em até 72 horas. A alimentação se inicia com dieta líquida, depois pastosa e, após liberação da equipe multidisciplinar, o paciente retorna à dieta sólida.
Bruno Sander

7 | O que é esperado em termos de perda de peso?
É considerado sucesso terapêutico o paciente que perdeu no mínimo 50% do excesso de peso corporal, mas a maioria perde quase todo o excesso. A variação é de acordo com a motivação do paciente, porque a cirurgia não é tudo. Ela requer uma posterior mudança de hábitos, com alimentação balanceada, exercícios físicos. O prazo médio para perda do excesso de peso é entre um ano e meio e dois anos.
Rodrigo Fabiano Guedes Leite, cirurgião bariátrico membro titular do colégio brasileiro de cirurgiões e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica

8 | E em relação à melhora de comorbidades, como diabetes, hipertensão, apneia do sono?
Os efeitos após a cirurgia vão desde melhora importante até, muito frequentemente, resolução completa do quadro. Os pacientes ainda se beneficiam com melhora de outras tantas doenças como apneia do sono, doença cardiovascular, infertilidade e doenças osteomusculares.
Roberto Carlos de Oliveira e Silva

9 | O que é a Síndrome de Dumping?
É quando um alimento hipercalórico, rico em açúcar ou gordura, passa rapidamente do estômago para o intestino delgado. Isso gera secreção de muito líquido, o que promove efeitos como queda de pressão arterial, tremores, sudorese, taquicardia e sensação de mal-estar. É mais frequente após o bypass do que a Sleeve, mas não necessariamente acometerá a todos. Alguns podem não ter, outros podem ter apenas por determinado tempo, outros para o resto da vida.
Marcelo Girundi

10 | Quais são as chances de ganhar peso após a cirurgia?
Estudos recentes mostram que pelo menos 35% dos pacientes vão ter algum grau de reganho de peso após alguns anos. Apenas a minoria, contudo, vai ganhar todo o peso perdido. Esse reganho se dá muito em função da adaptação do metabolismo pessoal e de maus hábitos de vida, como nutrição inadequada e consumo de álcool ou doces.
Mauro Lúcio Jácome

11 | Como evitar ganhar peso depois da operação?
A cirurgia só trata o sintoma do excesso de peso, não a base do problema. Nesse sentido, o procedimento gera uma janela terapêutica para o paciente tratar a obesidade. No caso da Sleeve, cerca de três anos, e no caso do bypass, cinco anos. Nesse tempo, é preciso fazer psicoterapia, reaprendizado alimentar. O tratamento complementar é necessário para se atingir o objetivo.
Leonardo Salles, cirurgião bariátrico

12 | Quais são as consequências da cirurgia para o sistema digestivo e a capacidade de absorção de nutrientes?
O paciente que faz cirurgia precisa estar ciente de que deverá ter controle e acompanhamento para o resto da vida. Pode ter, por exemplo, deficiência vitamínica, e esses nutrientes terão de ser repostos (falta de vitamina B12, ferro ou cálcio, por exemplo). Esse controle é essencial.
Leonardo Salles

13 | O que muda na rotina alimentar e nas condições de alimentação?
Após três meses, o paciente pode ter hábitos alimentares normais. O que acontece é que, com a restrição física e hormonal da cirurgia, a pessoa se sente saciada mais precocemente, então tende a comer menos. É possível, inclusive, por meio de equipamentos, saber a quantidade de calorias diárias que o paciente precisa, para ajudar a orientá-lo na alimentação.
René Berindoague, cirurgião bariátrico membro titular %u2028da Sociedade Brasileira de Cirurgia da Obesidade

14 | Qual é a importância do acompanhamento multidisciplinar?
A obesidade tem de ser entendida como doença de múltiplas causas (metabólicas, psicológicas, ambientais, etc.). Assim, além da cirurgia, é preciso reeducar o paciente, com acompanhamento feito por nutricionista, endocrinologista, psicólogo. Tem de ser feita a reeducação alimentar e outros trabalhos. Um exemplo é em relação à imagem corporal: há pacientes que foram acostumados a ser obesos a vida toda e que, em três meses, perdem 20 quilos. Isso pode não ser simples de compreender.
René Berindoague

15 | Pessoas que já se submeteram a cirurgias anteriormente podem tentar de novo?
O segundo tratamento cirúrgico deve ser muito bem avaliado, porque segunda operação sempre se traduz em maiores riscos, além de benefícios não tão evidentes quanto na primeira. Não se deve pensar que, se não se obtiver sucesso na primeira vez, é só operar de novo, pois os resultados são pouco concretos.
Henrique Eloy, cirurgião geral e endoscopista

16 | É sempre necessário fazer cirurgia plástica depois da cirurgia bariátrica?
Não, e não é possível avaliar a necessidade antes do procedimento bariátrico, pois vai depender da elasticidade da pele de cada paciente. A recomendação é aguardar o prazo de um ano e meio, quando o peso está estabilizado, para aí, sim, fazer a avaliação da cirurgia plástica. Como normalmente só a retirada do excesso de pele do abdômen é coberta pelos planos de saúde, orienta-se que o paciente procure saber dessa cobertura antes da cirurgia bariátrica para se programar.
Henrique Eloy

17 | Como o senador Romário conseguiu fazer a cirurgia sem o IMC mínimo indicado?
O Romário se submeteu a uma técnica experimental, chamada interposição ileal, que não é autorizada pelo CFM. No ano passado, várias associações internacionais de estudo de cirurgia de obesidade endossaram documento que autoriza a realização de técnicas bariátricas para controle de diabetes tipo 2 para IMC acima de 35 e para pacientes com obesidade de 1º grau e diabetes de difícil controle, com o IMC entre 30 e 35. Mas é importante lembrar que a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica e o CFM não autorizam cirurgias experimentais que não estejam dentro de protocolos de pesquisa devidamente reconhecidos.
Rodrigo Fabiano Guedes Leite

18 | Quais são as principais novidades e avanços?
A grande expectativa é pelo OverStitch, um tipo de redução de estômago realizado por endoscopia. Por meio dessa técnica será possível realizar pontos internos no estômago, diminuindo a sua área de reserva, sem a necessidade de cortes ou desvios no intestino. E como nenhuma parte do órgão é retirada ou desviada, a absorção de vitaminas mantém-se praticamente inalterada. Além disso, por ser uma técnica endoscópica e menos invasiva que a cirurgia tradicional ou a de videolaparoscopia, o paciente poderá receber alta no mesmo dia. Por último, como não é retirada nenhuma parte do estômago, é possível reverter completamente o procedimento simplesmente cortando os pontos.
Bruno Sander

Principais técnicas realizadas atualmente no Brasil

Gastroplastia vertical com bypass gástrico em Y de Roux


  • Estudado desde a década de 1960, o bypass é a técnica bariátrica mais praticada no Brasil, correspondendo a 75% das cirurgias realizadas, devido a sua segurança e, principalmente, sua eficácia
  • O paciente submetido à cirurgia perde de 40% a 45% do peso inicial
  • Nesse procedimento, é feito o grampeamento de parte do estômago, que reduz o espaço para o alimento, e um desvio do intestino inicial, que promove o aumento de hormônios que dão saciedade e diminuem a fome. Essa somatória entre menor ingestão de alimentos e aumento da saciedade é o que leva ao emagrecimento, além de controlar o diabetes e outras doenças, como a hipertensão arterial
  • É mais indicada para pacientes que apresentam doenças metabólicas associadas à obesidade

Gastroplastia Sleeve

  • É um procedimento relativamente novo, praticado desde o início dos anos 2000
  • Consiste na retirada 70 a 80% do estômago, de forma longitudinal. Além do efeito restritivo pela redução do tamanho do estômago, retira-se justamente a parte do órgão onde é produzido o hormônio grelina, responsável pela sensação de fome quando ele se esvazia. Portanto, reduz a fome
  • Tem a vantagem de preservar o trânsito pelo duodeno (responsável pela absorção de ferro, cálcio, zinco e vitaminas do complexo B)

Os comentários não representam a opinião da revista e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação

Publicidade